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O trunfo económico da campanha de Macron

A recandidatura de Macron aposta no argumento do bom desempenho económico francês nos últimos cinco anos. Mas ao contrário do que prometera nas anteriores eleições, foi ao aumento da despesa pública que recorreu para responder ao descontentamento social e à pandemia.
Emannuel Macron. Foto União Europeia.

Um dos trunfos que Macron parece ter agora que tenta a sua reeleição é um bom desempenho económico de França nos últimos cinco anos. É utilizado de tal forma que escolheu na primeira ronda da campanha eleitoral não debater com os restantes candidatos. Tanto a Reuters como o Financial Times providenciam um resumo dos principais indicadores económicos. No entanto, vale a pena relembrar em maior detalhe os seus anos de governação para uma análise mais fina dos gráficos.

As primeiras medidas que tomou após ser eleito, com o intuito de estimular o crescimento económico, foram a eliminação do imposto sobre a riqueza (impôt sur la fortune) e a implementação uma flat tax de 30% sobre os ganhos de capital. Na mesma linha, para criar um ambiente favorável às empresas e atrair investimento, reduziu a taxa de IRC de 33,3% para 25% e passou o crédito fiscal anual de 20 mil milhões de euros para os empregadores numa redução permanente das suas contribuições para a Segurança Social. Estas medidas combinadas parecem ter sido bem sucedidas - aumentaram o Investimento Direto Estrangeiro e a criação de novas empresas.

No entanto, dois pontos merecem ser sublinhados. Primeiro, esta suposta maior atratividade da economia francesa e capacidade de competição global não significaram uma melhoria na balança comercial. Pelo contrário, registou-se uma deterioração desta.

Depois, segundo os próprios dados do Governo, não houve uma alteração substancial das variáveis económicas relevantes - crescimento, investimento, fluxos de investimento dos particulares, etc. - antes e depois das reformas. O que se verificou sim foi um aumento de 64% nos pagamentos de dividendos em 2018 e um aumento do rendimento da classe mais alta - segundo o Instituto de Políticas Públicas de França, o 1% dos individuos mais ricos aumentaram os seus rendimentos depois de impostos em 2,8%. 

Outro dado salientado é a diminuição significativa do desemprego durante estes anos - no final de 2021 a taxa de desemprego atingiu os 7,4%, valor que só se verificara antes de 2008. Também aqui, a avaliação merece maior detalhe. O site de notícias France 24 levanta três pontos relevantes. Primeiro, a criação de emprego deveu-se largamente a um aumento da insegurança laboral: contratos de curto-termo, trabalho temporário, etc. Em 2020, o Instituto Nacional de Estatística francês estimava que 12,4% do total do emprego era trabalho precário. Com a reforma no final de 2021 dos benefícios de desemprego, que aumentou os requisitos de qualificação aumentaram e passo a penalizar os individuos que alternam entre contratos de curto-prazo e períodos de desemprego, houve uma aceitação de piores condições. Mais, as alterações no código laboral permitiram que se facilitasse o despedimento ao reduzir o peso das indemnizações sobre os empregadores. Segundo, para além da precariedade, a criação de emprego deveu-se a setores de baixo valor acrescentado. Por fim, em 2020, 1,9 milhões de indíviduos deixaram de ser contabilizados nas estatísticas de desemprego não por estarem empregados mas sim por já não se encontrarem ativamente à procura de trabalho.

Outro indicador utilizado é o poder de compra. Nos últimos cinco anos, este aumentou para a média da população em 1,6%. No entanto, para os 0,1% mais ricos esse aumentou 4%, enquanto para os 5% das famílias mais pobres diminui 0,5%.

Por fim, salienta-se a boa recuperação pós-pandemia da economia francesa, destacando-se face às outras economias europeias. Para isso contribuiu a disponibilidade que Macron mostrou em aumentar a despesa pública - aumentou o orçamento da saúde em 9,4% em 2020 e 7,4% em 2021, e, no total, as medidas de emergência nos dois anos ascenderam a 133,5 mil milhões de euros. No entanto, deve sublinhar-se que Macron durante o seu mandato viu-se forçado várias vezes a alterar a sua linha quanto a despesa pública como resposta às tensões sociais que enfrentou.

Aumento da despesa pública foi a solução para enfrentar dificuldades económicas

No verão de 2017, com o objetivo de manter o controlo orçamental imposto por Bruxelas, reduziu o apoio às famílias de baixo rendimento e os subsídios de emprego. Meses depois, e após ter sido apelidado de “presidente dos ricos”, o governo lançou um plano de combate à pobreza de 8,5 mil milhões de euros. Contudo, gradualmente atenuou este plano e manteve-se fiel aos cortes anunciados na sua campanha - planeava 25 mil milhões de euros em poupança nas despesas públicas. Estes incluíam 15 mil milhões no setor de saúde que levaram a que as necessidades de contratação de pessoal não fossem correspondidas. Quando sucessivamente confrontado com protestos, Macron apoiava-se na fórmula da não existência de “dinheiro mágico”. 

Finalmente, em novembro de 2018, com a implementação de um imposto de carbono sobre o combustível, e com o acumular desta tensão, o movimento dos Coletes Amarelos surgiu. No início, parecendo um protesto maioritariamente dos camionistas, foi negligenciado pelo Governo, mas com o passar dos meses e o agregar de vários descontentamentos, Macron teve que alterar a sua estratégia política. Respondeu com um aumento nos gastos públicos de 17 mil milhões - 5 mil milhões em cortes de IRS, bónus para os trabalhadores de baixo rendimento e aumento das pensões mínimas. 

Assim, com a pandemia o mesmo aconteceu: foi necessário aumentar a despesa pública. Até à data Macron seguia uma linha de contenção, diminuindo progressivamente o défice orçamental - em 2016 este representava 3,4% do PIB, já em 2017 2,8%, e em 2018 2,3%. Em 2020 este cresceu para 9,2% do PIB.

Quando anunciou a sua recandidatura voltou a focar-se no que ficou por fazer: reduzir mais os impostos, diminuir a despesa pública, reformar o sistema de pensões para aumentar a idade de reforma e simplificar os benefícios e liberalizar ainda mais o mercado laboral. 

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