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Dia da Defesa Nacional: para quê?

Aquilo é “extremamente interessante”, mas só com a ameaça de uma multa pesada se consegue “motivar” os jovens para tal coisa.

É provável que nos próximos tempos, com o aproximar da Cimeira da Nato que se realiza em Novembro em Portugal, se ouçam com mais força os discursos da inevitabilidade da guerra e até da necessidade da agressão.

Vão dizer-nos que a guerra é importante porque sem a guerra não há paz. Vão dizer-nos que a guerra é indispensável porque há “novas ameaças” que a justificam: o terrorismo (claro…), a criminalidade internacional (e garanto-vos que não estarão a referir-se aos offshores nem à banca…), o ambiente (e sabemos como a guerra pelos recursos já está aí), os ciber-ataques e o que mais se lembrarem. Vão dizer-nos que é preciso não apenas exércitos nacionais mas que é necessário “intervir globalmente”, dada a natureza do mundo e dos seus fluxos globais (e quem, senão a NATO, poderia fazê-lo?). Vão dizer-nos que a União Europeia precisa de se assumir também como uma potência militar, porque é uma questão de equilíbrio “geo-estratégico” (mas claro, sob a batuta da NATO). E vão explicar-nos por que é tão importante Portugal ficar na fotografia desta cimeira e dos seus projectos. Vão explicar-nos que os soldados portugueses que participam de ocupações como a do Afeganistão nos devem encher de orgulho. Vão até, provavelmente, tentar convencer-nos que o que gastamos com essa participação não pode ser “cortado”, que os submarinos são úteis e que nos gastos militares não pode haver planos de austeridade.

O Bloco apresentou esta semana um projecto de lei para acabar com a obrigatoriedade do Dia da Defesa Nacional. Já acabámos com o Serviço Militar Obrigatório, mas ficaram os resquícios da tropa imposta. Somos um país democrático, é certo, mas não aceitamos que um jovem possa invocar objecção de consciência para não participar da cerimónia.

Este ano, pela primeira vez, as raparigas também são chamadas. São cerca de 115 mil jovens, que nasceram em 1992, que são obrigados a ir passar um dia ao quartel para ouvir o elogio das Forças Armadas e dos valores castrenses. Portugal não tem serviço militar obrigatório, mas as Forças Armadas tinham que ter o seu dia para poderem promover os seus feitos e recrutar nova gente. Dizem os entusiastas que é um dia “engraçado”, “informativo”, que os jovens adoram e que até há quem se ofereça para ficar. Se é assim, poderiam então aceitar que cada um decidisse por si. É que na verdade, não só se obrigam os jovens a ir como quem não for paga uma multa que pode chegar aos 1248 euros! Percebe-se a ideia: aquilo é “extremamente interessante”, mas só com a ameaça de uma multa pesada se consegue “motivar” os jovens para tal coisa.

Há alguns anos, quando se instituiu o Dia da Defesa Nacional, o Bloco fez a mesma proposta. Na altura, todos os partidos, do CDS-PP ao PCP, recusaram a ideia. Por eles, todos os jovens devem ser obrigados a ir. Será que desta vez vai ser diferente?

Sobre o/a autor(a)

Dirigente do Bloco de Esquerda, sociólogo.
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