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“Eutanásia não é escolher a morte: é escolher a vida que temos quando estamos a morrer”

Em entrevista ao Expresso, o deputado José Manuel Pureza fala sobre o projeto do Bloco de regulamentação da morte assistida, defendendo que o legislador deve ter coragem para dar alternativas aos cidadãos “perante um horizonte de sofrimento indizível”.

A proposta será discutida e votada após o debate, já agendado para 1 de fevereiro, da petição que solicita a despenalização da eutanásia em Portugal, subscrita por mais de oito mil pessoas.

“O projeto está pronto no essencial. A seguir a uma primeira redação, auscultámos a opinião de mais de dezena e meia de pessoas, nas áreas da saúde, Direito Penal e bioética. Vamos continuar a fazer essa auscultação e contamos apresentar o projeto logo a seguir à discussão da petição na AR. E apresentamos a seguir porque queremos valorizar todos os momentos do debate, num processo de interlocução com um vasto conjunto de personalidades das mais variadas proveniências, para que o projeto seja entendido como sério, credível, prudente e corajoso”, assinala o deputado.

Assumindo a “delicadeza do tema”, José Manuel Pureza, responsável pelo relatório do grupo de trabalho que discutiu a petição na Assembleia da República, defende que o legislador deve ter coragem para dar alternativas aos cidadãos “perante um horizonte de sofrimento indizível e degradante aos seus próprios olhos”.

Sobre quem poderá recorrer à morte medicamente assistida, o dirigente do Bloco clarifica que só terão acesso “pessoas maiores de 18 anos e portadoras de uma lesão definitiva e incurável, ou doença fatal, e que estejam numa condição de sofrimento atroz. E só cidadãos nacionais ou legalmente residentes”.

Deverão existir “pelo menos dois médicos envolvidos no processo” e “o pedido deve ser apresentado a um médico escolhido pela pessoa e que pode ser o seu médico de família ou não”, realça.

“Mas deve haver também, obrigatoriamente, um parecer de um médico especialista na área clínica da doença de que a pessoa é portadora. Há ainda a possibilidade de — havendo dúvidas sobre a liberdade e consciência do pedido —, ser solicitado um parecer a um médico especialista em psiquiatria. E o médico que acompanha todo o processo terá obrigações no diagnóstico e prognóstico da condição física e do sofrimento que poderá daí advir, mas também na informação cabal sobre terapêuticas ajustadas à sua condição, designadamente na área dos cuidados paliativos”, acrescenta José Manuel Pureza.

A proposta contempla que, “entre o pedido formulado ao médico responsável, o parecer do médico especialista ou o eventual recurso a um médico psiquiatra, haverá um conjunto de passos em que sistematicamente se testa a consistência e permanência inequívoca da vontade da pessoa”.

A morte medicamente assistida poderá, conforme propõe o Bloco, ter lugar “em todos os estabelecimentos de saúde que reúnam as condições para o efeito e que estejam licenciados para atos médicos. E no domicílio do doente, desde que o médico considere que tem condições”.

Questionado sobre se a objeção de consciência está refletida no projeto bloquista, José Manuel Pureza frisa que “nem podia ser de outra maneira numa lei séria e rigorosa”.

Já no que concerne à oposição do atual bastonário da Ordem dos Advogados, Pureza refere que valoriza todas as opiniões, mas destaca uma em especial, “a do então presidente do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, João Lobo Antunes, que questionado sobre se se trataria ou não de um ato médico, respondeu: ‘A eutanásia é um ato médico, nem podia deixar de ser’”.

O dirigente do Bloco sublinha que “a eutanásia não é escolher a morte: é escolher a vida que temos quando estamos a morrer”.

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