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EUA: Movimento de esquerda quebra relações com socialistas europeus

Os Socialistas Democráticos da América [Democratic Socialists of America] acusam os socialistas europeus de "liderarem o ataque ao estado social e aos direitos dos trabalhadores".
Boletim de voto da convenção da DSA 2017.
Boletim de voto da convenção da DSA 2017.

Desde os anos 70 e início dos 80 que a vasta maioria dos partidos filiados na Internacional Socialista (IS) adotaram o neoliberalismo e as políticas de austeridade. Em muitos países, eles lideraram o ataque ao estado social e aos direitos dos trabalhadores e sindicatos. Como consequência, muitos estão numa profunda crise eleitoral, potencialmente terminal, tal como se demonstra na recente implosão do Partido Socialista Francês, o Partido Trabalhista Holandês, e o PASOK na Grécia, para nomear alguns”. 

O excerto não pertence a nenhum documento programático do Bloco de Esquerda ou qualquer movimento da “velha” esquerda europeia, mas sim às teses aprovadas na última convenção dos Socialistas Democráticos da América [Democratic Socialists of America - DSA], realizada no início de agosto de 2017, onde decidiram quebrar relações com a família de partidos políticos que inclui o Partido Socialista português. A organização norte-americana era membro da Internacional Socialista desde a sua fundação.  

Para quem acompanhou a campanha das presidenciais nos EUA, nomeadamente as primárias do Partido Democrático entre 2015 e 2016, poderá reconhecer a fórmula “Democratic Socialist” (Socialista Democrático) com que Bernie Sanders repetidamente se definia ideologicamente. E não é por acaso. O número de militantes do DSA acaba de explodir, passando de 8 para 27 mil membros com quotas pagas em poucos meses, na sua maioria jovens que se definiram como socialistas através da campanha de Bernie Sanders. Num país onde a palavra “socialista” tinha sido afastada da discussão pública como forma de “anti-americanismo” proibido, um homem calvo de 70 anos não seria o herói mais expectável para a sua recuperação. 

O DSA tem raízes no socialismo americano do século XIX. Em 1912, o Partido Socialista da América [Socialist Party of America] chega a receber 6% das intenções de voto nas presidenciais sob a liderança de Eugene Debb. A revolução russa de 1917 reforça drasticamente o movimento no pós-primeira guerra mundial, impulsionando uma série de disputas laborais nos principais centros industrais dos EUA - nomeadamente em Chicago -, que viria a ser reprimido numa operação violenta e concertada por parte das autoridades policiais em 1920. Apenas em Chicago, cerca de 150 militantes socialistas, comunistas e anarquistas foram presos, alguns deportados. 

O segundo momento de histeria anti-comunista, lançada por McCarthy nos anos 40 e 50, quebra a espinha aos radicalismo trabalhista nos EUA, que fica cingido a cúpulas internas ao Partido Democrático. Mas as divisões criadas pelo Partido Democrático nas estruturas sindicais - que amarra à guerra do Vietname - afasta definitivamente o movimento trabalhista dos movimentos sociais anti-guerra, movimentos pelos direitos civis e movimentos feministas nascentes. 

Em 1973, Michael Harrington assume a cisão com o Partido Democrático criando o DSA, não como partido mas sim como organização sem fins-lucrativos, que se mantém até hoje. No entanto, durante os últimos quarenta anos, o DSA tem obetivamente funcionado como um apoiante recalcitrante de candidatos presidenciais do Partido Democrático, num alinhamento centrista pouco confortável que, agora, parece ter acabado. 

Em 1976, Harrington declarava o seu apoio a Jimmy Carter de forma reconhecível nas palavras de Cunhal para com Soares: “Se Carter ganhar, ele fará algumas coisas horrendas - vos garanto… Mas as condições de uma vitória de Carter são as condições para a militância das classes trabalhadoras, e a militância de grupos minoritários, e a militância de mulheres, e a militância do movimento democrático reformista”. 

Agora, o discurso é outro. Ramirez-Rosa, recém-eleito conselheiro municipal de Chicago (a cidade tem 50 conselheiros [alderman], eleitos por cada distrito da cidade para um corpo legislativo comum) e membro destacado do DSA, declarava num dos discursos principais da convenção que “como Socialistas Democráticos, sabemos que tal como resistimos à direita e ao seu porta-voz e presidente [Donald Trump], também devemos resistir aos democratas neoliberais. Se a escolha é entre a barbárie ou socialismo, eu escolho a última”. 

A atitude de Ramirez-Rosa parece ter ganho a convenção, que entre extensas teses sobre a sua complicada relação com o Partido Democrático, declara que o “Partido Democrático tem sido historicamente o maior desafio contra movimentos progressistas”. 

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