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11,2% dos trabalhadores são pobres, a percentagem mais alta desde 2007

Taxa de risco de pobreza registou o maior aumento num ano, atingindo os 18,4% em 2020, face aos 16,2% de 2019. Transferências sociais diminuíram esta taxa em 25,1 pontos percentuais, mas esta redução é a mais baixa desde 2016. Economista Carlos Farinha Rodrigues alerta que “crise é profundamente desigual”.
Foto de Paulete Matos.

Segundo os últimos dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), 18,4% das pessoas estavam em risco de pobreza em 2020, mais 2,2 pontos percentuais do que em 2019. A taxa de risco de pobreza correspondia, no ano passado, à proporção de habitantes com rendimentos monetários líquidos inferiores a 554 euros por mês. As mulheres foram as mais afetadas pelo aumento do risco de pobreza: mais 2,5 p.p., de 16,7% em 2019 para 19,2% em 2020, sobretudo entre as mulheres idosas, com um acréscimo de 3,0 p.p., de 19,5% para 22,5%.

“É muito sério ter-se registado num ano o maior aumento da taxa de pobreza desde que existe esta série do INE. Para se ter noção, entrou em situação de pobreza quase o equivalente à população do concelho do Porto, o quarto mais populoso do país”, explicou Fernando Diogo, professor da Universidade dos Açores, citado pelo Expresso.

Todos os indicadores que medem a desigualdade apontam para um maior fosso entre a população com maiores recursos e os mais desfavorecidos. Os dados do INE refletem ainda o agravamento da percentagem de trabalhadores pobres: 11,2% das pessoas empregadas são pobres, a percentagem mais alta dos últimos 13 anos, desde 2007 (11,8%).

“Esse aumento mostra o grande efeito da pandemia na diminuição dos rendimentos de trabalho de uma parte da população, sobretudo nos grupos com rendimentos mais baixos. As pessoas que já ganhavam menos têm menos rendimentos do que tinham antes”, referiu, por sua vez, Carlos Farinha Rodrigues, especialista em desigualdades e um dos membros da comissão responsável pela proposta de Estratégia Nacional de Combate à Pobreza.

Os trabalhadores de setores como o turismo, a restauração ou a hotelaria, que contam com salários mais baixos, foram os mais afetados, tendo o Algarve sido a região que registou maior aumento da taxa de pobreza.

Farinha Rodrigues enfatizou ainda que “a crise atingiu fortemente setores da população que tinham ligações ténues aos mecanismos tradicionais de proteção social, como o subsídio de desemprego”. Tal implica que quem não tem vínculo laboral fica numa posição especialmente vulnerável.

Praticamente um em cada dois desempregados encontra-se em risco de pobreza (46,5%).

“Crise é profundamente desigual”

Em declarações ao Jornal de Negócios, Farinha Rodrigues enfatizou que os apoios sociais foram menos eficazes a travar pobreza da covid em 2020.

Tendo apenas em conta os rendimentos privados, a taxa de pobreza ascenderia a 43,5%. Somando a esses rendimentos as pensões de velhice e de sobrevivência, a taxa diminui para 23%. Já considerando todas as transferências sociais, a taxa de pobreza fixa-se em 18,4%.

“Este é um indicador da eficácia das transferências sociais, ou seja, até que ponto é que elas conseguem reduzir a pobreza. Mas o que constatamos é que esse efeito reduziu-se em 2020, apesar de todo o esforço que foi feito”, frisou o economista.

“Isto resulta de esta crise ter uma característica muito particular, de algo que nunca tinha acontecido: com a paralisação global da atividade económica, uma parte significativa do setor informal parou. O setor informal é uma espécie de almofada financeira e, [com a covid-19], essa fonte de rendimento parou”, esclareceu Farinha Rodrigues.

E é exatamente por isso que o especialista em desigualdades defendeu que “temos de ser capazes de combater estas formas de precariedade e exclusão”. Se há alguma coisa que a crise nos trouxe foi a demonstração de que precisamos de um Estado Social forte”, vincou.

Ao contrário do que aconteceu em Portugal Continente, nas regiões autónomas registou-se uma diminuição do risco de pobreza em 2020. A queda foi mais expressiva nos Açores, de 28,5% para 21,9%). Já a Madeira contou com uma taxa de risco de pobreza de 24,3%, face aos 26,3% de 2019. No entanto, esta região autónoma passou a ser a região do país com a taxa de pobreza mais alta.

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