Está aqui
A economia diz não às centrais nucleares
Os riscos enfrentados pelos construtores são tão grandes que cada um deles poderia, por si só, derrubar financeiramente a maior empresa, dizem estudos. Por Julio Godoy, de Berlim para a IPS.
Os enormes riscos técnicos e financeiros da construção e operação de novas centrais nucleares tornam-nas proibitivas para os investidores privados, o que refuta a tese do renascimento da energia atómica, afirmam vários estudos europeus independentes.
Estes riscos incluem os altos custos e o longo tempo de construção, depreciação dos equipamentos e falta de garantias nos preços da electricidade. A isto somam-se a crise financeira mundial e a consequente cautela dos investidores, além das dificuldades fiscais e financeiras dos governos de nações industrializadas, dizem os estudos.
Na mais recente análise sobre a viabilidade de novas centrais nucleares, o grupo Citibank concluiu que alguns "dos riscos enfrentados pelos construtores são tão grandes e variáveis que cada um deles poderia, por si só, derrubar financeiramente a maior empresa de serviços públicos". O estudo do Citibank, intitulado "New Nuclear - The Economics Say No" (Novas centrais nucleares: a economia diz não), enumera cinco grandes riscos que construtores e operadores de novas centrais nucleares devem enfrentar, relacionados com o planeamento, a construção, o preço da electricidade, o funcionamento e o fecho das centrais.
Até agora, os governos de países industrializados tentam "limitar o risco do planeamento" para os investidores, mas os perigos mais importantes são a construção, o preço da energia e o funcionamento, afirmou o grupo financeiro. Organizações ambientalistas acrescentariam o risco dos problemas de segurança, em relação à manipulação de lixo radioactivo e a probabilidade de acidentes nas centrais. O Citibank baseia suas conclusões em custos estimados de construção e funcionamento, e na necessidade de fixar tarifas de electricidade muito altas para os consumidores.
Segundo o relatório, o custo de construção de uma nova central nuclear varia entre 2.500 e 3.500 euros por quilowatt/hora. Para uma unidade média de 1.600 megawatts, o custo de construção chega a 5,6 mil milhões de euros. "A probabilidade de estes custos baixarem é muito pequena, e a de aumentarem é alta", diz o estudo. Diante dos efeitos para enfrentar estes custos, o operador precisa ter garantia de tarifas constantes da electricidade em torno de 65 euros por megawatt/hora por um longo tempo.
O Citibank citou o caso da Grã-Bretanha, onde os preços se mantiveram nesse nível durante 20 dos últimos 115 meses. "A abrupta queda nos preços da energia levou a British Energy à beira da falência em 2003", diz o relatório. Outro estudo, feito pelo físico Christoph Pistner, do Instituto Alemão de Ecologia Aplicada, chegou a conclusões similares. No seu relatório sobre "o renascimento da energia nuclear", Pistner afirma que os construtores "devem pré-financiar por um período longo não usual os enormes custos de construção de uma nova central nuclear".
Em entrevista à IPS, Pistner afirmou que a maioria das centrais de energia devem funcionar pelo menos por 20 anos para atingir um funcionamento livre de depreciação e custos de deterioração. Apenas depois desse período uma central nuclear começa a dar lucro. Além disso, acrescentou, "a indústria dispõe de poucas referências sobre os custos de construção de novas centrais nucleares, porque há pouquíssimas unidades em construção". Uma dessas unidades serve como alerta sobre os riscos deste tipo de projecto: a central nuclear de Olkiluoto 3, em construção na Finlândia desde 2004.
Embora devesse gerar electricidade em maio de 2009, a sua conclusão foi adiada várias vezes nos últimos dois anos. No dia 11 deste mês, o gerente do projecto, Jouni Silvennoinen, anunciou em Helsínquia que a inauguração "pode atrasar até depois de Junho de 2012, que é o prazo actual confirmado pelo fabricante dos equipamentos". O fabricante da Olkiluoto 3 é a estatal francesa Areva, e a empresa finlandesa TVO é a encarregada pela central, que também enfrenta uma alta explosiva dos custos de construção, inicialmente estimados em 4,1 mil milhões de dólares, estimativa esta que já subiu para 7,2 mil milhões de dólares, e não está claro quanto vai custar em definitivo.
Thibaut Madelin, especialista francês em energia nuclear, destacou que a crise financeira mundial aprofundou a incerteza vinculada aos custos de construção das centrais, o que torna improvável os grandes investimentos. Para Madelin, os atrasos na construção são o principal argumento contra as centrais nucleares. "Construir uma central de 1.600 megawatts leva pelo menos oito anos ao custo de 6 mil milhões de euros, e "isso significa que o investidor vai começar a obter lucro somente oito anos após investir uma enorme quantidade de dinheiro", disse Madelin à IPS. Agora, "se a construção de uma central nuclear demorar mais de dez anos, o projecto transforma-se numa catástrofe financeira", ressaltou.
Segundo a Agência Internacional de Energia Atómica, a média de demora na construção de centrais nucleares passou de 64 meses (mais de cinco anos) para 146 meses (mais de 12 anos) entre 1976 e 2008.
7/2/2010