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Brasil: 50 anos do Ato Institucional número 5

Em 1968, militares aprofundaram a ditadura e terrorismo de Estado. Data é de triste memória, mas precisa ser lembrada para que factos como estes nunca mais se repitam. Por Tião Torres, de Guaxupé (MG)
Governo militar brasileiro do General Costa e Silva editou o AI-5 no dia 13 de dezembro de 1968
Governo militar brasileiro do General Costa e Silva editou o AI-5 no dia 13 de dezembro de 1968

No dia 13 de dezembro de 1968, há exatos 50 anos, o governo militar do General Costa e Silva editou o Ato Institucional número 5 (AI-5), fechando o Congresso Nacional, acabando com o direito de concessão de Habeas Corpus, fortalecendo a intervenção nos sindicatos, ampliando os poderes dos órgãos de repressão, ampliando ainda mais a censura contra imprensa, artistas e intelectuais, entre outros medidas profundamente autoritárias.

O golpe foi dado em 1964. Portanto, a ditadura começa no ato da derrubada do governo civil e democraticamente eleito de João Goulart. Começam também nessa data as perseguições e torturas. Entretanto, é inegável que a publicação do AI-5 e a implementação de suas medidas marcam um recrudescimento da ditadura e do terrorismo de Estado. É um marco, para o completo fechamento do regime político.

Nos primeiros anos de ditadura, parcelas significativas da população, sobretudo das classes médias, apoiaram e respaldaram a presença dos militares no poder. Foi possível, portanto, a cúpula das forças armadas governar sem modificar aspetos do antigo regime – como o funcionamento do Congresso Nacional – embora já de forma profundamente autoritária e criminosa.

O ano de 1968 vem mudar significativamente este cenário, marcando a ampliação do sentimento de oposição a ditadura e o crescimento das ações de uma resistência democrática, que ganhou “corações e mentes”, especialmente da juventude.

O ano conhecido pelas grandes mobilizações de contestação a ordem e por liberdades em várias partes do mundo. No Brasil, pode-se admitir que o estopim do movimento de 68 foi o assassinato pelas forças de repressão do estudante Edson Luis, no restaurante Calabouço, no Rio de Janeiro, em pleno reduto dos estudantes e do movimento estudantil à época.

A morte gerou uma grande manifestação popular de repúdio, de dezenas de milhares, em plena Cinelândia, centro do Rio, para acompanhar o velório do corpo de Edson Luis, que acontecia na antiga sede da Assembleia Legislativa, atual Câmara Municipal do Rio de Janeiro.

As manifestações em protesto ao assassinato de Edson Luis destravaram um amplo movimento democrático, que teve como seu principal palco a cidade do Rio de Janeiro, mas se espalhou por várias capitais brasileiras.

Houve também greves operárias importantes, como a dos Metalúrgicos de Osasco (SP), que protestavam por melhorias salariais, mas também contra a intervenção e a tutela dos sindicatos pelos órgãos de repressão. Naquele ano, por exemplo, foi instituído pela ditadura a necessidade de atestado ideológico para dirigentes sindicais.

O ponto alto deste movimento foi, sem dúvida nenhuma, a realização da “Passeata dos cem mil”, um grande protesto, realizado no Centro do Rio de Janeiro, com grande participação da juventude, artistas e intelectuais, contando com amplo apoio popular.

A desculpa do governo Costa e Silva para o AI-5 foi o discurso contra a ditadura do deputado federal do MDB Márcio Moreira Alves e os artigos de outro parlamentar do MDB, Hermano Alves, no jornal Correio da Manhã.

Mas, evidentemente, a razão de fundo para o AI-5 foi responder ao crescente movimento de resistência. Diante do fortalecimento do movimento democrático em oposição à ditadura, os militares optaram por aprofundar o fechamento do regime, apostando numa ampliação qualitativa da repressão, da violência, das perseguições, assassinatos, torturas, com o objetivo de frear esse movimento legítimo da população brasileira.

A aplicação, em larga escala, de um terrível terrorismo de Estado, conseguiu abafar aquele movimento. Nos anos que se seguiram, a resistência à ditadura foi marcada principalmente pelas organizações políticas que aderiram a tática da guerrilha, sem maior penetração na população em geral e sem a realização de grandes protestos populares.

O movimento democrático pelo fim da ditadura veio ressurgir com mais força cerca de dez anos depois, no final da década de 1970, principalmente com as greves operárias do ABC Paulista. As greves no ABC marcam o início e o fortalecimento de um movimento democrático que não mais se cessaria até o fim da ditadura militar, formalmente em 1985, mais de duas décadas depois do golpe militar de 1964.

A importância da memória: ditadura nunca mais

Lembrar os 50 anos da publicação criminosa do AI-5 tem grande relevância para o momento em que passamos atualmente em nosso país. A cúpula das forças armadas volta ao centro do poder nacional. Um processo que já começou no governo Temer e, agora, vai se aprofundar de forma qualitativa no governo Bolsonaro.

Não pode existir dúvidas entre nós de que estarão no poder, a partir de janeiro de 2019, expoentes da defesa da ditadura militar, como o próprio Bolsonaro e seu vice, General Mourão. Em várias oportunidades, tanto Bolsonaro como Mourão, entre outros futuros ministros militares, fizeram questão de defender uma pseudo legitimidade do golpe de 1964, além de prestar homenagens a Carlos Alberto Ustra, um dos maiores criminosos e assassinos da ditadura militar brasileira, que chefiou o Doi-Codi, em SP.

Tentam passar a falsa ideia de que o golpe militar poderia ter sido um movimento legítimo contra um tal “perigo comunista”, uma ameaça à “segurança nacional” ou necessário para combater um “inimigo interno”, ou tantas outras ideologias reacionárias criadas para justificar seu projeto autoritário, que foram difundidas pela elite das forças armadas brasileiras, principalmente a partir da década de 1950, com amplo apoio e assessoramento de sucessivos governos dos EUA.

O momento exige a construção e fortalecimento de um amplo movimento de unidade de ação democrática. Que deve começar com uma frente única de todas as organizações, partidos e movimentos da classe trabalhadora, da juventude e do conjunto dos explorados e oprimidos.

Apenas um amplo e unitário movimento de resistência contra os ataques do novo governo, seja aos direitos sociais seja às liberdades democráticas, poderá impedir uma nova opção autoritária de fechamento do regime político.

Não devemos ter nenhuma confiança nos compromissos democráticos feitos por Bolsonaro, em entrevistas na grande imprensa. A única forma de impedir uma nova escalada autoritária será ampliar a força e a organização de nossas lutas.

Lembrar e protestar contra o AI-5 é parte importante deste novo movimento em defesa das liberdades democráticas. Ditadura nunca mais!

Artigo publicado em Esquerda Online a 12 de dezembro de 2018

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