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Lei da cidadania na Índia promove violência contra muçulmanos, diz ONG

Human Rights Watch denuncia a promoção da violência religiosa por parte do BJP, o partido do governo na Índia. Relatório denuncia a perseguição e violência dirigida a pessoas muçulmanas com a conivência do governo e da polícia.
Lei da cidadania na Índia promove violência contra muçulmanos, diz ONG
Fotografia de Human Rights Watch.

A organização não governamental Human Rights Watch (HRW) veio denunciar num relatório hoje publicado o papel que a nova lei da cidadania da Índia está a ter na promoção da violência para com a comunidade muçulmana daquele país.

A emenda à lei da nacionalidade foi aprovada em dezembro de 2019. Nela, é reconhecido o direito à nacionalidade a refugiados pertencentes às principais religiões, exceto a pessoas da comunidade muçulmana. A alteração legislativa foi imediatamente alvo de críticas, com os críticos a argumentar que abala as fundações seculares da Índia ao garantir o direito à cidadania com base na religião.

Criada com o argumento de impedir a imigração ilegal, esta emenda impedirá também o acesso à nacionalidade a muçulmanos que vivem na Índia à gerações, mas que não possuem qualquer registo civil. O Supremo Tribunal da Índia está atualmente a avaliar a constitucionalidade da emenda.

A par dos protestos, o país tem vindo desde então a ser palco da maior onda de violência das últimas décadas. Foi essa a situação que motivou a elaboração do relatório "'Dispare nos traidores': discriminação contra muçulmanos sob a nova política de cidadania da Índia" pela HRW e hoje tornado público.

Nele, a organização denuncia as falhas da polícia indiana em intervir quando apoiantes do Bharatiya Janata Party (BJP), o partido do governo, atacam aqueles que se manifestam contra esta emenda legislativa ou cidadãos muçulmanos em geral. Falhas essas, denunciam, que não se observam quando se trata de dispersar as manifestações pacíficas contra a lei.

Segundo a agência Lusa, este relatório baseia-se em mais de cem entrevistas com vítimas de violência e seus familiares na zona de Nova Deli, Assam e Uttar Pradesh. Em paralelo, a HRW entrevistou especialistas em direito, académicos, ativistas e membros da polícia.

Testemunhas e vídeos citados pela HRW comprovam a cumplicidade da polícia com a violência dirigida à população muçulmana. Num vídeo consta mesmo um episódio em que agentes policiais batem em cinco muçulmanos feridos nos confrontos e ordenam-lhes que cantem o hino nacional.

A onda de manifestações e os relatos de ataques a mesquitas e comércio gerido por pessoas muçulmanas não motivaram o adiamento do processo de registo. Só o surgimento da pandemia da Covid-19 fez o governo de Modi adiar o processo de registo populacional.

A HRW denuncia no relatório as ameaças feitas por dirigentes do BJP aos manifestantes, enquanto alguns dos seus apoiantes se envolveram em ataques contra críticos e manifestantes antigovernamentais. Alguns líderes do BJP pediram inclusive que os manifestantes, descritos como "traidores", fossem mortos.

Em agosto do ano passado, Assam tornou-se o primeiro estado indiano a concluir o registo nacional de cidadãos. Mas fora do processo ficaram quase dois milhões de pessoas em risco de detenção arbitrária e de ficarem apátridas naquele estado no nordeste da Índia.

A HRW descobriu que o registo em Assam carecia de padronização, levando a decisões arbitrárias e discriminatórias por parte dos funcionários, tornando muito difícil a reivindicação da cidadania por parte dos mais pobres, que não têm acesso à documentação de identidade, sendo as mulheres o grupo populacional mais propenso a não ter acesso à documentação.

Até ao momento, os muçulmanos compõem a maioria dos julgados e são também a maioria dos que foram considerados estrangeiros – até funcionários do governo e militares foram considerados imigrantes em situação irregular.

Segundo o relatório da HRW, a emenda à lei da cidadania viola as obrigações internacionais da Índia de impedir a privação da cidadania com base na raça, cor, descendência e origem nacional ou étnica. A ONG defende que o Governo indiano deve revogar a emenda e garantir que qualquer futura política nacional de asilo e refúgio não discrimine por nenhum motivo, incluindo religião, e cumpra os padrões legais internacionais.

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