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“Contribuintes não têm de pagar às empresas para aumentarem salário mínimo”

Em entrevista na RTP3, a coordenadora do Bloco opôs-se à redução da TSU para as empresas e destacou o combate à precariedade e a restruturação da dívida como as prioridades imediatas do país.
Ana Lourenço e Catarina Martins na RTP3.
Ana Lourenço e Catarina Martins na RTP3.

Catarina Martins foi entrevistada esta terça-feira na RTP3 pela jornalista Ana Lourenço, com os temas do acordo com o PS a ocuparem boa parte da entrevista.

Reagindo as negociações que decorrem em sede de concertação social e a oposição dos patrões ao aumento do salário mínimo nacional, Catarina Martins lembrou que “a concertação social nos últimos anos serviu para não haver acordo sobre o salário mínimo”. Quanto aos valores em cima da mesa, a coordenadora do Bloco defendeu a importância que teria um acordo “para uma subida mais expressiva do que o patamar mínimo que foi alcançado no acordo entre o Bloco e o PS”, uma vez que “se tivéssemos atualizado o salário mínimo ao nível da inflação desde que foi criado, seria bem maior do que é hoje”.

Por outro lado, Catarina Martins opõe-se à proposta de “oferecer aos patrões a baixa da Taxa Social Única em 1%. Os contribuintes não têm de pagar às empresas privadas para elas aumentarem o salário mínimo”, defendeu.

Quanto ao acordo político estabelecido entre o Bloco e o PS após as legislativas, Catarina reconheceu que as medidas nele inscritas “estão quase todas cumpridas” no que toca à iniciativa política ou legislativa, embora muitas não tenham ainda aplicação prática.

De entre as medidas do acordo que falta ainda concretizar, Catarina Martins destacou o descongelamento de carreiras e salários na Função Pública e a maior progressividade dos escalões do IRS. “Quando Vítor Gaspar diminuiu de 9 para 5 escalões, as pessoas que vivem do seu trabalho passaram a pagar por ano mais 2 mil milhões de euros em impostos”, uma situação que o governo se comprometeu a reverter.

“O acordo foi a convergência possível, necessária e urgrnte para afastar o governo da direita”, acrescentou, concluindo que não bastam as medidas para travar os cortes e o empobrecimento causado pelo anterior governo. “Temos de olhar para o futuro” e concretizar o que falta dando o exemplo do combate à precariedade.

“A precariedade é má quer no público quer no privado. Mas o Estado tem obrigação de dar o exemplo”

O combate à precariedade no Estado é uma questão prioritária para o Bloco de Esquerda, que diz ser “um problema” não estar ainda divulgado o relatório que o governo prometeu entregar até outubro com os números da precariedade nos serviços públicos, que servirá de base ao processo de integração destes trabalhadores.

No entanto, os dados disponíveis são suficientes para se saber que “há mais de cem mil pessoas nestas condições”, afirmou Catarina Martins, descrevendo os casos mais evidentes: “bolseiros que são investigadores e são tratados como estudantes, pessoas a trabalhar a falso recibo verde – como aqui na RTP –, pessoas subcontratadas por empresas de trabalho temporário a preencher funções permanentes, abuso dos contratos a prazo, ou os Contratos Emprego Inserção, que são uma das maiores formas de humilhação de desempregados, obrigados a trabalhar por 80 e poucos euros para o Estado". “A precariedade é má quer no público quer no privado. O Estado tem uma obrigação primeira, que é dar o exemplo”, concluiu Catarina.

"Prioridade é responder pelo salário e condições concretas da vida das pessoas, não por indicadores de uma pretensa competitividade"

A reversão das medidas impostas nos anos da troika na legislação laboral é outra das propostas do Bloco para o próximo período. “À medida que se precarizaram as relações laborais e se embarateceu a hora de trabalho, a nossa economia encolheu e o número de postos de trabalho também”, recordou Catarina Martins.

“Quando se reverteram algumas medidas – reposição de feriados, aumento do salário mínimo – dizia-se que seria terrível para a exportações e o emprego, mas não hove nenhum problema para a economia. Muito pelo contrário, o emprego até cresceu. Precisávamos que crescesse mais, mas cresceu”, prosseguiu a coordenadora bloquista, recusando as conclusões de estudos que elogiam as medidas da troika como sendo boas para a “competitividade”.

“Num país com salários e distribuição da riqueza tão desiguais como Portugal, a nossa prioridade política é responder pelo salário, que é a primeira forma de redistribuição de riqueza e de justiça num país, ou é responder por indicadores internacionais de uma pretensa competitividade que ninguém sabe o que significa na prática?”, questionou Catarina Martins, clarificando que “a nossa opção não é por indicadores abstratos, mas sim por indicadores concretos de como é que vive no país quem aqui trabalha”. E deu um exemplo: “Voltar a pagar as horas extraordinárias de uma forma digna é uma forma de repor salário e subir o emprego”.

Tratado Orçamental: “PS continua absolutamente colado ao PSD e ao CDS“

As maiores críticas da coordenadora do Bloco à política do governo do PS surgiram a propósito do problema da dívida pública e da necessidade de a restruturar. “Devemos perguntar-nos se o nosso país pode continuar à espera das eleições alemãs para pôr o problema em cima da mesa, como antes esperou que Renzi pusesse o problema em cima da mesa e Renzi foi embora sem o pôr…”, afirmou Catarina, acrescentando que não faz sentido “este discurso de que vamos esperar por um país qualquer fazer o trabalho que não há nenhum economista da direita à esquerda que não reconheça que é necessário, que é restruturar a dívida”.

“Neste momento o Estado só se endivida para pagar dívida, no ano que vem vamos ter o mesmo problema, é uma bola de neve”, sublinhou Catarina, concluindo que “os juros da dívida poem em causa a soberania do país e a sua capacidade de fazer escolhas e a única forma de controlar este problema é restruturar a dívida”.

“Quando andamos a discutir autênticas migalhas para responder à pobreza e depois gastamos só em juros da dívida mais de 8 mil milhões de euros por ano, sabemos que o problema da dívida não é um problema do futuro, é um problema de agora”, concluiu.

Lesados do BES: Lei continua a permitir à banca “brincar com a vida das pessoas”

Questionada sobre a solução anunciada para um acordo com os lesados do BES, Catarina Martins não se quis pronunciar sem serem conhecidos os detalhes deste acordo. Mas alertou que a lei que permitiu que as pessoas fossem enganadas ainda está em vigor, por terem sido chumbadas as propostas do Bloco para evitar novos lesados da banca.

“Ao mesmo tempo que pensamos numa solução para os lesados do BES estamos a dar um sinal à banca de que pode continuar a brincar com a vida das pessoas, a vender produtos de risco ao balcão e a enganar as pessoas, que depois no fim algum governo negociará uma solução”, acusou a coordenadora do Bloco, lamentando que as propostas do Bloco fossem chumbadas “e ninguém apresentou propostas diferentes que fizessem caminho”.

 

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