“O preço do sangue”. Assim é chamada no Irão a indemnização que permite aos condenados à morte obter um perdão “remunerado” da pena. Em 2019, terão sido 350 aqueles que conseguiram evitar a pena capital através deste sistema. Facto que não impediu o país de ter sido, nesse mesmo ano, o segundo que mais execuções fez, 280 segundo números da Iran Human Rights. No mundo, apenas a China aplica mais este tipo de pena.
A lei iraniana coloca o destino do condenado nas mãos da sua família. Após a condenação, esta deverá decidir se a execução prossegue ou se paga a “diyya”, o “preço de sangue”. Este valor é reavaliado anualmente pelo Banco Central, atualizando-se consoante a inflação. Em 2020, a indemnização mínima foi fixada em 66.500 euros. Corresponde aproximadamente a 13 anos de salários para quem ganhe um salário médio.
Uma instituição jurídica que, claro, penaliza os mais pobres. Mas o número de perdões remunerados tem vindo a crescer, dizem as organizações defensoras dos direitos humanos, devido à mobilização da sociedade civil contra a pena de morte.
Em declarações à France 24, Mahmood Amiry-Moghaddam, da Iran Human Rights, explica que “nestes últimos anos, estes casos são cada vez mais mediatizados no Irão. Seja através de filmes, da televisão ou das redes sociais, um número crescente de associações mas também de celebridades, desportistas e artistas, envolvem-se para ajudar as famílias a recolher dinheiro para pagar a diyya”. Num país em que é ilegal criticar a pena de morte, estas mobilizações são, contudo, permitidas. A agência noticiosa iraniana Ilna dá, por exemplo, conta de uma das mais recentes: a seis de outubro um homem acusado de homicídio na sequência de uma rixa conseguiu escapar à pena de morte, pagando os 200 mil euros exigidos pela família da vítima. O dinheiro foi obtido depois de lutadores da equipa nacional iraniana terem lançado nas redes sociais um apelo para a recolha de fundos.
As ONG locais classificam o sistema como perverso e sublinham que é um “potente instrumento de discriminação social”. É o que pensa Karim Lahidji, presidente da Liga para a Defesa dos Direitos Humanos do Irão que acrescenta: “em teoria, as famílias podem perdoar sem pedir uma compensação financeira. Mas numa esmagadora maioria dos casos, as vítimas exigem somas superiores ao mínimo exigido. Uma pessoa rica pode assassinar a sua mulher, pagar e passar apenas um ou dois anos na prisão. Para os pobres, as negociações podem durar anos e ter um peso destrutivo nas famílias.”
Denuncia-se ainda a instrumentalização política deste sistema: “aqueles que incomodam o poder são executados sem negociação possível”. Por exemplo, na recente vaga de manifestações contra a subida do preço dos combustíveis, estima-se que 1.500 pessoas tenham sido mortas, algumas em execuções sumárias extra-judiciais.
Dia Mundial contra a pena de morte
Este sábado, assinala-se o Dia Mundial contra pena de morte. A coligação mundial contra a pena de morte dedica a campanha deste ano à necessidade das pessoas acusadas terem uma representação jurídica eficaz na tentativa de garantir processos regulares, o que pode ser “ diferença entre a vida e a morte”.
O objetivo da organização, contudo, continua a ser a “abolição total e o mais rápido possível da pena de morte, em todo o mundo e para todos os crimes”.