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Cedência de obras de arte ao Vila Galé é manifestamente ilegal

As deputadas Alexandra Vieira e Beatriz Gomes Dias lembram que pareceres técnicos e legais do próprio Ministério da Cultura invalidam a cedência de obras de arte da Coleção Rainer Daehnbardt ao Grupo Vila Galé e questionam o Governo sobre esta decisão.

A 28 de setembro de 2018, os então ministros da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural e da Economia anunciaram a concessão da Coudelaria de Alter ao Grupo Vila Galé Internacional, S.A., no âmbito do Programa Revive. A esta concessão juntou-se a cedência de obras de arte da Coleção Rainer Daehnbardt ao Grupo Vila Galé, confirmado por um despacho assinado a 14 de janeiro do corrente ano pela Secretária de Estado Adjunta e do Património Cultural, Ângela Ferreira.

Neste diploma, a Secretária de Estado justifica que “com a extinção da Fundação Alter Real, veio à posse do Estado a Coleção Rainer Daenhardt, em tempos exposta no antigo Museu da Coudelaria de Alter, mas que há muito que não está por qualquer via acessível ao público”. E que, “tratando-se de uma coleção que reclama ser usufruída pelo público e com ligação a Alter do Chão, a exposição de algumas obras de arte no empreendimento Revive constituiu entendimento, desde logo assumido pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas da Economia, da Agricultura e da Cultura do anterior Governo, como via a prosseguir”. Acrescenta ainda que “a lei estabelece que a cedência temporária de bens culturais móveis pode ser efetuada quando estejam garantidas as condições de segurança e de conservação”.

Conforme sublinham as deputadas bloquistas, as obras já estão acessíveis ao público no Museu Nacional dos Coches desde a sua entrega à Direção-Geral do Património Cultural em 2017. Acresce que, de acordo com um parecer da própria Direção-Geral do Património Cultura, de 8 de agosto de 2019, a cedência ao Grupo Vila Galé não tem caráter temporário e não estão devidamente acauteladas as condições de segurança e de conservação.

Na realidade, o Vila Galé “não tem nem prevê ter qualquer trabalho científico ou de promoção de conhecimento das obras”, pelo que “estamos perante uma violação elementar da Lei-quadro dos Museus Portugueses”, alertam Alexandra Vieira e Beatriz Gomes Dias.

Ignorando este parecer, o despacho de Secretária de Estado prevê, ainda assim que a cedência não pode prejudicar “o dever de serem asseguradas as condições de segurança e conservação consideradas adequadas, a determinar pela Direção-Geral do Património Cultural [DGPC]”.

O relatório da equipa da DGPC que se deslocou ao Hotel Vila Galé de Alter do Chão, datado de 12 de fevereiro de 2020, alerta para a total desadequação das instalações para receber as obras de arte em causa. Em causa estão os valores de humidade e intensidade luminosa, os suportes inadequados para as obras e a segurança do espaço, bem como a inexistência de uma equipa com habilitações museológicas para projetar o espaço para o gerir no futuro.

Tendo em consideração o Regime Jurídico de Autonomia dos Museus, Monumentos e Palácios, as deputadas do Bloco destacam que a Secretária de Estado “é juridicamente incompetente para tomar esta decisão”, sendo que “em nenhum momento é admitida a autoridade para que a Secretária de Estado possa decidir unilateralmente sobre o destino das coleções sob gestão das unidades orgânicas da DGPC”.

“A atuação da Secretária de Estado Adjunta e do Património Cultural em todo este processo apresenta uma notável falta de preocupação pelo património público, e uma submissão total das políticas para o património – inclusivamente das exigências legais a que o Estado está obrigado – às vontades do Ministério da Economia e do Turismo em particular”, escrevem Alexandra Vieira e Beatriz Gomes Dias.

Destacando que a cedência das obras da Coleção Rainer Daehnhardt ao Grupo Vila Galé “é manifestamente ilegal”, as deputadas questionam o Governo sobre quando vai proceder à sua revogação e se vai abrir um inquérito para averiguar os responsáveis pela celebração do mesmo.

Questionado pelo semanário Expresso, o Ministério da Cultura garante que não houve uma cedência ao grupo hoteleiro: “Não foi, até à data, assinado qualquer protocolo de cedência. A assinatura deste protocolo de cedência só se fará, como assumido desde o início deste processo, após a aceitação, cumprimento e verificação da existência das condições museológicas, técnicas e de segurança”. O Ministério assegura também que as obras só serão expostas “num núcleo museológico dotado de todas as condições técnicas e de segurança adequadas, tal como determinado claramente pelo despacho”.

Para o efeito, é preciso que a Direção-Geral do Património Cultural dê parecer positivo às condições “técnicas, como a humidade e a temperatura, bem como condições de segurança”. O Governo enfatiza, contudo, que o Hotel Vila Galé se “comprometeu” a “assegurar as condições referidas”.

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