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Pegasus: Governo afasta diretora dos serviços secretos espanhóis

A espionagem aos telemóveis do primeiro-ministro e dos ministros do Interior e Defesa foi a gota de água no escândalo que está a abalar a política espanhola e catalã. Líder da ERC quer garantias que quem se senta à mesa de negociação não será espiado.
Margarita Robles na conferência de imprensa desta terça-feira. Foto Governo espanhol.

O Governo espanhol anunciou a substituição de Paz Esteban à frente do Centro Nacional de Inteligencia (CNI). A primeira mulher a dirigir os serviços de informações espanhóis e que ocupou cargos de responsabilidade desde a criação do organismo, em 2002, vê o seu mandato cessar ao fim de dois anos e dez meses no cargo. A demissão surge na sequência do escândalo de espionagem com recurso ao software israelita Pegasus, que extrai dados dos telemóveis e permite ter acesso ao microfone e câmara de filmar, além de intercetar todas as comunicações dos alvos.

Na semana passada, Paz Esteban esteve na comissão parlamentar de Segredos Oficiais para justificar 18 escutas sobre dirigentes políticos catalães com uma ordem do tribunal. Mas não conseguiu explicar qual a razão da escuta a Pere Aragonés, que em 2019 era vicepresidente do Governo catalão e hoje é o chefe desse executivo e dirigente de um partido que deu apoio parlamentar ao Governo de coligação PSOE/Unidas Podemos. Também não deu explicações sobre as restantes dezenas de políticos, advogados e ativistas pró-independência que foram alvos do Pegasus na mesma altura do referendo na Catalunha e no julgamento do "Procés", segundo as perícias forenses realizadas pelo Citizen Lab canadiano.

Mas o que levou agora à sua demissão foi a descoberta que também os telemóveis do primeiro-ministro Pedro Sánchez e da ministra da Defesa Margarita Robles foram alvos do mesmo software, aos quais se juntou agora o do ministro do Interior Grande-Marlaska. A coincidência temporal não apenas com o momento da decisão dos indultos aos políticos condenados do Procés, mas também com a crise diplomática com Marrocos, em maio e junho do ano passado, fez alargar o leque de suspeitos da autoria das infeções com o software espião, tendo em conta que a empresa israelita NSO Group afirma só o comercializar com Estados. Esta terça-feira está previsto o anúncio do resultado às perícias dos telemóveis dos restantes membros do Governo.

Para o lugar de Paz Esteban vai outra veterana dos serviços de informações. Esperanza Casteleiro era até agora secretária de Estado da Defesa e braço direito da ministra Margarita Robles.

Junqueras: Sánchez deve garantir "que os que se sentam numa mesa de negociação não são espiados"

A demissão da chefe do CNI era uma das exigências dos partidos independentistas catalães para o desfecho do escândalo. Em entrevista ao El País, o presidente da Esquerda Republicana da Catalunha (ERC) e um dos presos do Procés, Oriol Junqueras, não exigiu a cabeça da diretora do CNI, mas disse que "parece evidente que alguém deve assumir responsabilidades quando num Estado se espiam sessenta e tal pessoas, incluindo o presidente do Governo, a ministra da Defesa e a ex-ministra dos Negócios Estrangeiros [González Laya também foi espiada durante a crise com Marrocos em 2021]".

Junqueras defende que a investigação deve ir além da comissão parlamentar de Segredos Oficiais e que as explicações "têm de ser dadas num contexto mais amplo", apesar do PSOE e da direita terem chumbado a criação de uma comissão de inquérito ao caso. "Isto não é uma disputa entre a ERC e o Governo. É uma disputa entre os que estamos convencidos de que a democracia deve ser defendida e os que estão dispostos a sacrificar direitos fundamentais em função dos seus interesses políticos", afirma o líder da ERC, criticando "a direita cada vez mais extrema e a extrema direita" por impedirem essa transparência. "Se quem deu essas ordens acredita ter agido de forma adequada e em defesa de interesses nobres, não terá nenhum inconveniente em que se desclassifiquem essas ordens", prosseguiu Junqueras.

Em resposta aos críticos nos meios políticos independentistas que acusam a ERC de apoiar um Governo que os espia, Junqueras afirma que "não estamos aqui para derrubar governos nem para apoiar o Governo" e que o partido votará favoravelmente as propostas favoráveis à cidadania. Mas entre as questões "uteis para a cidadania está a de saber que não te estão a espiar", acrescenta, referindo-se ao voto contra da ERC à reforma laboral e ao pacote anticrise, que puseram em risco a maioria parlamentar a favor do executivo.

Sobre a mesa de negociações que reatou o diálogo entre os governos espanhol e catalão, Junqueras acusa Madrid de "arrastar os pés na concretização desta negociação" e volta a exigir que o Governo de Sánchez tome medidas, "como por exemplo garantir que os que se sentam numa mesa de negociação não são espiados". A "liberdade dos presos políticos, o regresso dos exilados e o fim da repressão" são os gestos que Junqueras gostaria de ver por parte de Madrid, na linha do defendido pelo Comité de Detenções Arbitrárias das Nações Unidas.

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