“Processo de sanções a Portugal já devia ter sido encerrado”

10 de September 2016 - 19:16

Catarina Martins apresentou conclusões da mesa nacional do Bloco, reafirmando o compromisso para parar o empobrecimento. "Reconhecer a tragédia exige extinguir o batalhão de Comandos", destacou também a coordenadora do Bloco, que alertou para o crescimento da política do ódio na Europa, condenando a construção do muro em Calais.

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Catarina Martins - foto de Nuno Fox/Lusa
Catarina Martins - foto de Nuno Fox/Lusa

A Mesa Nacional do Bloco de Esquerda reuniu neste sábado, 10 de setembro de 2016, e aprovou uma resolução sobre a situação política que publicamos abaixo na íntegra.

Na conferência de imprensa, a coordenadora do Bloco de Esquerda alertou para o crescimento da política do ódio na Europa e condenou a “decisão francesa e britânica da construção do muro em Calais, que só alimenta xenofobia”.

Catarina Martins defendeu também alterações na progressividade dos escalões do IRS, lembrando que “a chamada classe média teve um ataque violentíssimo do governo PSD/CDS, quando este impôs a sobretaxa e alterou os escalões do IRS”. “O caminho que temos que fazer é precisamente o oposto e é o do respeito pelos rendimentos do trabalho (salários e pensões) que exige reposição de progressividade dos escalões do IRS”, destacou.

Sobre a morte de dois militares, Catarina Martins afirmou: "Reconhecer a tragédia exige extinguir o batalhão de Comandos". A deputada lembrou que em 1993 o regimento de comandos foi extinto e que foi criado o batalhão em 2002 por Paulo Portas.

Sanções “são apenas uma forma de chantagem permanente contra Portugal”

[caption align="right"]Reunião da Mesa Nacional do Bloco de Esquerda (imagem parcial) - Foto de Nuno Fox/Lusa Reunião da Mesa Nacional do Bloco de Esquerda (imagem parcial) - Foto de Nuno Fox/Lusa[/caption]

Na resolução da Mesa Nacional do Bloco de Esquerda, o partido aponta que Portugal “teve duas vitórias importantes no confronto europeu”: o cancelamento da multa pela CE e a autorização para a recapitalização da CGD.

Considerando que “os avanços registados não encerraram ainda estes processos”, a mesa do Bloco aponta que as sanções “são apenas uma forma de chantagem permanente contra Portugal”, defende que “os mesmo argumentos que serviram para o cancelamento da multa deveriam ser automaticamente aplicados no caso dos fundos estruturais” e salienta que a continuação do processo “apenas serve a agenda da direita, que aposta tudo na instabilidade política e económica do país”.

A resolução anuncia também a promoção de um amplo debate sobre o Orçamento do Estado para 2017, com a realização de uma conferência nacional a 22 de outubro em Lisboa e a dinamização de sessões públicas em todo o país.

O documento sublinha que a evolução da economia portuguesa demonstra que “a recuperação de rendimentos não só é possível, como é desejável”, ao contrário do que diz a direita, e defende que “o anémico crescimento atual” demonstra a necessidade de “aprofundar esse caminho” e a urgência de “uma nova estratégia para a economia”.

A mesa do Bloco defende que o combate à austeridade “exige o confronto com a União Europeia”, salientando que a UE “é hoje uma ameaça aos povos europeus” e que “uma alternativa económica ao projeto austeritário não será construída dentro dos tratados ou apesar dos tratados, mas sim recusando esses constrangimentos em nome do direito dos povos à sua autodeterminação económica e social”.

No documento, o Bloco posiciona-se também sobre os incêndios florestais, o início do ano letivo, as mortes de militares nos comandos, as eleições regionais nos Açores e as próximas eleições autárquicas. A resolução aborda ainda várias situações da política internacional: o crescimento da político do ódio na Europa e a situação política na Turquia, na Venezuela e no Brasil.

Resolução da Mesa Nacional do Bloco de Esquerda

1. O processo de sanções da Comissão Europeia contra Portugal não terminou

Portugal teve duas vitórias importantes no confronto europeu: o cancelamento da multa por incumprimento de limites de défice e a autorização para a recapitalização pública da Caixa Geral de Depósitos. Mas os avanços registados não encerraram ainda estes processos.

Inicia-se nas próximas semanas uma nova fase do processo de sanções contra Portugal, com a decisão sobre a suspensão dos fundos europeus, numa tentativa de pressionar a negociação do Orçamento do Estado para 2017. A suspensão de fundos estruturais faria baixar ainda mais o investimento, colocando em causa qualquer estratégia para crescimento económico e para o emprego. Diminuindo o PIB, essas sanções aumentariam o peso relativo da dívida e do défice do Estado, degradando precisamente os indicadores em que assentam os mecanismos de chantagem dos tratados europeus. As sanções, inaceitáveis e contrárias à consolidação orçamental que alegam promover, são apenas uma forma de chantagem permanente contra Portugal. Os mesmo argumentos que serviram para o cancelamento da multa deveriam ser automaticamente aplicados no caso dos fundos estruturais; continuar o processo apenas serve a agenda da direita, que aposta tudo na instabilidade política e económica do país.

Do mesmo modo, a exigência europeia de uma reestruturação da CGD concebida pelos padrões de um banco privado, ataca o direito de Portugal decidir uma estratégia pública para a banca. O Bloco empenha-se na defesa dos postos de trabalho e da presença da CGD junto das populações portuguesas e das comunidades no estrangeiro, na transparência dos processos de recapitalização e de reestruturação e na exigência de uma estratégia para a banca pública virada para o apoio aos setores produtivos da economia e à criação de emprego.

2. O Bloco de Esquerda é a garantia do compromisso para parar o empobrecimento

Assumindo os limites do acordo de maioria parlamentar para parar o empobrecimento, o Bloco de Esquerda reconhece também as conquistas feitas e a importância de prosseguir o caminho iniciado.

O acordo assinado em 2015 previa medidas a executar nos Orçamentos do Estado para 2016 e 2017 e, para o Bloco, a prioridade é cumprir o acordo, desde logo nas medidas urgentes de recuperação de rendimentos do trabalho e das pensões: alívio da carga fiscal sobre as e os trabalhadores empobrecidos, através do aumento da progressividade nos escalões de IRS; descongelamento do Indexante dos Apoios Sociais (IAS) tal como previsto no orçamento para 2016, para evitar a sua desvalorização pelo efeito da inflação; recuperação do valor das pensões mais baixas. A revisão de contratos de privilégio e rendas excessivas, assinados contra o interesse público em setores como a saúde e a energia, é central para garantir o reforço do Estado Social e a redução dos custos energéticos das famílias.

A precarização do trabalho em Portugal baixa salários, ilide direitos e agudiza desigualdades. Não há recuperação sustentada dos rendimentos do trabalho sem combate à precariedade. O cumprimento do acordo para parar o empobrecimento exige por isso medidas para lá da esfera estrita do Orçamento do Estado. Há um ano, Bloco e PS estabeleceram os patamares de partida para a atualização anual do Salário Mínimo Nacional (SMN), a caminho dos 600 euros no curso da legislatura. Assim, em janeiro de 2017, o SMN não ficará abaixo de 557€. Esta medida deve ser acompanhada da reativação da contratação coletiva, da valorização de profissões, carreiras e salários, e do combate à permissividade perante a impunidade patronal que fez do abuso a norma. Deve ser dada continuidade à aprovação da lei contra o trabalho forçado, responsabilizando as empresas, limitando as sub-contratações e o recurso ao trabalho temporário.

O Bloco de Esquerda promove um amplo debate do Orçamento do Estado para 2017, com a realização de uma conferência nacional a 22 de outubro em Lisboa e a dinamização de sessões públicas em todo o país. Estas iniciativas contam com a participação e mobilização do Bloco e são abertas a toda a população.

3. Combater a austeridade exige o confronto com a União Europeia

A evolução da economia portuguesa demonstra que, ao contrário do que a direita anuncia a cada momento, a recuperação de rendimentos não só é possível, como é desejável. Mas o anémico crescimento atual demonstra que é necessário não só aprofundar esse caminho como é urgente uma nova estratégia para a economia.

Com uma despesa anual de quase 9 mil milhões de euros em juros da dívida e sem controlo público da banca, Portugal está privado dos meios para um investimento público capaz de reverter os efeitos devastadores da austeridade. Uma alternativa para a produção e o emprego exige instrumentos que a União Europeia tem banido: a reestruturação da dívida pública e o controlo público da banca.

A União Europeia é hoje uma ameaça aos povos europeus. A perda de soberania sobre o sistema financeiro e a concentração da banca privada em grandes conglomerados europeus, a crescente assimetria entre países do centro e da periferia da zona euro, com a Alemanha a acumular recordes em excedentes comerciais enquanto, na periferia, se consolida o desemprego estrutural de massas, tudo isto no quadro de tratados e instituições europeias que condenam os povos à austeridade permanente. Uma alternativa económica ao projeto austeritário não será construída dentro dos tratados ou apesar dos tratados, mas sim recusando esses constrangimentos em nome do direito dos povos à sua autodeterminação económica e social.

4. Os incêndios florestais constituem uma tragédia ambiental, económica e social que continua a percorrer o país

Este ano, até final de agosto de 2016, foram consumidos mais de 107 mil hectares de mato e floresta, e atingidas áreas de habitação, com particular gravidade no caso do Funchal. Nas duas últimas décadas foram destruídos pelo fogo 2,5 milhões de hectares de floresta, mas o eucalipto não para de aumentar a área de expansão, ultrapassou o pinheiro e ocupa já o primeiro lugar das espécies florestais plantadas. Passou de 241 mil hectares na década de 1970 para 740 mil hectares em 2006 e recentemente para cerca de 812 mil hectares.

Os valores empregues em todo o sistema de combate primário aos fogos florestais é muito superior aos destinados à prevenção e ao ordenamento florestal. O orçamento do Dispositivo Especial de Combate a Incêndios Florestais (DECIF) para 2016 é superior a 70 milhões de euros, mas a verba para prevenção não chega a 20 milhões, incluindo o pagamento às equipas de sapadores florestais. Os negócios que vão sendo conhecidos em torno dos meios aéreos, com envolvimento de responsáveis do governo PSD/CDS-PP, ao mesmo tempo que a Força Aérea é afastada do combate aos incêndios, faz perceber uma enorme teia de interesses ilícitos que colocam em causa o interesse público e alimentam uma espécie de “indústria dos fogos”.

O constante adiar de medidas de política pública para a floresta não pode deixar de ser associado ao poderoso lobby da indústria da celulose e do papel e à consequente pressão para o aumento da área de espécies de crescimento rápido, particularmente do eucalipto. Nos dois últimos anos, foram pedidos licenciamentos para cinco novos projetos que aumentam a capacidade instalada da indústria da celulose em mais de 300 mil toneladas. Entretanto, o anterior ministra da Agricultura Assunção Cristas liberalizou a plantação do eucalipto.

É urgente um forte empenho político para impedir que o adiamento de medidas para a floresta se continue a arrastar. O Bloco tomará a iniciativa, antes do debate do Orçamento de Estado para 2017, de apresentar propostas que condicionem a plantação do eucalipto, promovam o ordenamento florestal e do espaço rural que estabeleça faixas de árvores autóctones para contenção das espécies de crescimento rápido e diversifique a floresta, e crie condições que assegurem o recurso e a eficiência de modelos de intervenção pública de gestão da floresta, condição essencial, num contexto de minifúndio e de abandono rural, para a preservação e aproveitamento económico dos espaços florestais, promoção da biodiversidade e defesa do ambiente.

5. No início do ano letivo, compromisso pelo combate à precariedade nas escolas

O fim do abuso dos contratos de associação é uma das vitórias da escola pública no início deste ano letivo, tendo-se ainda registado alguns outros avanços, como o fim da bolsa de contratação de escola, a distribuição de manuais escolas gratuitos a 80 mil crianças e a flexibilização das metas curriculares.

Mas este início de ano letivo revela também os grandes problemas com que se depara a escola pública. A falta de auxiliares nas escolas é dramática, assim como a precariedade de pessoal docente e não docente, marcando a necessidade de um verdadeiro mecanismo de contratação e vinculação destes trabalhadores e trabalhadoras. A par da ação social escolar, da diminuição do número de alunos por turma e da gestão democrática das escolas, estas são as prioridades do Bloco para uma melhor escola pública para todas e todos.

6. Reconhecer a tragédia é extinguir o Batalhão de Comandos

O Regimento de Comandos foi extinto em 1993 pela evidente incapacidade em adequar ao paradigma democrático uma força de elite formada no contexto da guerra colonial e para responder à estratégia então definida. Até à sua extinção em 1993, o país chocou-se com a brutalidade contra os soldados durante a instrução, que chegou mesmo a provocar várias mortes. Acresce a inutilidade de tal especialidade militar no atual contexto estratégico nacional e militar, como ficou provada.

Em 2002, o governo PSD/CDS decidiu reativar os Comandos, sob a forma de Batalhão de Comandos, pela mão do então Ministro da Defesa Nacional Paulo Portas. Já na altura o Bloco se manifestou contra a existência desta unidade.

A morte recente de dois militares na sequência de exercícios durante a instrução de um novo curso é extremamente grave e não pode ser ignorada. A situação está a sob inquérito, mas lembra o que ocorreu em 1993 e não pode passar sem consequências.

O Bloco de Esquerda reafirma a sua posição pela extinção do Batalhão de Comandos, completamente inútil para o nosso país como se provou durante a década em que não existiu. Consideramos também que os processos de instrução das diversas especialidades militares devem ser avaliados para garantir o respeito pela integridade dos formandos e o respeito pelos direitos humanos.

O Bloco de Esquerda afirma o seu pesar às famílias dos militares falecidos e deseja a completa recuperação das vítimas que ainda se encontram a receber cuidados médicos.

7. A caminho das eleições regionais dos Açores, o Bloco de Esquerda está a fazer a diferença

Nos Açores a maioria absoluta do Partido Socialista tem falhado em respostas essenciais. Falta democracia e transparência onde têm sobrado privatizações e concessões, falta uma estratégia para a economia capaz de gerar emprego e tem faltado autonomia onde tem sobrado subserviência. Nos Açores cresce a vontade de alternativa e uma nova relação de forças, com mais eleitas e eleitos do Bloco de Esquerda, fará a diferença.

Na campanha para as eleições regionais do próximo dia 16 de Outubro, o Bloco de Esquerda dos Açores juntou propostas e pessoas e impôs os debates determinantes para a construção da alternativa. Clareza no combate às desigualdades sociais e na defesa dos serviços públicos, uma renovada exigência na democracia e transparência e um projeto sólido para a economia. O Bloco Açores pôs no centro da agenda o investimento na investigação e na ciência, através da criação de um Centro Internacional das Ciências do Mar e Alterações Climáticas, e a necessidade do aprofundamento da autonomia dos Açores para defender a região de acordos predatórios do ambiente e economias regionais, permitindo que a posição geoestratégica dos Açores seja finalmente colocada ao serviço da população.

8. As eleições autárquicas estão já no horizonte

As eleições autárquicas aproximam-se. Dentro de onze meses terão de ser entregues as listas de candidatura. É tempo de dar prioridade a este caminho.

Estas eleições são um enorme desafio organizativo para o Bloco. O contato com as populações e a promoção de candidaturas do Bloco de Esquerda constituem uma prioridade, sem embargo da opção do apoio a movimentos de cidadãos que concorram e cujos programas vão ao encontro dos princípios programáticos do Bloco.

O Bloco de Esquerda vê como prioridade, nas candidaturas autárquicas nos grandes centros urbanos a defesa intransigente do Direito à Cidade, assegurando a fruição do mesmo por todas e por todos e assim combatendo a privatização da Cidade e dos seus espaços, promovendo a participação das populações na sua gestão e a igualdade no acesso à Cidade e aos seus espaços.

Nos meios rurais, o Bloco promoverá políticas de combate à desertificação, seja pela via de estratégias políticas que promovam o desenvolvimento sustentável, seja pela promoção de medidas de coesão territorial que visem assegurar às populações rurais o acesso aos serviços públicos e à cultura.

Os programas eleitorais do Bloco de Esquerda privilegiarão o recurso aos mecanismos de democracia participativa e de democracia direta, visando criar um novo e amplo envolvimento dos cidadãos na tomada de decisões autárquicas.

O Bloco de Esquerda debaterá e construirá programas e listas de forma aberta e participada, e em ligação aos associativismos e ativismos locais, respondendo aos problemas de cada município e freguesia, às questões ambientais e à melhoria da qualidade de vida das populações.

O desafio da Convenção é claro: procurar candidaturas do Bloco com força para fazerem a diferença ou participar em movimentos amplos de cidadãos com força transformadora ao nível local.

9. Cresce a política do ódio da Europa

A posição conjunta do grupo de Visegrado (Hungria, Polónia, República Checa e Eslováquia) na cimeira europeia de 16 de setembro demonstra o crescimento das forças xenófobas na União Europeia. O Brexit, que reuniu diferentes descontentamentos, foi também capitalizado por forças xenófobas, em Inglaterra e não só. Estas forças alinham-se hoje de forma mais visível, numa clara agenda anti-imigração e contrária ao respeito pelos direitos humanos. A combinação entre austeridade e autoritarismo que configura a atual União Europeia está a abrir espaço a partidos xenófobos a uma nova hegemonia política. Governos repressivos e abertamente racistas, como o polaco ou o húngaro, logram impor-se na União, agravando a dinâmica de desintegração. Mas os episódios de islamofobia ocorrem também em países dirigidos pelo centro político, reforçando a agenda da extrema direita. A proibição do burkini em Cannes teve apoio no próprio primeiro-ministro socialista e este semana os governos britânicos e franceses decidiram a construção de um muro em Calais, uma decisão que apenas agrava os problemas e alimenta a xenofobia.

Esta política de exclusão e de divisão das sociedades é uma doença que alastra pela Europa e que tem de merecer um combate reforçado. Quem ceder ao discurso do ódio na tentativa de suster perdas eleitorais e disputar terreno à extrema direita, apenas reforçará a sua implantação.

10. Turquia: Erdogan impõe regime autocrático

A instauração do estado de exceção na Turquia permite a Erdoğan governar por decreto como num regime autocrático. Nos últimos dois meses assistiu-se à perseguição de todos os partidos da oposição, a uma purga em massa do aparelho de Estado, a detenções arbitrárias e à imposição da censura na comunicação social. Os milhares de pessoas perseguidas não têm qualquer ligação direta ao fracassado golpe de Estado de 14 de Julho e estavam já listadas como indesejáveis pelos serviços secretos e pelo AKP, partido de Erdoğan.

Simultaneamente, sucedem-se os bombardeamentos turcos contra as forças curdas, as mesmas que se empenham no combate ao Daesh na Síria. As visitas do Vice-Presidente Norte-americano e do Secretário Geral da Nato a Ankara, apoiando o contra-golpe autocrático de Erdoğan, mostram mais uma vez a completa ausência de valores democráticos que impera na NATO. Do mesmo modo, a decisão da União Europeia de manter o vergonhoso acordo com a Turquia demonstra que o diretório europeu é capaz de tudo para bloquear os fluxos de refugiados.

11. A Venezuela perante a encruzilhada

A descida abrupta do preço do barril de crude teve penosas consequências sociais e económicas na Venezuela, afundando o país numa crise multifacetada. O governo liderado por Nicolas Maduro confronta-se com uma hiperinflação, quebra generalizada no nível médio de vida, crescimento do mercado paralelo e desemprego crescente, sendo incapaz de garantir o abastecimento de bens alimentares básicos, medicamentos, água e eletricidade aos seus cidadãos.

Ineficiente na resposta às várias crises, o governo de Maduro sofreu o castigo das urnas, perdendo para a oposição de direita as eleições legislativas de 6 de dezembro de 2015, e vê-se confrontado com um referendo revogatório para provocar eleições presidenciais antecipadas.

O Bloco de Esquerda repudia as recentes declarações do Presidente da República Bolivariana da Venezuela, Nicolás Maduro, que promete o despedimento das e dos funcionários públicos que tenham subscrito a petição para o referendo revogatório, e as notícias que dão conta da crescente repressão de cidadãos, movimentos sociais, sindicatos, e jornalistas que se opõem às políticas do governo. As tentativas de destabilização ou ingerência externa, que atentam contra a soberania democrática do povo venezuelano, não podem servir de justificação para o atropelamento de nenhum direito democrático.

12. Brasil: processo de afastamento de Dilma é golpe contra democracia

No passado dia 31 de agosto Michel Temer tomou posse como Presidente do Brasil, concluindo o processo de impeachment da Presidente Dilma Russeff. Tal como muitos dos seus ministros e deputados e senadores que o apoiaram, Temer está no centro de várias suspeitas, investigações e casos de corrupção. Um dos objetivos dos promotores da destituição da anterior presidente é precisamente o de garantir a sua própria impunidade perante o combate à corrupção e, particularmente, travar o caso Lavajato, em que muitos estão implicados. Ninguém desconhece que, apesar dos fundamentos legais para a destituição de um Presidente estarem bem definidos pela Constituição Brasileira – prática de crime de responsabilidade - este foi um processo estritamente político, para lá da legalidade, visando o derrube do governo democraticamente eleito. O Estado de Direito Democrático está em causa no Brasil, pelo atropelo do Princípio da Separação de Poderes, das mais elementares garantias de processo penal e do Princípio Democrático. Segue-se um ataque ao Estado Social, com a tomada de um conjunto de medidas regressivas quanto aos direitos dos trabalhadores e dos direitos sociais sem expressa legitimidade democrática decorrente da apresentação a sufrágio dos autores das mesmas com esse programa. O Bloco de Esquerda junta a sua voz à de quem, no Brasil e em todo o mundo, denuncia este processo como um golpe contra a democracia.

10 de Setembro de 2016

Mesa Nacional do Bloco de Esquerda

Reunião da Mesa Nacional do Bloco de Esquerda (imagem parcial) - Foto de Nuno Fox/Lusa