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Guterres foi a Davos comparar petrolíferas à indústria tabaqueira

O secretário-geral da ONU acusou os produtores de combustíveis fósseis de saberem que o seu modelo de negócio é incompatível com a sobrevivência humana.
António Guterres em Davos. Foto Benedikt von Loebell/World Economic Forum/Flickr

No seu discurso na conferência que junta na estância suíça de Davos a elite financeira e política mundial, António Guterres voltou a criticar duramente a indústria petrolífera por se recusar a abandonar um modelo de negócio incompatível com a sobrevivência da humanidade.

"Tal como a indústria tabaqueira, desprezaram a sua própria ciência. Nas grandes petrolíferas, houve quem apregoasse uma grande mentira. E tal como a indústria tabaqueira, os responsáveis devem ser chamados à pedra", afirmou o secretário-geral da ONU, referindo-se às recentes notícias de que a petrolífera Exxon sabia desde os anos 1970 do impacto da sua atividade no aquecimento global.

Guterres acrescentou que "hoje em dia, os produtores de combustíveis fósseis e os seus facilitadores ainda estão na corrida para aumentar a produção, sabendo bem que o seu modelo de negócio é incompatível com a sobrevivência humana. Esta insanidade mais parece ficção científica, mas sabemos que o colapso do ecossistema é um facto científico rigoroso".

Num discurso bastante duro, não escaparam às críticas de Guterres as empresas que têm assinado compromissos "net-zero", com vista à redução de emissões poluentes, mas cujos critérios de avaliação "são muitas vezes duvidosos ou obscuros", o que lhes serve para "enganar os consumidores, investidores e reguladores com falsas narrativas". Isso alimenta "uma cultura de desinformação e confusão climática" que "deixa a porta bem aberta ao greenwashing", acusou, acrescentando que depender dos créditos de carbono não significa cortes reais das emissões.

E se a batalha para manter o limite de 1,5°C de aumento da temperatura global até ao fim do século "será ganha ou perdida nesta década", Guterres diz não ter dúvidas de que "neste momento, está a ser perdida".  

Ante a plateia de empresários e políticos, António Guterres deixou ainda o apelo ao abandono do carvão e ao investimento massivo nas energias renováveis, ao fim da dependência dos combustíveis fósseis e ao cumprimento do compromisso de financiam com 100 mil milhões de dólares a ajuda aos países em desenvolvimento que estão na primeira linha dos impactos das alterações climáticas. "O financiamento para a adaptação deve ser duplicado. E os principais emissores - nomeadamente os países do G20 - devem juntar-se num pacto de solidariedade climática para fazerem esforços adicionais nesta década para manter viva a meta do 1,5°C", apelou.

Guterres defende corte da dívida dos países em desenvolvimento

António Guterres condenou ainda a desigualdade crescente no atual sistema económico entre o Norte e o Sul, dando conta que neste último cresce a "frustração e raiva por um sistema financeiro moralmente falido no qual as desigualdades sistémicas estão a ampliar as desigualdades sociais", com os países mais pobres a verem os pagamentos do serviço da dívida "a disparar 35% apenas no último ano".

Para reduzir este fosso, Guterres defendeu "uma nova arquitetura da dívida" para permitir a estes países terem acesso a liquidez, alívio e restruturação da dívida e financiamento a longo prazo, de forma a que possam investir no desenvolvimento sustentável. Isso passa pela mudança de modelo de negócio dos bancos de desenvolvimento multilaterais, mas não pode ser feito, acrescenta Guterres, sem que estes sejam os pimeiros a assumir o risco para a entrada de financiamento privado massivo nesses países a custo razoável.

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