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Fundos de investimento especulam com dívida italiana

Desde a crise do euro que as apostas dos investidores contra a dívida italiana não eram tão elevadas, num contexto de incerteza face à queda do governo de Mario Draghi e à ascensão da extrema-direita nas sondagens.
Foto Rafael Matsunaga/Flickr

A dívida pública de Itália tem sido alvo de especulação por parte dos fundos de investimento. Aproveitando o contexto de grande incerteza face à queda do governo de Mario Draghi e à ascensão da extrema-direita nas sondagens, os investidores estão a apostar contra a dívida italiana, algo a que não se assistia com tanta expressão desde a crise do euro.

A notícia foi avançada pelo jornal britânico Financial Times, que dá conta de que o valor total de títulos de dívida pública adquiridos por investidores que estão a apostar na queda do seu valor atingiu os 39 mil milhões de euros, o valor mais alto desde janeiro de 2008. O aumento do spread – isto é, a diferença entre a taxa de juro que os investidores exigem ao governo italiano para contrair dívida pública e aquela que exigem à Alemanha, o país em que os mercados mais confiam – é revelador desta tendência.

O clima de incerteza política, aliado à crise energética que a Europa atravessa devido à dependência de combustíveis fósseis russos, parece ter-se tornado uma oportunidade para os mercados financeiros. De acordo com as contas do FMI, o embargo do gás natural por parte da Rússia pode levar a uma contração de 5% do PIB em Itália, empurrando o país para uma crise de proporções consideráveis. Além disso, a inversão da política monetária do BCE, que pretende reduzir o ritmo de compra de títulos de dívida pública dos países da Zona Euro, acrescenta riscos para os países mais endividados, como é o caso de Itália.

A pressão dos mercados já parece estar a produzir alguns efeitos importantes: na terça-feira, o ex-primeiro-ministro Mario Draghi apelou aos partidos que formarem governo após as eleições que terão lugar em setembro para honrarem o compromisso do país com as reformas estruturais e com uma estratégia de contenção orçamental que promova a “credibilidade internacional” do país.

Ferramenta do BCE só ajuda com condicionalidades

A especulação financeira em torno das dívidas públicas foi uma das principais razões para as dificuldades enfrentadas por países como a Grécia, Itália ou Portugal durante a última crise financeira. Recentemente, o Banco Central Europeu (BCE) anunciou a criação do Instrumento de Proteção de Transmissão, uma ferramenta cujo objetivo seria ajudar a evitar uma repetição dessa situação, através da compra de títulos de dívida de forma a estabilizar o seu preço no mercado.

No entanto, não é certo que o BCE atue nesta situação, uma vez que o recurso à nova ferramenta depende de uma avaliação sobre se o aumento das taxas de juro se deve a especulação ou ao que o banco central chamou “fundamentos económicos” – que incluem critérios como a evolução da dívida pública ou da despesa do Estado –, além de depender da “severidade dos riscos”. A ambiguidade da formulação utilizada pelo BCE abre espaço para a discricionariedade no apoio aos países.

Mais: o BCE apenas apoia países que se encontrem em cumprimento das regras orçamentais inscritas no Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC). Isto significa que os países devem respeitar os limites definidos para a dívida pública (60% do PIB) e para o défice orçamental (3% do PIB), ou, caso os excedam, as metas apertadas de redução da dívida a cada ano. A dívida italiana excede largamente este valor (encontrava-se em cerca de 150% do PIB no final de 2021) e o país poderia ser forçado a adotar medidas de austeridade.

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