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Medo de ir ao hospital: médicos preocupados com doentes não urgentes

Ordem dos Médicos e profissionais de saúde mostram-se preocupados com doentes não urgentes e com doentes não Covid. "Haverá certamente maior mortalidade, mas estamos todos a fazer o melhor que podemos", explicam.
Doentes devem continuar a contactar o 112 e a deslocar-se às urgências sempre que for necessário, reforçam profissionais de saúde.
Doentes devem continuar a contactar o 112 e a deslocar-se às urgências sempre que for necessário, reforçam profissionais de saúde. Fotografia de Paulete Matos.

Ordem dos Médicos e doentes receiam que a pandemia de Covid-19 conduza a um aumento, direto ou indireto, dos óbitos relacionados com o aparelho circulatório e cancro, as principais causas de morte em Portugal.

A reorganização dos serviços de saúde para fazer frente a pandemia do novo coronavírus, mas não pode deixar os doentes não Covid sem os cuidados clínicos necessários, é essa a opinião de Miguel Guimarães, bastonário da Ordem dos Médicos, divulgada em comunicado.

Em declarações ao Jornal de Notícias, Fausto Pinto, presidente do Conselho de Escolas Médicas Portuguesas, diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa e diretor do Departamento de Coração e Vasos do Centro Hospitalar Lisboa Norte, demonstra preocupação com a situação, mas garante que há hospitais que mantém a mesma resposta aos doentes não Covid, “porque as outras patologias não deixam de existir”.

"O que está a acontecer é um fenómeno que nos preocupa e do qual já dei nota enquanto presidente do Conselho de Escolas Médicas Portuguesas, que é de as pessoas terem medo de vir às urgências. A procura diminuiu cerca de 40 a 50 por cento e os enfartes agudos do miocárdio na mesma ordem. O receio é natural, mas é preciso dizer às pessoas que podem e devem recorrer aos serviços de saúde em caso de urgência, que estão preparados para os receber em segurança. Atrasar a ida ao hospital em caso de enfarte pode ter consequências catastróficas", alerta.

A quebra nas deslocações às urgências desde o início da pandemia em Portugal é outra preocupação dos profissionais de saúde. Ana Paiva Nunes, vice-presidente da Associação Portugal AVC e coordenadora da unidade de AVC do Hospital de São José, refere-o em declarações ao mesmo jornal. A médica relata que o fenómeno de quebra nas idas às urgências se nota também no hospital onde trabalha e considera que um aumento da mortalidade por acidente vascular cerebral neste período poderá em grande parte dever-se ao facto de as pessoas esperarem até à última para chamar o INEM.

"As instruções que os hospitais receberam foi para manter tudo o que era atividade urgente, consultas, cirurgias, exames, vias verdes. Portanto, as vias verdes do AVC mantêm-se e mantém-se tudo o que é tratamento de casos agudos. Mas, de facto, e falo só pelo meu serviço - mas reunimo-nos na Sociedade Portuguesa de AVC e confirmei que a tendência é geral -, há uma redução de cerca de 20 por cento de ativações emergentes e muitos dos casos que nos chegam esperaram tempo de mais. Têm os sintomas, mas ficam à espera de que passe, e o prognóstico nestes casos é muito pior", lamenta.

A médica refere igualmente os doentes em tratamentos de reabilitação e fisioterapia e o acompanhamento de doentes em recuperação. O encerramento da generalidade das clínicas é mau, mas reconhece que “os recursos são limitados. Não é possível fazermos o que fazíamos antes da pandemia, só se duplicássemos os hospitais e os recursos, humanos e materiais".

"As preocupações da Ordem dos Médicos fazem todo o sentido, haverá certamente maior mortalidade, mas estamos todos a fazer o melhor que podemos".

Todos os profissionais de saúde reforçam que as pessoas devem continuar a ligar para o 112 em caso de urgência e a deslocar-se às urgências hospitalares sempre que necessitem. Os sinais de alerta de AVC são os mesmos: dificuldade na fala, falta de força no braço e boca ao lado.

“Não há que ter medo de vir ao hospital porque estão criados os percursos para covid e não covid. O 112 está a dar resposta."

José Miguel Correia, presidente da Associação Portuguesa de Insuficientes Renais, refere que os cuidados a estes doentes estão a ser feitos através da telemedicina e, nos casos em que não existem alternativas, continuam a haver consultas em contexto hospitalar. O representante de cerca de 20 mil doentes renais crónicos em tratamento explica também que a medicação tem sido enviada para casa e que até ao momento não receberam queixas.

A associação está, contudo, preocupada com aqueles que necessitam de hemodiálise. "São cerca de 12 mil e têm de se deslocar três vezes por semana ao centro e são pessoas que geralmente têm duas ou mais patologias associadas, como a hipertensão e a diabetes, e muitos estão acima dos 70 anos. São de altíssimo risco. São a nossa maior preocupação, mas sabemos que estão implementados planos de contingência para garantir a sua proteção e diminuir ao máximo os riscos de contágio. Mas andamos assustados. Andamos todos muito assustados."

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