Gracias Violeta Parra que nos has dado tanto!

Violeta Parra artista universal também foi uma poderosa inspiradora das pessoas feministas. Artigo de Manuela Góis

07 de outubro 2017 - 20:48
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Violeta Parra em ato político da revista El Siglo, 1948 – Foto de fundacionvioletaparra.org
Violeta Parra em ato político da revista El Siglo, 1948 – Foto de fundacionvioletaparra.org

Foi pela poderosa voz da argentina Mercedes Sosa que escutei emocionada “Gracias a la vida” de Violeta Parra. Estávamos no Portugal fascista e colonialista em que a censura não permitia o dissenso. Mas os livros proibidos e as edições de discos da Chant du Monde, entre outras edições, entravam no país e alimentavam de poesia e rebeldia inúmeras pessoas, entre as quais os grupos de estudantes contestatários ao regime, dos quais eu fazia parte.

Quis saber quem era Violeta Parra, a poeta que nos cantava o amor, o desamor, as injustiças sociais, a insubmissão e nos dava a conhecer o seu Chile tão diverso, tão musical e sofrido por matanças do seu povo trabalhador ao longo do século XX. O golpe militar do dia 11 de Setembro de 1973, que derrubou o governo da Unidade Popular de Salvador Allende, trouxe o Chile para os nossos corações, criando ondas de solidariedade e de raiva. Violeta já não se encontrava lá, nas ruas de Santiago, pois suicidara-se em 1967 com quase 50 anos, mas a sua voz e compromisso com o povo e os ideias de esquerda perduravam nas chilenas e chilenos assassinadas/os e resistentes à terrífica ditadura. Entre os seus amigos, o compositor, cantor e director de teatro Victor Jara foi assassinado e o poeta Pablo Neruda era enterrado em Santiago uma semana depois do miserável golpe militar. O funeral do Prémio Nobel da Literatura constituiu uma das primeiras grandes manifestações contra a ditadura militar do general Pinochet.

Estava eu ainda longe de saber que iria aprofundar os laços com o Chile de Violeta Parra através do meu companheiro chileno, de há mais de 35 anos. Quis conhecer os percursos desta artista multidisciplinar – poeta, compositora, cantora, ceramista, bordadeira, tecelã, pintora – além de pobre, inconformista, e mãe de quatro crianças: Ángel Parra, que faleceu em março deste ano, e de Isabel, Carmen Luísa e Rosita Clara (que morreu muito criança). Isabel Parra e Ángel Parra, importantes músicos, usaram sempre o apelido da sua mãe.

Como investigadora da música popular chilena, percorreu o seu país e fez um trabalho notável de pesquisa junto dos mineiros, pescadores campesinato e operariado

Como investigadora da música popular chilena e estimulada pelo irmão mais velho Nicanor Parra, actualmente com 103 anos (poeta e matemático), percorreu o seu país e fez um trabalho notável de pesquisa junto dos mineiros, pescadores campesinato e operariado. Visitou também vários países entre os quais a Polónia, a então União Soviética, e viveu em Paris. Foi uma mulher autónoma, independente e inconformista que transbordou os limites reservados às mulheres nas sociedades patriarcais.

Na inauguração do Museu Violeta Parra em Santiago do Chile, em 2015, Ángel Parra denunciou as desigualdades de género no seu discurso perante a Presidente da República Michele Bachelet: “En una sociedad machista como la nuestra, de derecha y de izquierda, mujeres como Gabriela Mistral, Violeta Parra, Gladys Marín y usted han tenido que batallar duro para sacarse de encima las telarañas ancestrales que intentan asfixiarlas”. [“Numa sociedade machista como a nossa, de direita e de esquerda, mulheres como Gabriela Mistral, Violeta Parra, Gladys Marín e a senhora tiveram que batalhar duramente para retirar as teias de aranha ancestrais que as tentam asfixiar”.]

Violeta Parra artista universal também foi uma poderosa inspiradora das pessoas feministas através da sua obra, valores que partilhou, generosidade, comportamentos autónomos e livres, e denúncia das opressões.

Gracias Violeta Parra que nos has dado tanto!

4 de Outubro de 2017

Artigo de Manuela Góis para o esquerda.net

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