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Afinal foram convidadas
As Guerrilla Girls são um coletivo artístico feminista nascido em 1985, em Nova Iorque, em reação a uma exposição do ano anterior, “An International Survey of Recent Painting and Sculpture”, no MoMA. Embora o título da exposição sugerisse que nela estariam representados os melhores artistas do mundo, só 8% eram mulheres e, segundo o seu curador, Kynaston McShine, “qualquer artista que não estivesse representado deveria repensar a sua carreira”. As Guerrilla Girls, uns anos depois, faziam as contas de um museu: nestas salas, 3% dos artistas e 83% dos nus são mulheres.
Provavelmente, não foi essa crítica que esteve na origem da recentemente inaugurada exposição no Museu do Prado, em Madrid, “Convidadas — Fragmentos Sobre Mulheres, Ideologia e Artes Plásticas em Espanha (1833-1931)”, mas há hoje uma discussão sobre esse olhar que vê e ignora. A exposição é, segundo o seu curador, Carlos Navarro, “um pedido de desculpas às mulheres artistas por terem sido segregadas durante anos da ribalta e dos museus”, e procura mostrar a presença das mulheres naquela que é considerada a época dourada da arte espanhola, estando também incluídas diversas pinturas de homens artistas que retratam a obediência que então se esperava das mulheres. O espólio do museu, de onde saíram os 133 quadros, é disso o retrato: está cheio de obras que representam mulheres como figuras secundárias e de nus femininos que retratam humilhação.
O título da exposição sintetiza uma crítica à História da Arte que menoriza as artistas, oferecendo uma nova perspetiva. “Uma convidada não decide onde se senta, o seu papel tem uma codificação. É atribuído por outra pessoa. O mesmo acontece às mulheres espanholas do século XIX que ingressaram no sistema artístico: muitas delas nem sequer tiveram acesso a formação, e quando o tiveram nem sequer puderam escolher as mesmas disciplinas que os homens. Houve uma subcategorização das mulheres nas artes plásticas e no papel do Estado como colecionador com pressupostos ideológicos”, afirmou o curador da exposição. Por isso, o museu pede desculpa e convida-nos para vermos a arte que estava ocultada.
Artigo de Francisco Louçã, publicado no jornal “Expresso” a 24 de outubro de 2020
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