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"É tempo de se começar a fazer cidade tendo as pessoas no centro da política de habitação"

Isabel Pires falou sobre a forma como os bairros históricos estão a ser esvaziados das suas gentes, em consequência da lei dos despejos de Assunção Cristas. “Não queremos uma cidade que torne os seus habitantes tão pequenos que os deixemos de ver!”, frisou.
Foto de Paulete Matos.

A deputada bloquista Isabel Pires lembrou a situação das 16 famílias do bairro da Mouraria que serão despejadas entre agosto e o final deste ano: “São mais de 40 pessoas que vivem na rua dos lagares, no coração deste bairro histórico de Lisboa, famoso pelo seu fados, marchas e pela sua vida, e tão apetecível para os milhões de turistas que por lá passam e deixam a sua marca”.

“Algumas destas pessoas vivem naquela rua há 50 anos. Outras, mais novas, nasceram, cresceram e lá constituíram família, e outras ainda foram lá recebidas depois de terem sido despejadas de outros locais no mesmo bairro. Agora, assistimos à destruição destes laços e destas vivências”, lamentou a deputada.

Salientando que “o turismo exerce uma pressão brutal nas zonas históricas de Lisboa”, Isabel Pires afirmou que “os turistas procuram o que é autêntico mas corremos o risco de num futuro próximo acabarem a visitar uma cidade fantasma, um cenário artificial onde apenas se vêm uns aos outros porque a vida do bairro já não mora lá”.

Conforme sinalizou a dirigente do Bloco, “na mesma rua de onde querem despejar estas pessoas, surgem prédios de luxo, hotéis e alojamento local”, sendo que “as filhas e os filhos do bairro são expulsos para outras zonas ou para fora da cidade porque os preços e as rendas não param de subir”.

“Enquanto isso”, sublinhou Isabel Pires, “os prédios da Santa Casa da Misericórdia continuam entaipados”.

A deputada alertou que “os bairros populares de onde nasceu Lisboa e que hoje lhe dão nome pelo mundo serão apenas uma memória no futuro”.

“O presente é um processo de descaracterização, não por causa da modernidade nem sequer por culpa dos turistas, mas porque estes bairros estão a ser esvaziados das suas gentes, das nossas gentes”, frisou, adiantando que “este retrato da Rua dos Lagares na Mouraria não é, infelizmente, caso único na cidade ou no país”.

“É preciso apontar responsáveis”, defendeu, sinalizando que “o retrato desta e de tantas ruas demonstra bem as consequências que ainda se fazem sentir da lei dos despejos de Assunção Cristas enquanto ministra do CDS-PP no anterior governo com o PSD”.

Lembrando que, “já em 2016, a Assembleia da República conseguiu travar parcialmente algumas das injustiças deste regime” e que, “com a alteração à lei decorrente do grupo de trabalho entre o Bloco de Esquerda e o governo sobre política de habitação, conseguimos proteger por mais 5 anos as pessoas acima dos 65 anos ou com deficiência”, Isabel Pires salientou que “isso não chega”.

“Falta percorrer um longo caminho no regime de arrendamento urbano, para garantir que não assistimos à destruição das relações sociais nem à expulsão das pessoas, apagando as memórias e os afetos com o lugar em que se nasceu e cresceu”, afirmou Isabel Pires, apontando a necessidade de garantir também o combate à especulação imobiliária e travar o brutal aumento das rendas e a venda generalizada de património para construção de hotéis.

Em causa está, consoante destacou a deputada, “um cocktail explosivo de desertificação dos centros das cidades, descaracterizando-os, esvaziando-os de quem cá mora e dá vida à cidade”.

“É a negação do direito constitucional à habitação”, avançou Isabel Pires, referindo que “uma cidade ou um país que responde aos seus cidadãos e cidadãs tem que saber encontrar um equilíbrio saudável entre uma das mais importantes atividades económicas do país, o turismo, e o direito à habitação”.

“É tempo de se começar a fazer cidade tendo as pessoas no centro da política de habitação”, pontuou, rematando que “não queremos uma cidade que torne os seus habitantes tão pequenos que os deixemos de ver!”.

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