Com a escalada de preços no mercado grossista a continuar, o governo espanhol anunciou medidas para reduzir o preço da fatura da eletricidade aos consumidores finais. Uma delas passa por cortar temporariamente as margens de lucro dos produtores de eletricidade que não utilizam gás natural. O preço deste tem subido e, devido ao desenho do mercado, as empresas que não o usam acabam também por se fazer pagar aos mesmos preços. Em junho passado foi apresentado um anteprojeto de lei para acabar com os lucros “caídos do céu” das empresas hidráulicas e nucleares que produzem eletricidade sem emitir CO2 e que ganham como se o tivessem de pagar.
As elétricas responderam com a ameaça de “fecho da atividade do parque nuclear se o projeto de lei do CO2 for em frente nos termos previstos”.
O Foro Nuclear, organização que junta as empresas que exploram as centrais nucleares espanholas, fala numa “excessiva pressão fiscal atual”, alegando que o regime de renovação periódica de licenças implica “investimentos adicionais” que se somam aos 3.000 milhões já previstos, e que tudo somado a atividade deixaria de ser lucrativa. Assim, portanto, a solução seria encerrar antecipadamente esta que é a fonte de 20% da eletricidade do país. O que, a ser concretizável e não apenas uma ameaça negocial, implicaria mais pressão ainda sobre os preços.
Pedro Sánchez respondeu-lhes esta terça-feira no Parlamento que “o Governo defenderá o interesse dos cidadãos acima de qualquer interesse e pressão particular” e que “o justo é que todos contribuamos”. E aproveitou para criticar o PP por não se colocar “do lado das PMEs, dos cidadãos e da indústria” preferindo defender os ganhos das grandes empresas elétricas que têm carácter “confiscatório”. A expressão “confiscatórias” e de “legalidade duvidosa” tinha sido utilizada pela direita na sua crítica ao projeto do governo PSOE/Unidas Podemos.
Como outra arma contra a direita, o Governo espanhol fez saber que conta com o apoio da Comissão Europeia para as medidas, nomeadamente do vice-presidente Frans Timmermans, que há dias, depois de um encontro com a vice-presidente do executivo Teresa Ribera, responsável pela pasta, escreveu no Twitter: “estamos comprometidos com uma transição verde justa e prontos para apoiar a Espanha nos seus investimentos em energias limpas, eficientes, e na sua luta contra a pobreza energética”.
O que propõe o governo espanhol
No passado mês de junho o governo espanhol tinha implementado a redução do IVA da eletricidade de 21% para 10% até ao final do ano para consumos até 10 kW e a suspensão do imposto de geração de energia também até ao fim de 2021. Os preços continuaram a escalar e, depois disso, foram anunciadas duas medidas para acabar com o bónus às energias renováveis e o mecanismo para deduzir as receitas de CO2.
O Conselho de Ministros desta terça-feira acaba por estabelecer um conjunto de medidas apresentadas como um “plano de choque” com o objetivo de baixar a fatura do consumidor médio do mercado regulado em 22% até ao final do ano.
A mais contestada pelas elétricas é o corte temporário, até 31 de março de 2022, dos “benefícios extraordinários” que as hidroelétricas e centrais nucleares ganham devido ao aumento do preço do gás de 250% num ano. Este aumento de preço repercute-se em toda a eletricidade e as centrais que não queimam gás nem pagam imposto sobre o CO2 lucram mais. Esta medida renderá ao Estado, prevê-se, 2.600 milhões de euros.
Está previsto ainda o alargamento do consumo mínimo vital, um plafond mínimo de acesso à energia com uma potência de 3,5 kv, e a ampliação de proibição de cortes de serviço a consumidores vulneráveis; uma reforma da lei das águas para evitar transvases súbitos e garantir “um uso racional da água” com patamares mínimos e máximos de descargas estabelecidos anualmente; um aumento do limite de dinheiro arrecadado pelo Estado com direitos de emissão de CO2 que pode ser usado para encargos do setor elétrico; limites às subidas do gás na fatura ao consumidor; criação de sub-leilões de energia de forma a “obrigar” as grandes empresas a transferir parte da sua energia para empresas autónomas de distribuição e grandes consumidores, reduzindo o peso do mercado grossista na formação dos preços; para além da concretização das já anunciadas descidas do IVA para 10% e da suspensão do imposto de geração de energia, vai-se baixar o imposto da eletricidade até ao limite permitido por Bruxelas.