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Carlos Guinote: Uma vida plena de lutas

Representante dos operários químicos no sindicato e na Câmara Corporativa, antes do 25 de Abril; cooperativista e dirigente de agricultores nos anos 1980 e 1990; Carlos Guinote destaca-se como lutador pelos direitos de quem trabalha. Uma vida cheia com outros aspetos que merecem ser conhecidos. Entrevista de Carlos Santos

Cerimónia da condecoração de Carlos Guinote com Medalha de Ouro do concelho de Palmela

Condecoração de Carlos Guinote com Medalha de Ouro do concelho de Palmela - Foto de Tânia Ramos

No passado dia 1 de junho de 2022, Carlos José Guinote foi condecorado com a Medalha Municipal de Mérito no Grau Ouro do município de Palmela1.

A proposta de concessão da condecoração foi feita pelo Bloco de Esquerda na Assembleia Municipal de Palmela e foi aprovada por unanimidade, tanto na Câmara, como na Assembleia Municipal.

Carlos Guinote nasceu a 16 de setembro de 1934, tem atualmente 87 anos. Ao longo da entrevista falou dos diversos acontecimentos da sua vida com bastante fluência e grande vivacidade, as datas ou as moedas, foram aspetos que muitas vezes escapavam, mas as histórias da vida sempre foram contadas com grande fulgor e detalhe de acontecimentos. Numa vez a comoção marcou as suas palavras, ditas com alguma indignação contida: quando falou da sua juventude infeliz.

Em tudo o que contou estão vincados os aspetos práticos da vida, a busca constante por saída para as dificuldades do dia a dia. Porém, o aspeto mais marcante é o da responsabilidade como representante de quem o elegeu e o respeito pelos direitos democráticos das pessoas. Na véspera da sua condecoração disse-me: “A medalha é de toda a gente que foi feliz comigo e me fez feliz!”

Na preparação desta entrevista, e por curiosidade, procurámos o seu nome no site da Assembleia da República, e encontrámos uma ficha2 com a indicação: “Presidente da Assembleia Geral do Sindicato dos Técnicos e Operários das Indústrias Químicas do Distrito de Setúbal [de Lisboa, na verdade], em cuja qualidade integrou a Câmara Corporativa, representando os trabalhadores”. No site da RTP e encontrámos duas referências: uma de uma busca domiciliária3, documento cedido pelo Centro de documentação 25 de Abril; outra, um vídeo4 de uma entrevista em 5 de dezembro de 1974. Nestas referências, encontra-se o mesmo traço marcante na vida de Carlos José Guinote: presidente da mesa da assembleia geral do sindicato dos Químicos, “responsável pelo derrube de forças sindicais afetas ao Estado Novo, no início da década de 70”5.

A sua vida é, no entanto, bem mais diversificada, com episódios interessantes, alguns com elevado significado na defesa da cidadania e da participação militante, mas também com relatos de momentos baixos e de tempos difíceis.

Uma juventude de escravatura

A juventude foi passada em Armação de Pera, concelho de Silves - Gare ferroviária de Silves – foto Bextrel/wikipedia
A juventude foi passada em Armação de Pera, concelho de Silves - Gare ferroviária de Silves – foto Bextrel/wikipedia

No início da entrevista, perguntámos qual a profissão dos teus pais? A resposta pronta foi: “A minha juventude foi uma juventude de escravatura”.

Vivia em Armação de Pera, concelho de Silves, nos anos 1930 e 1940. O pai era pescador e mais tarde tornou-se um “pequeno comerciante com taberna”, que “depois evoluiu para mercearia”, ambos (pai e mãe) eram analfabetos. Na escola primária fui um bom aluno, “não era de levar porrada”.

“A partir dos 12 anos fui utilizado ao serviço do meu pai em trabalho de grande esforço. De bicicleta ia todos os dias a Silves buscar gelo. Fazia 30 quilómetros, depois ia levar polvos a Albufeira por estradas de poeira, porque as carroças eram com rodas que davam cabo dos caminhos e pela força do calor, sobretudo nos meses quentes”, disse. “Nos meses quentes ia buscar gelo, era todos os dias ir a Silves e vir. E depois de Silves ia a Albufeira como se fosse uma máquina”, conta que era assim e… “muita porrada”.

Um dia, já com 20 anos, Guinote ajudou um amigo a pôr em funcionamento um café com bilhar e, no final, foi dar umas tacadas, a convite do amigo. Aí, chegou o seu pai, com um pau, deu-lhe uns “porradões”, até partir o pau nas costas.

“Aí, estourei”, declara, “peguei em mim, havia carros de fruta sempre a vir de Armação para Lisboa, meti-me num carro e vim para Lisboa à sorte, com a roupa que tinha no corpo”.

Ir trabalhar numa grande empresa constituiu um salto na vida

Vindo de Armação de Pera, Carlos Guinote, então com 20 anos, foi trabalhar para a ‘pica’, “tirar ferrugem dos barcos que iam para Angola e Moçambique”, e candidatou-se à ITT6.

Ficha de Carlos Guinote no site da Assembleia da República
Ficha de Carlos Guinote no site da Assembleia da República

“Fui ganhar 13 escudos e 80 centavos, em 1954”, diz, acrescentando que era “por dia e não ganhava sábados e domingos”. No entanto, no início foi uma vida extremamente difícil: “passava fome, muitas vezes os meus amigos davam-me os restos do lanche deles. À noite comia uma sopa e uma sandes, não tinha dinheiro para mais e andava sempre a pé”, explica e acrescenta: “não tinha dinheiro para comprar nem livros, nem para pagar as propinas. Ao fim de semana lavava a roupa. Os fins de semana eram uma tristeza para mim, chorava porque era um gajo isolado e com muitas dificuldades”…

Sentiu-se pressionado a desistir e disse ao subchefe: “tenho de me ir embora, não vou aguentar”. “Meti-me no cacifo, sentado na sanita e chorava que nem uma criança, derrotado”, porém chefe e subchefe ajudaram-no, conseguiu aumento e o chefe emprestou-lhe dinheiro. “Eu era muito trabalhador, muito dedicado, e rapidamente ocupei o lugar desse chefe, a dirigir um conjunto de pessoas de várias bancadas”, relata e alerta: “mas esse chefe ganhava três contos (3.000 escudos) por mês e eu fazendo as contas ao que recebia, recebia 720 escudos”.

“Depois a minha vida deu saltos”, salienta, apontando que foi estudar, primeiro foi tirar o curso de eletricidade, mais tarde mudou de área. Queixou-se à chefia que ganhava muito pouco e, depois, ao administrador. Foi aumentado significativamente, passando de quatro para sete escudos à hora - “foi um salto extraordinário” e já pôde alugar uma casa. Entretanto, soube que ia abrir a Petroquímica, mudou para o curso de química, candidatou-se à empresa e foi aceite. “Mudei para a química, arranjei o emprego mais bem pago do país”, a mudança foi em 1958/59 e o início do funcionamento da fábrica em 1961.

Petroquímica: “vamos estourar com o jantar de Natal da empresa”

“Fiz estágios na GALP, antigamente era Sacor, no Amoníaco Português em Estarreja e noutras empresas. Eles prepararam muito bem o pessoal, porque a fábrica era de grande exigência, muito perigosa, pois trabalhava com altas pressões. Por isso é que fiquei assim com a audição [afetada]".

Carlos José Guinote tem instigado o pessoal a apresentar reivindicações à Administração, relatório da PIDE/DGS
Carlos José Guinote tem instigado o pessoal a apresentar reivindicações à Administração, relatório da PIDE/DGS

“Fui para o laboratório, mas a empresa não cumpriu com o que tinha prometido: de seis em seis meses dar mais 500 escudos, era muito”, mas não cumpriram e “comecei a revoltar-me contra aquilo”. “Eu andava na faculdade de Ciências e comecei a entrar nas lutas estudantis, abri o meu cérebro”, salienta.

“Um dia digo ao Landum7: Oh Landum, tenho uma ideia, vamos estourar com o jantar de Natal dos gajos”.

A Petroquímica preparava-se para, tal como fazia todos os anos, realizar nesse ano de 1970 a festa de Natal no Estoril-Sol, para os trabalhadores participarem, com a família. A ideia era “estourar” com essa festa de Natal da empresa, substituindo-a por uma festa organizada pelos trabalhadores.

A Petroquímica tinha três setores, a produção do gaś para a cidade, o fabrico de amoníaco e o fabrico de oxigénio e de azoto líquido.

“À noite, eu andava pelas “capelinhas”, conversando com os trabalhadores e encontrava feed-back para entrar na política. E então, vendia livros sem lucro, tinha sempre livros proibidos, ou emprestava e assim fui criando uma rede”, conta Carlos Guinote.

Landum concordou com a festa de Natal e dividiram o trabalho de convocação, este tomava conta do laboratório, Guinote tratava das fábricas.

“Fizemos o jantar no Ginjal, só não foi quem estava a trabalhar, que a fábrica não podia parar”, conta Guinote e sublinha: “Foi uma adesão espetacular”, “nunca mais houve jantar da empresa”.

No jantar esteve presente um jornalista do Diário de Lisboa (DL), que relatou em notícia publicada no jornal. Carlos Guinote interveio, o texto saiu no DL com cortes, mas a PIDE tomou conhecimento do texto original, que está na Torre do Tombo.

“Na semana anterior ao jantar dei baixa médica, escrevi o discurso em casa e fui para o jantar. Ficou combinado que um dos trabalhadores começava a ler o discurso e era interrompido por vozes que diziam: é pá o Guinote tem uma voz melhor”.

“Quando o discurso saiu no jornal fui chamado à secção de pessoal”, relata, contando que o diretor da fábrica lhe telefonou e perguntou por que tinha organizado o jantar ao que Guinote respondeu: “Eu não organizei jantar nenhum, estive com baixa, telefonaram-me a perguntar se eu queria ir ao jantar e eu fui”. “Mas o senhor leu o discurso”, interpela o diretor, “pediram-me para ler e eu li”, respondeu. “E o Diário de Lisboa porquê?”, voltou à carga o diretor, “Oh senhor engenheiro, quando a empresa decide pôr um anúncio escolhe um jornal qualquer… Não sei porquê o Diário de Lisboa, se calhar foi lá alguém, mas eu não sei nada disto”.

Resultado, Carlos Guinote nunca mais foi contemplado com aumento anual. “Desde 1970 até ao 25 de Abril nunca mais me deram aumento, mas também nunca me revoltei, que era o que eles queriam”, frisa, com orgulho.

Conquista da direção do Sindicato dos Químicos

As assembleias gerais do sindicato eram sempre na Voz do Operário e com mais de mil pessoas

As assembleias gerais do sindicato eram sempre na Voz do Operário e com mais de mil pessoas

A festa de Natal organizada pelos trabalhadores, em oposição e alternativa à da empresa, acabou por ser a base para o ataque à direção do sindicato, controlada até então pelo regime. De novo a iniciativa partiu de Carlos Guinote, articulado com Aleixo Landum. Aquele estudava à noite, no curso de química, juntamente com outros jovens trabalhadores de grandes empresas químicas.

A lista que se constituiu para se opor às direções ligadas ao antigo regime e que veio a ganhar a direção do sindicato dos Químicos, tinha por base trabalhadores da Petroquímica, onde trabalhavam boa parte dos corpos gerentes, e tinha também trabalhadores da Dyrup, da Sacor (atualmente Galp), Robbialac, Nitratos de Portugal, e de outras empresas8.

As eleições foram marcadas para o Espelho de Água, em Belém, Lisboa, em fevereiro de 1971. Para a mobilização foram organizadas excursões de várias localidades, pois era difícil vir de diversos locais distantes, como Castanheira do Ribatejo ou Santarém, por exemplo.

Na eleição participaram 497 pessoas, tendo a lista da oposição obtido 483 votos – 97,2%. A lista afeta ao regime tinha 18 nomes, mas só teve 14 votos.

Miguel Cardina9, em “Margem de Certa Maneira - O maoísmo em Portugal”, cita o relatório de um inspetor da PIDE que esteve na reunião eleitoral, que refere que “cerca das 21.00 horas, usou da palavra um tal Carlos José Guinote, ao que parece aluno finalista da Faculdade de Direito [na verdade era de Ciências] e funcionário da Petroquímica” e que conclui: “É de salientar que, sempre que o Guinote falava era aplaudido efusivamente por todos os presentes”.

Carlos Guinote comenta, na entrevista, “Eu era um bocado doido também. Dizia coisas como esta: nós temos de tirar os polícias que temos na barriga, temos de perder o medo. Dizer isto no fascismo é de um gajo maluco...”

Um sindicato de mobilização e organização de massas

A vitória da lista da oposição ao regime veio a constituir uma viragem na ação sindical e uma base de organização dos trabalhadores. Já em 1973 viria a realizar-se nova eleição para a direção do sindicato, que confirmou os resultados de 1971, sendo ganha pela mesma direção, no essencial.

“Depois organizámo-nos e elaborámos um plano de ideias. Eu sempre lutei e ainda hoje luto pela transparência, e a transparência levava-nos a que os corpos gerentes reunissem todos juntos, independentemente de serem da direção, da mesa da assembleia geral ou do conselho fiscal. Reuníamos todos e todos com voto”, explica-nos. Após a tomada de posse, tiveram de despedir três trabalhadores do sindicato, o chefe da secretaria e mais duas mulheres, porque informavam as empresas quando os trabalhadores lá iam fazer queixas. Arranjaram técnicos para a contratação - três jovens de economia - e técnicos para a comunicação social, que participavam nas reuniões dos corpos gerentes.

As assembleias gerais do sindicato eram sempre na Voz do Operário e com mais de mil pessoas

As assembleias gerais do sindicato eram sempre na Voz do Operário e com mais de mil pessoas

A direção do sindicato decidiu também criar delegações, “é o primeiro sindicato que vai para junto dos trabalhadores, porque os trabalhadores na altura moravam junto às empresas”. Como os trabalhadores moravam à volta das empresas, a direção do sindicato, que tinha a sede em Lisboa, criou delegações em Amadora, Moscavide, Sacavém e Póvoa de Santa Iria. Nas delegações havia também o ensino do primeiro ciclo do liceu, para os trabalhadores que o quisessem, tendo apenas de se inscreverem.

As assembleias gerais do sindicato eram sempre na Voz do Operário e tinham mais de mil pessoas cada uma, pelo que muitas pessoas tinham de ficar em pé. Organizavam-se excursões para que os trabalhadores participassem nas assembleias gerais.

A direção do sindicato criou também um corpo de delegados sindicais e de delegados de higiene e segurança no trabalho. “Eram duas coisas diferentes, com trabalhos diferentes, mas ao mesmo tempo eram mobilizadores nas empresas, para a atividade e para ir às delegações, que eram sempre muito frequentadas”, refere Guinote, destacando o trabalho cultural feito nas delegações. A propósito, conta que andou a tirar fotografias aos chalés dos Espírito Santo e de outros, e às casas de trabalhadores. “Uns com uma riqueza grande e outros em casas sem condições. Fizemos slides e depois projetámos”, com muita participação.

Outro aspeto importante eram as denúncias feitas nos comunicados do sindicato. Em cada comunicado, a primeira página tinha sempre um cartune para denunciar situações e mostrar fortes contradições. “Por exemplo, quando era para discutir o horário de trabalho, redução do horário, o boneco era um trabalhador de joelhos, o patrão de papillon, gordo, em cima do empregado. Na bolha, a frase ‘não acha que 40 horas já chega?’”, conta Guinote.

Explica ainda que havia outra coisa que tinha sempre em mente: que os trabalhadores não pudessem apenas dizer eles fizeram ou eles não fizeram. “Então, sempre que discutíamos o contrato de trabalho convidávamos trabalhadores a assistir, umas vezes de uma fábrica, outras vezes de outra fábrica e fomos ao limite de um dia levar uma família, com os filhos, para apresentar a lista de alimentos e dizer olhe estas pessoas precisam disto, leite tanto, pão, manteiga, ao almoço isto e ao jantar aquilo, isto soma um salário tal”. “Basílio Horta, à altura Secretário da Confederação da Indústria, dizia: ‘isto é inadmissível, poupem-nos a este espectáculo’”10... Carlos Guinote contou que, naquele tempo, Basílio Horta lhe disse que era bom se ele aceitasse ser Presidente da Corporação da Indústria - continua muito orgulhoso por não ter aceitado.

O sindicato fazia também assembleias gerais para combater a falta de segurança, os acidentes de trabalho, lutando pela modernização de equipamento para que não houvesse desastres, que por exemplo cortavam braços a trabalhadores. “Eu ia falar com o diretor da fábrica, mas queria sempre trabalhadores da fábrica a me ouvir também”, salienta.

Petroquímica quis despedir dirigentes sindicais

Relatório da DGS sobre a eleição da direção sindical antifascista em 1971
Relatório da DGS sobre a eleição da direção sindical antifascista em 1971

A certa altura, a Petroquímica quis despedir Carlos Guinote e Aleixo Landum, recorde-se que eram os presidentes da mesa da assembleia e da direção do sindicato dos químicos.

O argumento da empresa era que os dois dirigentes sindicais saíam muito da empresa. No entanto, não concretizaram a intenção.

“Depois do 25 de Abril soubemos porquê. A PIDE foi informada, primeiro foi informada que o Carlos Guinote andava a aliciar os trabalhadores para exigências de salários. Estava o ofício no cofre da empresa, nós abrimos o cofre depois do 25 de Abril", conta Carlos Guinote.

"E havia outra informação da empresa para a PIDE a dizer: ‘nós não podemos suportar os trabalhadores Carlos Guinote e Aleixo Landum e vamos despedi-los’. A PIDE responde, ofício que lá está, não é aconselhável o despedimento dos sindicalistas Carlos Guinote e Aleixo Landum, porque pode haver grandes movimentações em Lisboa”, explica o nosso entrevistado. E, comenta: “os gajos tinham mais medo do que as forças que a gente tinha”.

GNR da Póvoa de Santa Iria tenta impedir reunião na delegação

Relatório da PIDE/DGS à busca domiciliária  à casa de Carlos Guinote
Relatório da PIDE/DGS à busca domiciliária à casa de Carlos Guinote

“Um dia vou fazer uma reunião na delegação, como ia todas as semanas, porque todas as semanas reuníamos com os trabalhadores e quando vou começar a reunião aparecem dois GNR a dizer que eu tinha de ir ao comando, o posto era na mesma rua da delegação”, narra Carlos Guinote, que acompanhava a delegação da Póvoa de Santa Iria, de acordo com a divisão de trabalho na direção do sindicato.

“O senhor vai fazer uma reunião, mas não pode, não está autorizado”, declara o comandante do posto da GNR à chegada do sindicalista, que responde “peço muita desculpa, mas tem de ler a lei. Nas nossas instalações, a lei não exige nem sequer informação, como as assembleias na Voz do Operário, em que não é preciso pedir autorização, mas informar”.

O comandante dizia que não podia, Guinote respondia que podia e perguntou se podia sair do posto, ao que o responsável da GNR disse que podia, mas não podia fazer a reunião. O sindicalista dirigiu-se à delegação e começou mesmo a reunião, que viria a ser interrompida de novo pelos mesmos dois guardas, dizendo que o comandante queria que Carlos Guinote fosse ao posto. Entretanto, chegavam jipes da GNR de Vila Franca de Xira.

“Fui ao posto e veio a malta toda atrás de mim, à volta de 100 pessoas”, relata, referindo que o comandante reagiu logo bruscamente, gerando-se de novo discórdia e mantendo o sindicalista as suas afirmações. A certa altura perguntou ao comandante: “estou preso ou saio em liberdade”. “O senhor sai e aquele pessoal que está ali na rua?”, “Com certeza que hão-de ir à vida deles”, responde e assim aconteceu.

“Esta intervenção da GNR da Póvoa de Santa Iria não foi por acaso, fazia parte já de um projeto da PIDE para o ataque ao sindicato”, sublinha Guinote.

Vaga de prisões pela PIDE

Publicação do sindicato de resposta à vaga de prisões da PIDE/DGS: caricatura de Marcelo Caetano a dizer na TV “queremos sindicatos livres e fortes” e os dirigentes sindicais presos às cadeiras
Publicação do sindicato de resposta à vaga de prisões da PIDE/DGS: caricatura de Marcelo Caetano a dizer na TV “queremos sindicatos livres e fortes” e os dirigentes sindicais presos às cadeiras

Em abril de 7311, a PIDE faz uma vaga de prisões de pessoas do Comité Revolucionário Marxista-Leninista (CRML), que acabaria por vir a resultar na sua divisão e, posteriormente, na sua extinção. Carlos Guinote já tinha entrado para o CRML e tinha uma combinação com Aleixo Landum, para se defenderem, assim como ao sindicato. Enquanto Carlos Guinote era presidente da mesa da assembleia geral e entrou para o CRML, Aleixo Landum era presidente da direção do sindicato (normalmente o cargo mais perseguido) e não estava na organização política, assim como os outros dirigentes sindicais, à exceção de um.

As prisões atingiram o sindicato dos Químicos, através de pessoas que lá trabalhavam, como funcionários ou colaboradores, e que eram jovens universitários. “Foi um terramoto que nos caiu em cima”, refere o nosso entrevistado.

A partir daí, Carlos Guinote dedicou boa parte do seu tempo e trabalho a defender a organização, levando várias pessoas para fora de Portugal, e simultaneamente a tomar mais medidas para se proteger.

Posto perante o dilema, “se baixava a coluna ou dava o peito às balas”, decidiu ir ao ataque, para o que usou a frase de Marcelo Caetano: “queremos sindicatos livres e fortes”. Na publicação seguinte do sindicato, o desenho era uma caricatura de Marcelo Caetano a dizer na TV “queremos sindicatos livres e fortes” e um grupo de pessoas atadas com cordas às cadeiras, com os nomes dos sindicatos escritos nas costas: sindicato dos químicos, metalúrgicos, lanifícios, atados com cordas às cadeiras.

Na constituição da Intersindical

Carlos Guinote estava em Lisboa no 25 de Abril, foi à Petroquímica e depois acabou por se dirigir ao Largo do Carmo. Nesse período, na Petroquímica participou no saneamento do diretor da fábrica.

Desde 1971, quando foi eleita, a nova direção integrou-se no processo de constituição da Intersindical12, iniciado em outubro de 1970, e participou na aprovação do programa básico da Intersindical, em 21 de março de 1971, em que se reivindica13 liberdade sindical, direito à livre negociação e direito à greve.

As assembleias gerais do sindicato dos químicos eram sempre na Voz do Operário

As assembleias gerais do sindicato dos químicos eram sempre na Voz do Operário

“Fomos fazendo reuniões semanais, a que se deu o nome de reuniões intersindicais. E daí resultou a Intersindical. Dávamos informações sobre o que cada sindicato estava a fazer”, conta Carlos Guinote, que sublinha que fez parte do secretariado da Intersindical a seguir ao 25 de Abril.

Na questão da unicidade sindical, Carlos Guinote posicionou-se pela liberdade sindical e interveio contra a unicidade no comício do PS de 16 de janeiro de 1975, no pavilhão dos Desportos.

Entrevista na RTP a Carlos Guinote e Álvaro Ferreira, dirigentes do sindicato dos químicos, 5 de dezembro de 1974

Entrevista na RTP a Carlos Guinote e Álvaro Ferreira, dirigentes do sindicato dos químicos, 5 de dezembro de 1974
O ataque ao sindicato dos Químicos

A partir daí, deu-se o ataque ao sindicato dos Químicos por parte da organização do PCP, que “não se conformava que um sindicato daqueles estivesse nas nossas mãos e tivesse tanta força”.

“Primeiro tentaram atacar com a tropa de choque deles, e nós tínhamos gente suficiente, encostados à parede do sindicato e à porta, para defender dos gajos. Tentaram assaltar mesmo, não houve porrada, mas eles não desistiram”, conta Carlos Guinote.

Em 1975, a organização do PCP aproveitou uma assembleia de alteração dos estatutos, e transformou-a numa “assembleia terrorista”. “Tive que me meter por baixo do palco e fugi pela parte de trás”, conta Carlos Guinote, referindo que depois o sindicato foi mesmo assaltado e com a tropa prenderam 11 pessoas da direção e a ela ligadas, levando os homens para Alcoentre e as mulheres para as Mónicas.

“A direção foi destituída, o sindicato foi ocupado e no meio daquela coisa toda, com o ministro do Trabalho (Costa Martins) na liça, a promover eleições no sindicato”, diz Guinote, contando que teve várias reuniões com Costa Martins, na altura o Secretário de Estado era Carlos Carvalhas. O debate era sobre a existência de várias mesas de voto nas fábricas (pelo menos nas que tivessem mais de 50 trabalhadores) nas eleições para o sindicato, proposta defendida por Carlos Guinote.

“As eleições fizeram-se numa sala pequena, eu levei 5 horas para votar, os gajos do PCP estavam preparados para sabotar aquilo, votavam e não saíam, e a sala estava sempre cheia. Foi uma assembleia de voto manipulada, claramente, não tivemos possibilidade sequer de contar os votos”, conta o nosso entrevistado.

42 dias na China

Na sequência da repressão policial da PIDE contra o CRML, o grupo dividiu-se, e "os elementos que escaparam para Paris – bem como Carlos Guinote, que permanecera no ‘interior’ – viriam a aderir ao PCP (m-l) e a militar activamente no partido durante os ‘anos quentes’ da revolução”, segundo refere Miguel Cardina14. Ainda no tempo do fascismo, Carlos Guinote foi a Paris, para se encontrar com o dirigente do seu grupo Eduíno Vilar.

A China reconheceu em Portugal o PCP (ml), como partido comunista em Portugal, assim como a Associação Portugal China. Eduíno Vilar e Carlos Guinote foram à China em março de 1975, onde estiveram 42 dias, tendo Vilar tentado ir à Albânia, mas a visita da delegação não foi aceite.

“Eu falava da parte sindical, ele da movimentação de forças no exército”, relata Guinote, referindo que “os chineses foram tomando nota” e que “houve alguns passeios, claro, fomos à casa do Mao Tsé Tung, fomos a Xangai”.

“Os chineses queriam saber coisas, faziam perguntas, queriam saber o que se passava em Portugal. Isso deu para muita conversa, sobre a situação e as movimentações que havia", salientou também que “os chineses deram muito dinheiro" ao  grupo. As divergências no PCP (ml) agravaram-se com o uso desse dinheiro. “Comecei a ver a aplicação daquele dinheiro ao serviço do Vilar e comecei a ficar incomodado. Ainda por cima eu era do secretariado”.

“Numa entrevista na televisão há uns anos, Vilar veio dizer que o seu papel era atacar o PCP e que feito esse trabalho não tinha mais nada que fazer”, foi este o papel dele, na luta política. Guinote questionou as contas e foi expulso, com o pretexo de que “estava a desconfiar do secretário-geral”. “Depois condenaram-me à morte, pelo menos verbalmente”, aponta, referindo que chegou a ser perseguido.

Derrotado no sindicato, Carlos Guinote esteve pouco tempo como funcionário político no grupo a que pertenceu e lançou-se na reconstrução da sua vida.

Mudança de vida

Esta entrevista a Carlos Guinote foi feita via zoom

Cunicultura

“Entretanto, comecei uma vida nova a produzir coelhos no quintal. Vi um livro na Bertrand, achei que podia ser bom e foi assim”, conta Carlos Guinote, explicando que no quintal começou com 12 fêmeas, depois passou para 50, mas incomodava a vizinhança. Depois, comprou um terreno (em 1978), onde vive ainda hoje, no concelho de Palmela.

“Foi um trabalho escravo, tive de trabalhar a fazer a casa. Como tinha estudado o mínimo na engenharia, fiz o desenho todo, mas o pedreiro não sabia ler o projeto, fiz eu os caboucos. Pedi dinheiro emprestado à Caixa Geral de Depósitos (CGD) para a casa e, com o meu trabalho sobrou dinheiro para um pavilhão de coelhos com dimensão para 80 fêmeas, e para a engorda também”, explica.

Além disso, foi fazendo agricultura ao mesmo tempo, indo vender legumes (cenouras, lombardos, ervilhas, favas, batata doce) para a Praça de Setúbal. Dormia à noite no carro, nos dias em que tinha de ir vender, “foi uma vida difícil”, assinala.

O peso dos juros era terrível, relata, pois a taxa chegou a ser de 32% e teve de pedir dinheiro para furos, para a rega, canalizações. “Foi doloroso… cheguei a pedir dinheiro, a uma empregada, para o gasóleo para ir ao matadouro”, refere – para mim, o pior período foi a fase inicial, a partir de 1981.

Conta que foi fazendo agricultura e que foi aumentando o número de coelhos. “Ia ao matadouro, ia distribuir, primeiro com uma bicicleta, depois com um automóvel, a seguir com uma carrinha e postriormente com um carro de frio”. E narra-nos um episódio que o obrigou a comprar o carro de frio: um dia o responsável do Jumbo de Almada encomendou-lhe 400 coelhos, mas quando os foi entregar não os aceitou, justificando que não se tinham vendido anteriormente. A solução, naquele tempo, foi combinar a venda, “pelo preço que quiser”, com o encarregado da Pluricoop [que tinha cooperativas em Pinhal Novo, Palmela, Alhos Vedros, Lavradio], com um preço baixo conseguiu vender muito. “Fui obrigado a comprar de imediato um carro de frio, porque não tinha carro de frio (viatura frigorífica). Se tivesse carro de frio aguentava e pronto, depois num dia ou dois ou três distribuía. Foi dramático”, assinala.

Guinote fez um curso em Barcelona, “que era dos melhores da Europa”, e como estava bem preparado não tinha veterinário. Quando precisava, mandava fazer análises no laboratório de investigação veterinária em Benfica (Lisboa), que detetavam a razão de mortes de coelhos e indicavam o produto para tratar a doença. “O coelho é dos animais mais difíceis para tratar porque é muito sensível”, destaca.

Após diversos surtos, teve de abandonar a produção de coelhos. “Acabei com os coelhos por duas razões: porque se abriu o mercado do leste à Europa e pela produção proveniente da China. Os chineses tinham o coelho como sub-produto, produziam o angorá e era o pêlo do coelho que era a riqueza da produção, para fazer a lã angorá. Como eram os maiores produtores de angorá do mundo, começaram a introduzir o coelho, barato, congelado, que era um sub-produto, a um preço baixo. A China apanhou logo 20 ou 30% do mercado português”. Por outro lado, surgiu outra doença que atingia os coelhos pequenos, “morria um coelho de 3 em 3 minutos”. “Acabei com os coelhos e meti-me no turismo”, sublinha, relatando que adaptou uma garagem e as instalações da criação de coelhos, construindo quartos para alojamento turístico.

Cooperativismo agrícola

Entretanto, fiel à sua preocupação constante com a participação cidadã, Carlos Guinote foi convidado e aceitou aderir à Cooperativa Agrícola de Pinhal Novo. Durante três anos, de 1982 a 1985, dedicou-se a este projeto.

“Iniciou-se um processo de instalações para frio e calibragem da fruta, era um projeto muito bonito a que me lancei com muito prejuízo pessoal”, relata. Porém, o projeto acabou por terminar por interferência organizada do PCP. “Numa assembleia violenta não deixaram discutir o programa. A pessoa que queria ser presidente chegou a ameaçar-me com uma pistola. Era um programa bonito, de pôr os agricultores a produzir com a certeza da entrega, com certeza de preço, para os centros comerciais, as grandes unidades portuguesas, eu preparava-me até para encetar negociações com casas em Paris”.

“O ataque à cooperativa foi o princípio da sua falência”, assinala Guinote, apontando que “os equipamentos rapidamente deixaram de ser utilizados, começaram a alugar o frio a empresas, e lamentavelmente assisti à autorização para vender para a sucata os calibradores da fruta. Há pouco estive lá na cooperativa e disseram-me que aquilo está tudo destruído, não tem tido manutenção e as câmaras do frio vão para a sucata. Uma coisa terrível, sofri muito com aquilo”, acusa.

Presidente de associação de agricultores

Em 1987, Carlos Guinote foi convidado, por pessoas afetas ao PCP, para a associação de agricultores, onde esteve até 1995, era presidente.

“Começámos por encontrar logo uma grande dificuldade na Herdade da Comporta, com as águas salgadas do rio, que ameaçavam invadir os arrozais, porque os muros de proteção tinham sido degradados. Fizemos muitas reuniões com aquela gente toda interessada, rendeiros do Espírito Santo. Tinha de reunir com o gajo que representava o Espírito Santo e aquilo acabou se resolver, apesar de ter demorado”, afirma Carlos Guinote.

O nosso entrevistado reporta outra luta bem resolvida. “Em setembro/outubro de 1989 (talvez 1990) Cavaco Silva autorizou a importação de arroz. O arroz ainda não tinha condições de ser utilizado, teve de usar os secadores de Portugal e não havia espaço para secar o arroz dos arrozais de Comporta e Carvalhal”.

“Aquilo foi dramático, começou o tempo de chuva, havia gente que chorava, porque era o ganha-pão deles, cada um tinha 6/7 hectares de arrozais. Aquilo foi distribuído pelos pequenos agricultores, foi ocupado a seguir ao 25 de Abril, e foi terrível. Bati à porta de todos os secadores do ministério da Agricultura e os particulares, até que resolvemos fazer um corte de estrada na estrada de Alcácer do Sal, com sucesso”, salienta.

“A partir daí, na semana seguinte, o governo arranjou forma de o arroz da Comporta e do Carvalhal ser secado”, relata, referindo que “o único contra foi quando o pessoal se foi embora, e eu ainda estava na estrada lá no local, a GNR mandar-me parar e dizer o senhor fez esta infração, mais esta e esta, atravessou o traço contínuo aqui e acolá. Multaram-me ali por uma série de infrações que eu fiz”.

Porém, a intervenção do PCP fechava a ação, reduzindo-a ao ataque ao Governo, de qualquer maneira, refere o nosso entrevistado e exemplifica. “Há uma altura em que saiu uma portaria a aumentar as rendas aos agricultores, verificámos que a classificação estava errada, havia pessoas penalizadas com terrenos de mais baixa qualidade e que apareciam como de primeira qualidade. Então, pedi uma audiência ao secretário de Estado da Agricultura, que foi uma pessoa ponderada, que gostei de ouvir. E ele diz-me: vocês podem ter muita razão, mas faltam seis meses para as eleições. Não esperem que se vá fazer uma portaria nova por causa do preço das rendas, isso não vai acontecer, dou-vos um conselho, dizia ele, analisem as terras e aí vocês vêm com dados bem claros da vossa razão. E ficou assim e eu aceitei”, refere.

Conta que, quando vinha a descer as escadas de saída, os dois assessores, “já estavam com os cabelos em pé”, depois propuseram que se apresentasse a proposta de fazer uma manifestação com os tratores. Guinote discordou, disse que não apresentava essa proposta com que não concordava, porém não chegou a haver reunião, uma vez que não havia mobilização das pessoas para tal. “Eu sabia, tinha percebido na reunião anterior que aquilo não tinha uma adesão grande”, refere, apontando que queriam fazer uma manifestação, um corte de estrada e não tinha sentido nenhum. Nas eleições seguintes, Guinote saiu por discordar com eleição de braço no ar.

No final dos anos 1980, Carlos Guinote voltou a organizar-se politicamente, aderindo à UDP. Com o nascimento do Bloco de Esquerda participou na sua fundação e tem militado ativamente no concelho de Palmela.

 

Procurámos nesta entrevista narrar episódios da vida do nosso entrevistado.

Quando se começou a afirmar como sindicalista, Carlos Guinote era um jovem trabalhador de uma nova classe operária, que se formou em Portugal, no dealbar do que veio a ser o 25 de Abril. Nessa ação, juntou sempre a preocupação pela ação coletiva com uma elevada consideração pelos direitos da cidadania e como tal prossegue.

Entrevista realizada por Carlos Santos para esquerda.net

Notas:

6 ITT em Portugal nos anos 1960 era uma fábrica de semi-condutores, localizada no concelho de Cascais.

7 Aleixo Landum, já falecido, foi o Presidente da Direção do Sindicato Nacional dos Técnicos e Operários das Indústrias Químicas do Distrito de Lisboa, na lista que derrotou a lista afeta ao regime, antes do 25 de Abril.

8 Carlos Guinote, Aleixo Landum e Margarida Quintino ofereceram o espólio destas direções do sindicato dos Químicos do distrito de Lisboa ao Centro de Documentação 25 de Abril da Universidade de Coimbra.

9 “Margem de certa maneira: o Maoismo em Portugal 1964-1974”, Miguel Cardina, Edição Tinta da China https://tintadachina.pt/produto/margem-de-certa-maneira/

10 Citado relato de Carlos Guinote em“Margem de certa maneira: o Maoismo em Portugal 1964-1974”, Miguel Cardina, Edição Tinta da China https://tintadachina.pt/produto/margem-de-certa-maneira/

11 “Margem de certa maneira: o Maoismo em Portugal 1964-1974”, Miguel Cardina, Edição Tinta da China https://tintadachina.pt/produto/margem-de-certa-maneira/

14 “Margem de certa maneira: o Maoismo em Portugal 1964-1974”, Miguel Cardina, Edição Tinta da China https://tintadachina.pt/produto/margem-de-certa-maneira/

Sobre o/a autor(a)

Editor do esquerda.net Ativista do Bloco de Esquerda.
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