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"Fazia sentido que o Governo se entendesse com a esquerda sobre a descentralização"
No documento propõe-se que a Assembleia da República recomende ao Governo que “a descentralização de competências promova a democracia, a participação e capacidade de decisão cidadã e, como tal, apenas sejam recetoras de competências as autarquias locais (freguesias, municípios e regiões administrativas) eleitas por sufrágio universal”.
O grupo parlamentar do Bloco defende que sejam adotados “mecanismos que tenham em vista, num processo de descentralização, a criação das regiões administrativas enquanto fator democrático essencial, para que sejam assegurados órgãos com legitimidade própria, pluralidade, escala, meios e capacidade de decisão das respetivas populações”.
Além de preconizar que “a descentralização não englobe competências dos serviços públicos cujo exercício não recomende uma escala municipal ou que coloque em causa a autonomia do ensino”, o Bloco de Esquerda defende que, “nas grandes áreas urbanas possam ser criadas novas formas de organização territorial com eleição direta, nomeadamente as áreas metropolitanas”.
A descentralização deve ainda “manter a universalidade dos serviços públicos, sendo a mesma realizada com a devida transferência financeira plurianual e interditando privatizações ou concessões a privados”, bem como proteger “os direitos laborais” dos trabalhadores e a “sua inclusão no processo de integração de precários na função pública”.
O parlamento discute na quinta-feira a proposta do governo para a transferência de competências para os municípios nas áreas, entre outras, da educação, saúde (cuidados primários e continuados), ação social (com a rede social), transportes, cultura, habitação, proteção civil, segurança pública, áreas portuárias e marítimas e gestão florestal.
“O que está em discussão é a lei-quadro, que é genérica, mas que contém um conjunto de conceitos com os quais discordamos”, admitiu à Lusa o deputado Pedro Soares.
O deputado explicou que o Bloco não concorda “que os municípios são o centro da prestação de serviços públicos”, lamentando que o Governo tenha deixado cair, para já, a eleição direta nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto.
“Cerca de 70% dos nossos municípios têm menos de 30.000 habitantes, não estão preparados para um conjunto de funções, para além de que a proposta confere aos municípios uma excessiva concentração de poderes que tem a ver com a universalidade do Estado social e isso preocupa-nos”, frisou.
Para Pedro Soares, as regiões administrativas devem “ser a escala adequada para a descentralização de determinadas competências ao nível do Estado social”, criticando, no entanto, a transformação das comissões de coordenação e desenvolvimento regional (CCDR) “numa coisa que nem era regionalização, nem era municipalismo”.
“Fazia todo sentido que o Governo se entendesse com a esquerda neste processo de descentralização”, salientou o deputado do Bloco, apontando os riscos do PS e do PSD caminharem no sentido do “conceito de descentralização que o ex-ministro Miguel Relvas tinha”.
A criação de “uma escala intermédia” deve ser concretizada através de entidades com “legitimidade democrática própria”, o que não acontece com as CCDR ou as comunidades intermunicipais, que juntam um conjunto de municípios.
“Devido a essa previsível incapacidade dos municípios, por falta de escala para acolherem essas competências, o que vai acontecer é um processo de privatização, de ‘outsourcing’ dessas funções, porque essa escala vai ser adquirida através de empresas que vão juntar oito, nove, 10, 15 municípios”, alertou Pedro Soares.
O Governo comprometeu-se, a par da discussão da lei-quadro da descentralização de competências para os municípios e entidades intermunicipais no parlamento, a avançar com a revisão da Lei das Finanças Locais e apresentação de mais de uma dezena de diplomas complementares durante o processo legislativo.
As freguesias terão novas atribuições próprias em função da natureza e dimensão, de acordo com a população e capacidade de execução.
O parlamento marcou para 16 de março a discussão na generalidade das propostas de descentralização do Governo e dos partidos, incluindo do PSD, PCP e CDS-PP.
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