Bielorrússia: os protestos que abalam o regime

A paciência dos bielorrussos parece ter-se esgotado após a resposta irresponsável de Lukashenko à pandemia da covid-19 e à crise do modelo económico sustentado por Moscovo. A gota de água foram as eleições presidenciais viciadas pelo regime, que prendeu os candidatos e em seguida, após a inédita mobilização da campanha da oposição, anunciou uma vitória retumbante. Dossier organizado por Luís Branco.

04 de outubro 2020 - 15:15
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Já passaram quase dois meses das eleições de 9 agosto e a Bielorrússia continua a assistir a manifestações com dezenas de milhares de pessoas todas as semanas contra a fraude eleitoral. O autocrata que dirige o país há 26 anos diz que as eleições foram limpas e deram-lhe mais uma vitória esmagadora com 80% dos votos. Mas ao contrário da pompa habitual das tomadas de posse presidencial, desta vez Lukashenko foi empossado quase em segredo. Enquanto isso, o KGB trata de prender ou empurrar para o exílio as principais figuras da oposição.

As manifestações nas ruas têm sido pacíficas e com forte presença de jovens e mulheres, mas poucos imaginam Lukashenko a ser capaz de ceder o lugar pacificamente, dado que é quase refém de um sistema político que criou à sua imagem, acumulando quase todos os poderes até se tornar num Presidente absoluto. Neste dossier, Jorge Martins resume a história e o contexto político do país, da idade Média aos dias de hoje. Olhamos também para a ascensão política de Lukashenko desde os tempos da URSS e a forma como conseguiu consolidar um regime presidencialista, neutralizando quase por completo a oposição.

A reação da esquerda europeia aos protestos na Bielorrússia e à perseguição dos opositores de Lukashenko é abordada no artigo de Luís Fazenda, que critica o facto de alguns setores da esquerda se sentirem na obrigação de apoiar os interesses de Putin e da Rússia, colocando pretensas razões geopolíticas acima da vontade democrática dos povos.

Com as mulheres a aparecerem na primeira linha dos protestos dos últimos dois meses, a ativista feminista Irina Solomatina analisa a forma como a pandemia afetou a credibilidade do regime em vésperas de eleições. E opõe-se a quem veja no protagonismo feminino das líderes da oposição um virar de página em relação aos preconceitos e mitos patriarcais do país.

As violações dos direitos humanos na Bielorrússia não começaram com a prisão dos candidatos presidenciais ou na violência contra os manifestantes nos primeiros dias dos protestos. A estes episódios recentes, a União Europeia deu uma resposta contraditória, com o Chipre a bloquear até esta semana as sanções ao círculo próximo de Lukashenko e o Conselho da Europa a demorar um mês até emitir palavras de condenação, relata Kanstantsin Dzehtsiarou, académico da área da Legislação de Direitos Humanos.

Por seu lado, o investigador da Universidade de Dresden Volodymyr Ishchenko defendia logo após as eleições que as comparações da situação bielorrussa com a revolta de Maidan na Ucrânia devem ser cuidadosas e resistirem à tentação da colagem de rótulos, dadas as diferenças evidentes entre as duas sociedades e os seus contextos. Na mesma altura, dois militantes da esquerda bielorrussa, Ksenia Kunitskaya e Vitaly Shkurin, alertavam também para as interpretações erradas do descontentamento social, descrevem o ambiente nos primeiros dias de protestos e explicam como o país chegou a este ponto de saturação.

Acompanhe aqui os conteúdos publicados no esquerda.net sobre a situação na Bielorrússia.

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