O projeto apresenta dois aspetos valiosos: i) as propostas são sustentadas em investigações e conclusões científicas e ii) diminui as consequências penosas desses regimes de trabalho no corpo humano e na vivência das pessoas e “dá-lhes” justos direitos compensatórios dessa penosidade.
A união do conhecimento científico com o empírico e com as justas aspirações das pessoas, que assim são obrigadas a laborar, torna-o indeclinável pelo PS. Se o governo não apoiar este projeto escolherá o lado do retrocesso dos direitos humanos e recusará a modernidade. Se o PS não votar a favor dará uma forte pancada na “geringonça”.
O estudo cientifico, filosófico e económico sobre o trabalho noturno e por turnos vem de longe.
“O impulso imanente da produção capitalista” foi como Marx chamou à vontade da burguesia de se “apropriar do trabalho durante todas as 24 horas do dia”. É que se para um trabalhador “é fisicamente impossível — as mesmas forças de trabalho serem sugadas continuamente dia e noite — então é preciso, para vencer o impedimento físico, a alternância entre as forças de trabalho consumidas de dia e de noite” (…) o “sistema de turnos, esta economia de alternância”… i
Acumulação de capital
“Marx sensibilizou-se muito pela brutal exploração que os trabalhadores britânicos sofreram, em particular pelo sofrimento imposto às crianças e jovens trabalhando em turnos. Ele trouxe-nos a compreensão desta razão económica: a necessidade de rentabilizar o capital constante, a de multiplicar o tempo e a quantidade de produção de mais-valia diminuindo assim o custo desse capital constante, em razão inversa, pelas mercadorias produzidas. O que menos contava era a força de trabalho, na verdade quase escravizada.
No capitalismo moderno esse impulso imanente mantém-se, não só porque a competição inter capitalista necessita da inovação tecnológica permanente, muitas vezes conseguida a custos económicos elevados cuja rentabilidade é sustentada pela progressão “pró-geométrica” da produção e por custos de trabalho mais reduzidos aumentando a acumulação e concentração de capital enquanto se espalha desemprego e pobreza e ciclicamente crises de sobre produção”. ii
O Bloco de Esquerda cumpre, assim, e bem, um dever social indelével.
Por sua vez, o conservadorismo sindical, fechando-se na “acção rotineira”, subestimou estes aspetos da exploração da pessoa pela pessoa. Essa subestimação diminuiu a resistência à retirada de direitos e não facilitou a conquista de justas recompensas à penosidade do trabalho noturno e por turnos.
Uma perspetiva positiva e aberta melhoraria a sindicalização, reforçaria o poder reivindicativo e poderia construir uma consistente aliança social entre Sindicatos, Comissões de Trabalhadores e Centros de Investigação e Conhecimento.
Cada vez mais pessoas laboram em regime noturno, por turnos ou até em folgas rotativas desempenhando funções vitais à produção e ou ao funcionamento da sociedade. Esse facto só releva a importância dessa aliança social.
Juntar forças continua a ser preciso.
(1)- de discussão obrigatória naquela dia
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iKarl Marx – O Capital. Crítica da Economia Política. Livro I. Tomo I. Lisboa: edições Avante, 1990.
iiExtrato de um meu artigo anterior aqui: https://acontradicao.wordpress.com/2016/02/26/turnos-o-impulso-imanente-da-producao/
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Vítor Franco é membro da Comissão de Trabalhadores da EDP Distribuição e da Direção do Sindicato da Indústria, Energia e Águas de Portugal