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“Quero vencer a Constituição não escrita, ilegal e secreta”

Marisa Matias afirmou que “a nossa Constituição é um programa por cumprir”, criticando os que “têm medo de tudo e os que aceitam tudo”, numa política que é “a desgraça de Portugal”.
Foto de Paulete Matos

Foi ao som de Wake Up, dos Arcade Fire, que o Cinema São Jorge se levantou para receber e aplaudir Marisa Matias, acompanhada por Pablo Iglesias, Catarina Martins e António Capelo. O mandatário nacional abriu as hostes, ao declamar que “o que é preciso é gente / gente com dente”, “e mostre o dente potente / ao prepotente” e “que atire fora com essa gente” que “não sente como a gente”, de um poema de Ana Hatherly.

A discursar para uma plateia completamente lotada, Marisa Matias disse “não aceitar discursos vagos ou de meias-tintas”, acusando a estratégia de certos candidatos, que ao optarem por se fazer “pouco ouvidos e ainda menos percebidos”, insultam a democracia.

A candidata presidencial afirmou que “não se pode querer ser Presidente e pedir um cheque em branco a quem decide” e, porque “é da nossa vida coletiva que fala a Constituição”, lançou várias perguntas “incómodas” a que todos os candidatos deveriam responder.

Estamos fartos/as dessa lei que ignora a lei

“Podemos aceitar como natural a generalização da precariedade nos contratos de trabalho e que muitos desempregados não tenham qualquer subsídio? Podemos aceitar que se morra nos hospitais por erro de falta de assistência e que tantas famílias vivam sem condições mínimas de habitação? Podemos aceitar a emigração massiva dos jovens e os cortes nas pensões? Podemos aceitar a subordinação de Portugal às vontades da banca e dos mercados e os benefícios fiscais de que gozam as grandes empresas e as famílias mais ricas?”, questionou Marisa Matias, uma e outra vez, enquanto referia artigos da Constituição que revelam o desrespeito constante pela Lei Fundamental.

Foto de Paulete Matos

Para Marisa Matias “há uma outra Constituição, não escrita, que se impõe contra a que foi aprovada, uma Constituição ilegal e secreta que manda em Portugal e é simplesmente a que se faz em Bruxelas e Berlim, nas administrações da banca e em gabinetes de advogados. É a Constituição dos donos disto tudo”. “Estamos fartos dessa lei que ignora a lei”, desabafou.

A candidata presidencial lembrou o escritor angolano Pepetela, “que nos fala de um mundo dividido em homens e mulheres e depois há os calcinhas”, que são os que “tremem sempre perante os poderes, que andam sempre aprumadinhos na sua farda, que obedecem a tudo, que gostam de tudo, que aceitam tudo”. Para Marisa, o “topo do nosso país está cheio de calcinhas”, os mesmos que “têm a coluna treinada para as vénias” ao FMI, à Comissão Europeia ou a Berlim. Nas palavras da candidata “são os reis da política realista e os resultados dessa política são, realisticamente falando, a desgraça de Portugal”. Marisa Matias deu os exemplos do BANIF e do Novo Banco, da “enxurrada de dinheiro que por ali vai”, e lembrou que essa “única solução” nunca foi uma solução, mas “um assalto”.

Sou uma candidata perigosa para os calcinhas e para a tristeza da fatalidade. Eu vibro com a luta do meu povo

A candidata foi ainda mais longe nas suas críticas, ao ironizar com o facto de a culpa nunca ser de ninguém: “não fui eu, eu até expressei dúvidas, diz um responsável político, eu recomendei prudência, diz o Banco de Portugal, foi o senhor Governador, dizem os dois, e o senhor Governador não, não foi nada comigo”. Mas depois são “três mil milhões num caso e dois mil milhões noutro” em que “todos assobiam para o ar”. Deve ser “o assobio mais caro da história de Portugal”, ironizou mais uma vez.

Para Marisa Matias, a Constituição é “a lei que defende os fracos contra os fortes, os pobres contra os ricos, os desprotegidos contra o abuso, a democracia contra os mercados, as pessoas contra os vampiros”. Assim, e depois de relembrar que foi a única candidata a contestar o orçamento retificativo, disse que há, nesta campanha, “candidatos da conversa fiada, os que têm medo de tudo e que aceitam tudo”, em juras que se reduzem à “capa da Constituição da República”. 

O meu compromisso é com a nossa gente, que luta pela decência e pela igualdade contra os donos disto tudo

“Eu, Marisa Matias, 39 anos, vou convosco à guerra contra a política vazia, e vou levantar a voz das pessoas que são sempre sacrificadas pelo horror do desemprego, da pobreza, das desigualdades”, afirmou, depois de se apresentar como defensora da Constituição em "todo o seu conteúdo concreto".

Marisa concluiu a sua intervenção afirmando que o que a distingue das demais candidaturas é que “eu quero que Portugal possa viver a sua alegria”, sublinhou que “a democracia tem de ser a terra da liberdade, e não da fatalidade e da tristeza” e destacou que o seu compromisso é “com a nossa gente que luta pele decência e pela igualdade contra os donos disto tudo”.

Catarina Martins: "Precisamos de ser muito melhor do que simplesmente não ser Cavaco"

Já Catarina Martins, afirmou que “estamos a viver tempos novos, exaltantes, com dificuldades, claro, como são todos os tempos em que se tenta mudar o próprio rumo dos tempos”. Para a porta-voz do Bloco, é possível fazer diferente “quando as pessoas defendem as suas vidas, quando se levantam, seja em Portugal ou em Espanha”, e “é esse caminho que temos de continuar a fazer”.

A porta voz do Bloco de Esquerda sublinhou que Portugal precisa de “ser muito melhor do que simplesmente não ser Cavaco”, apelando à necessidade de “continuarmos a ser exigentes” nestas eleições presidenciais. Para Catarina Martins, há “alguns responsáveis políticos e até alguns candidatos” que “estão convencidos que havemos de nos resignar, porque qualquer coisa que venha depois de Cavaco há de ser melhor”, mas “não chega”, reiterou.

Pablo Iglesias: "Nós, as pessoas normais, caminhamos. A Marisa avança"

Foto de Paulete Matos

Outro dos grandes momentos deste mega-comício foi a intervenção de Pablo Iglesias, que salientou que “há muitas coisas que estão a mudar na Europa e os de cima não entendem”. Para o secretário-geral do Podemos “a história não se  pode parar e as mudanças que estão a acontecer mostram que as nossas sociedades precisam de cidadãos normais, gente preocupada com as pessoas” porque “as pessoas estão muitos cansadas dos políticos de sempre”.

O espanhol destacou a “dimensão humana” de Marisa Matias, e respondendo às críticas que ouviu por esta ser ainda muito jovem, questionou-se se ainda “faz sentido que no ano de 2016 alguém só possa ser Chefe de Estado se tiver cumprido os 60, 70 ou 80 anos de idade”. Para o líder do Podemos “num momento como este, em que tudo está a mudar na Europa, faz mais sentido alguém que esteja preparada e com o dinamismo suficiente para dar a cara pelo seu país e pela sua gente”. “Oxalá este país tivesse uma Presidente com a capacidade e a sensibilidade” da Marisa, concretizou.

Pablo Iglesias não escondeu a sua admiração por Marisa Matias e ainda poetizou ao dizer que "nós, as pessoas normais, caminhamos. A Marisa avança".

Ao mega-comício, que reuniu cerca de 1200 pessoas - e entre elas Helena Roseta que declarou o seu apoio a Marisa Matias - e encerrou ao som do tema People Have The Power, de Patti Smith, seguiu-se uma grande arruada no centro de Lisboa, entre o Cinema São Jorge e o Largo de São Domingos.

Veja todas as intervenções do Mega-Comício Nacional:

Marisa Matias | Mega comício nacional | Presidenciais 2016

Pablo Iglesias | | Mega comício nacional | Presidenciais 2016

Catarina Martins | Mega comício nacional | Presidenciais 2016

António Capelo | Mega comício nacional | Presidenciais 2016

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