Nos dias que correm, encontramos cada vez mais discurso produzido à volta da tecnologia e, particularmente, dos "dados". Palavras do momento como "big data", "tecnologia cidadã", "análise de dados", "democracia 2.0" e "apps sociais" povoam com cada vez mais frequência o discurso atual. Os dados, enquanto registos, existem desde há muito; mas só neste momento ganhámos os meios tecnológicos para os recolher, processar, analisar e agregar de uma forma global e sistemática com recurso a sofisticados sistemas digitais.
É possível identificarmos uma matriz de esquerda para os movimentos "open data"? Que limites podemos delinear para os novos potenciais da tecnologia?
Esta nova realidade fornece-nos um grande potencial de empoderamento cidadão. Os movimentos "open data" são um desenvolvimento recente e localizado de luta pelo acesso à informação pública, e têm vindo a obter frutos em vários países, incluindo a UE, incentivando os governos e agentes políticos a publicar livremente a informação pública. Esses dados – censos, orçamentos, atas, registos prediais, contratos públicos, legislação –, uma vez libertados, são a matéria prima de um grande conjunto de iniciativas cidadãs de produção de aplicações e ferramentas que, de uma forma ou de outra, possam incentivar mudanças sociais reais. Vale a pena tentarmos determinar se a tendência da "transparência" poderá ajudar à agenda do socialismo ou, por outro lado, se será menos libertadora do que se tem vindo a prometer.
Temos vindo a encontrar entidades e movimentos que apregoam a transparência como bandeira contra a corrupção. Tais manifestações são dignas de análise, uma vez que facilmente a transparência serve para sustentar posturas populistas que acabam por destruir o objetivo de esclarecimento cidadão. Tal acontece na medida que propõem uma visão primária do processo democrático e das suas instituições – exacerbando perigosamente o estereótipo dos "políticos" e requentando slogans pomposos de revoluções populares e juízos finais dos "maus" que serão possíveis com uma "sociedade transparente". Se tal discurso está longe
de ser novo, a apropriação da agenda da transparência é um desenvolvimento que deve ser discutido no âmbito da definição de uma política socialista.
Ficamos então com algumas perguntas, a que faz sentido procurarmos resposta: como podemos avançar com uma agenda de uma cidadania melhorada pela tecnologia? É possível identificarmos uma matriz de esquerda para os movimentos "open data"? Que limites podemos delinear para os novos potenciais da tecnologia? E que riscos podemos encontrar no contacto com outros agentes políticos e sociais que empunham bandeiras semelhantes com propósitos distintos?