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3 anos dos Panama Papers: evasão fiscal ainda no coração do sistema europeu

Esta quarta-feira, celebram-se 3 anos desde a publicação dos Panamá Papers, um dos maiores escândalos político-financeiros das últimas décadas. Publicamos a propósito um artigo assinado por Marisa Matias e outros cinco eurodeputados de partidos da Plataforma “Agora, o Povo”.
Marisa Matias e outros cinco eurodeputados escrevem a propósito dos 3 anos dos Panama Papers
Marisa Matias e outros cinco eurodeputados escrevem a propósito dos 3 anos dos Panama Papers

Todos os anos, a evasão e fraude fiscais custam aos Estados membros da UE um bilião de euros em receitas perdidas. Em média, o equivalente a 10% do PIB dos países ricos acabaria em contas em paraísos fiscais.

O que é que a União Europeia está a fazer?

Na sequência dos casos LuxLeaks, Panama e Paradise Papers, todos concordaram que era imprescindível lutar contra os paraísos fiscais. Agora é o tempo de agir – de uma vez por todas! Porque as promessas firmes para acabar com os paraísos fiscais converteram-se em palavras vazias.

A lista negra de paraísos fiscais da UE é um claro exemplo disso mesmo. É uma farsa criar uma lista negra e deixar de fora paraísos fiscais óbvios como a Irlanda, Luxemburgo, Holanda, Malta, Chipre, Monaco, Liechtenstein ou Andorra. Um acordo de associação está mesmo a ser negociado entre a UE estes três últimos paraísos fiscais.

A começar pela definição de paraísos fiscais, a lista negra da UE eliminou o seu próprio objectivo antes mesmo de começar, ao indicar claramente que uma taxa de imposto de 0% sobre as sociedades não constitui em si mesmo uma violação do critério de tributação justa. Ora, se uma taxa de imposto de 0% sobre as sociedades não é injusta, então o que é?

Para piorar as coisas, as promissoras reformas dos paraísos fiscais foram removidas da lista negra e transferidas para a chamada lista cinza, evitando assim quaisquer sanções. A lista já incompleta está agora reduzida a dez paraísos fiscais.

Como já é hábito na UE, as negociações das listas negras dos paraísos fiscais foram feitas à porta fechada, longe da opinião pública. Várias fugas de documentos mostraram, no entanto, que alguns Estados Membros bloquearam activamente a criação de uma lista negra abrangente, e que os incluía. Estes Estados Membros, classificados como paraísos fiscais cinza, aprovaram, deliberadamente, legislação que permite que as multinacionais, os chefes de estado corruptos e os super-ricos escondam a sua riqueza. Uma verdadeira dádiva, graças a esses truques, a lista negra está agora reduzida a apenas quinze paraísos fiscais. Obviamente, muitos dos paraísos fiscais estão na lista cinza. Ao contrário de todas as evidências, a UE optou por confiar nestes paraísos fiscais que simultaneamente afirmam estar a fazer tudo o que está ao seu alcance para criar uma política mais justa.

Estamos muito preocupados. E o facto de a pessoa responsável pela luta contra os paraísos fiscais e evasão fiscal ser, nada mais nada menos, que o Presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, ex-Primeiro-Ministro do Luxemburgo, em nada diminuí a nossa preocupação. Juncker não foi apenas chefe de Estado de um paraíso fiscal da UE, como usou a sua posição para negociar pessoalmente acordos fiscais ilegais com multinacionais.

A construção da União Europeia favoreceu a livre circulação de capitais, permitindo ao mesmo tempo políticas de dumping social, através das quais os Estados membros reduzem impostos para atrair capital. Além disso, permite-se ainda a existência de paraísos fiscais, como o Luxemburgo, dentro do espaço europeu. Este não é apenas um problema de tributação de impostos na Europa, mas em todo o mundo, uma vez que o Luxemburgo funciona como um centro para fluxos opacos de capitais globais.

A evasão fiscal é uma questão crescente em todo o mundo. Esta é uma enorme ameaça ao Estado Social na Europa e deixa milhões de pessoas na pobreza nos países em desenvolvimento.

Queremos fortalecer os critérios de tributação justa para que países com impostos muito baixos para as multinacionais não escapem da lista negra.

Queremos remover a lista cinza, como forma de criar pressão sobre os paraísos fiscais europeus, mesmo que estes nos continuem a prometer a lua. Queremos uma lista negra que inclua todos os países e jurisdições que não cumpram os critérios – incluindo Estados membros da UE.

Finalmente, queremos aumentar a pressão sobre os paraísos fiscais que fazem parte da lista negra. Queremos proteger os lançadores de alerta e punir os bancos e conselheiros fiscais ligados a paraísos fiscais. Exigimos a possibilidade de proibir a celebração de qualquer contrato entre o Estado e empresas envolvidas em evasão fiscal ou planeamento tributário agressivo. É absurdo que a tomada de decisão no sector público não possa recusar contratos com empresas que activamente enfraquecem as contas públicas.

Actualmente proibir essas empresas de celebrar contratos públicos é contrário à legislação europeia. Deste modo, a UE está a impedir os Estados e os municípios de protegerem os sistemas de bem-estar social contra empresas que fogem aos impostos. É, pois, fundamental que se altere esta legislação. Por isso não deixaremos de desafiar a legislação europeia existente, de desobedecer e de tentar encontrar formas para impedir essas empresas de lesar os interesses dos cidadãos.

Assinam:

  • Marisa Matias, Eurodeputada, Bloco de Esquerda, Portugal
  • Miguel Urbán, Eurodeputado e Secretário Europeu do PODEMOS, Espanha
  • Malin Björk, Eurodeputada, Partido de Esquerda da Suécia
  • Nikolaj Villumsen, Deputado e Vice-Presidente do grupo parlamentar da Aliança Vermelha-Verde, Dinamarca
  • Manon Aubry, ex porta-voz da Oxfam sobre evasão fiscal, La France Insoumise, França
  • Younous Omarjee, Eurodeputado, La France Insoumise, França

Este artigo é uma atualização do texto ”Tempo de agir nos paraísos fiscais”, publicado em 3 de maio de 2018

Termos relacionados Europeias 2019, Política
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