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Bloco não quer Bolsonaro de visita a Portugal

Jair Bolsonaro fez declarações trocistas sobre um desaparecido na ditadura militar brasileira nos anos 70. Caso revela de novo o desrespeito do presidente brasileiro pelos Direitos Humanos e devia impor o cancelamento de visita a Portugal em preparação, considerou Joana Mortágua.
Jair Bolsonaro. Foto de Marcelo Camargo/Agência Brasil.
Jair Bolsonaro. Foto de Marcelo Camargo/Agência Brasil.

As declarações recentes de Jair Bolsonaro sobre o desaparecimento de um ativista estudantil durante a ditadura militar brasileira demonstram de novo uma "perversidade enorme" por parte do presidente brasileiro e exigem que o Estado português suspenda os preparativos de visita do presidente brasileiro a Portugal, afirmou Joana Mortágua.

Em declarações esta manhã, a deputada bloquista considerou que os comentários desdenhosos de Bolsonaro sobre o desaparecimento nos anos 70 às mãos da ditadura de Fernando Santa Cruz, pai do atual presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz, revela novamente um "desrespeito pelo trauma coletivo sobre os desaparecidos e torturados da ditadura militar brasileira" que chocha com "os princípios mais básicos dos direitos humanos, da liberdade e da democracia".

"Independentemente de divergências políticas com o presidente", afirmou Joana Mortágua, este episódio impõe um "dever de solidariedade com as vítimas da ditadura brasileira". Na sua opinião, seria estranho que Portugal recebesse oficialmente um presidente que demonstra abertamente um tal desprezo por princípios democráticos básicos, e apelou a que o governo cancele os preparativos em curso para uma visita de Bolsonaro ao país.

Leia em baixo na íntegra o comunicado do Bloco sobre o caso.


Bolsonaro não é bem-vindo em Portugal

O Bloco de Esquerda tomou conhecimento das afirmações do presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, a propósito da morte do ativista estudantil e militante político Fernando Santa Cruz, dado como desaparecido em 1974, em plena ditadura militar naquele país.

Interpelando diretamente o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, filho de Fernando Santa Cruz, Bolsonaro usou de ironia para dizer que “um dia” contará ao presidente da OAB como o pai desapareceu “no período militar”, adiantando que Felipe Santa Cruz “não vai querer saber a verdade”. Mais tarde, o presidente voltou ao tema numa rede social, afirmando que Fernando Santa Cruz não foi morto pelos militares, mas, sim, pela sua própria organização, a Ação Popular. “Eles resolveram sumir com o pai do Santa Cruz”, disse.

As afirmações de Jair Bolsonaro causaram uma onda de indignação generalizada, até partilhada por muitos que o têm defendido e apoiado em outras ocasiões. O governador de São Paulo, João Doria, foi um dos que criticaram: “É inaceitável que um presidente da República se manifeste da forma com que se manifestou. Foi uma declaração infeliz”, acrescentando: “Não posso silenciar diante desse facto. Eu sou filho de um deputado federal cassado pelo golpe de 1964”. O prefeito de São Paulo, Bruno Covas, também considerou o discurso de Bolsonaro “absurdo, inaceitável, incompatível com a República democrática”. A jornalista Miriam Leitão, que também já foi alvo de ataques soezes de Bolsonaro, foi taxativa: “O que o presidente fez é repulsivo”, escreveu. “O presidente brinca com o sentimento de um filho que nunca conviveu com o pai porque ele foi morto aos 26 anos”. E concluiu: “Ontem foi o dia de sentir nojo”.

O mais absurdo é que, há apenas uma semana, a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, vinculada ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos do governo Bolsonaro, emitiu o atestado de óbito de Fernando Santa Cruz onde consta que ele “faleceu provavelmente no dia 23 de fevereiro de 1974, no Rio de Janeiro/RJ, em razão de morte não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro, no contexto da perseguição sistemática e generalizada à população identificada como opositora política ao regime ditatorial de 1964 a 1985”.

O presidente da OAB reagiu numa nota em que afirma: “Lamentavelmente, temos um presidente que trata a perda de um pai como se fosse assunto corriqueiro — e debocha do assassinato de um jovem aos 26 anos.” E acrescenta: “Não há qualquer dúvida. Meu pai era estudante de direito e morreu lutando pela democracia. O presidente mostra uma faceta muito preocupante do governante, que é a crueldade e a falta de empatia com o ser humano.”

Diante destes factos, parece ao Bloco de Esquerda que os portugueses e o governo não podem ficar indiferentes face a um presidente que, como diz nota da OAB, parece ignorar os fundamentos do Estado Democrático de Direito, entre eles “a dignidade da pessoa humana, na qual se inclui o direito ao respeito da memória dos mortos”. O Bloco de Esquerda recorda ainda que este é apenas o episódio mais recente envolvendo um governo que tem sido marcado pelo desrespeito às comunidades indígenas, pelo aumento descomunal do desmatamento da Amazónia, pelos ataques à Educação e aos direitos dos trabalhadores.

Sabendo-se que está em preparação uma visita oficial do presidente da República do Brasil a Portugal, prevista para o início de 2020, o Bloco de Esquerda considera que esta, a concretizar-se, sinalizaria ao povo irmão do Brasil que o governo português é conivente com o constante desrespeito à democracia demonstrado pelo atual governo.

O Bloco de Esquerda considera por isso inaceitável a realização desta visita. Jair Bolsonaro não é bem-vindo a Portugal e o Ministério dos Negócios Estrangeiros deve cancelar a visita o quanto antes.

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