Está aqui

Chomsky defende que "desmantelar o imperialismo é um projeto perfeitamente viável”

“Para o fazer, é necessário dar os passos que já foram dados no passado: educação, organização, protestos, manifestações, resistência direta, solidariedade para com as vítimas”, afirma Noam Chomsky.
Noam Chomsky.

Em resposta ao P2, o ativista norte-americano frisa que “o respeito pelas instituições tem diminuído acentuadamente ao longo dos anos” e tal é resultado do “impacto severo” das políticas socioeconómicas durante a era neoliberal: “A riqueza concentrou-se fortemente com o poder político, enquanto a maioria das pessoas estagnou ou viu o seu rendimento cair, e sentiu-se — justamente — pouco representada pelo sistema político”, avança.

O intelectual e linguista mundialmente renomado enfatiza que “a raiva e o ressentimento oferecem oportunidades aos demagogos cínicos como Trump, Bolsonaro ou Salvini, que estão a degradar a arena política, e que podem descartar a feia realidade pela qual são responsáveis ao dizer que são fake news”.

Chmosky lembra que Bolsonaro “foi ao ponto de rejeitar como fake news relatórios do seu próprio Governo sobre a destruição da Amazónia, que o próprio autorizou seguindo o interesse dos seus amigos na mineração e no agro-negócio. E Trump é um mestre desta arte”.

O ativista norte-americano faz referência, por outro lado, à utilização massiva de fake news na campanha eleitoral de Bolsonaro: “Depois das manobras fraudulentas, que vão sendo expostas, para silenciar o provável vencedor das eleições (Lula da Silva, o prisioneiro político mais importante do mundo), uma enorme campanha nas redes sociais foi inventada com as mentiras mais escandalosas para demonizar a oposição política e apoiar a figura depravada, que foi favorecida pelas elites brasileiras. Este foi o passo final de um ‘golpe suave’ que remonta há vários anos”.

Também nos Estados Unidos, “houve uma campanha semelhante, embora não tenha atingido a escala ou a vulgaridade do que aconteceu no Brasil”. Segundo assinala Chomsky, a mesma foi organizada pela empresa de extrema-direita Cambridge Analytica que, “com a plena cooperação do Facebook, segmentaram mensagens específicas para os eleitores apoiarem o favorito de direita”.

Desmantelar o imperialismo é um projeto perfeitamente viável

Para o ativista norte-americano, “desmantelar o imperialismo é um projeto perfeitamente viável”, sendo que, para o fazer, “é necessário dar os passos que já foram dados no passado: educação, organização, protestos, manifestações, resistência directa, solidariedade para com as vítimas. Assim como já foi feito antes, muitas vezes com um sucesso considerável”.

Chomski aponta que “o Estado social suavizou os contornos duros do capitalismo, mas tem sido corroído com sucesso pelo ataque neoliberal – uma questão que é muito bem compreendida, não apenas pela população que sofre as consequências mas também pela elite”.

Salientando que têm havido “grandes esforços para minar os movimentos sociais, principalmente o movimento laboral, mas também outros, e para atomizar as pessoas”, o linguista garante, no entanto, que “o ativismo permanece vivo e a funcionar”.

Para Chomsky, os jovens activistas do Sunrise Movement e do Extinction Rebellion, entre outros, são exemplos “da sobrevivência de uma sociedade organizada”.

“É possível contribuir de todas as formas, entre elas apoiando vínculos com tradições mais antigas de luta, apoiar os seus pensamentos e as suas conquistas. Mas também por participação direta, frisa o ativista norte-americano.

Questionado sobre a forma de evitar que a sociedade seja reduzida a indivíduos, como forma de enfraquecer a reivindicação, Chomsky afirma que “não há segredos”: “Crucialmente, reconstruir um movimento de trabalho vibrante e ativo, mas também movimentos populares com base noutras preocupações. E criar instituições baseadas em solidariedade e ajuda mútua, como cooperativas e empresas que são propriedade dos trabalhadores, que estão agora a proliferar nas áreas industriais degradadas dos EUA. Mais uma vez, há um longo caminho a percorrer, mas não há mistérios a respeito de como proceder”.

Numa altura em que ainda decorria a anterior legislatura, o P2 teve oportunidade de questionar Chomsky sobre o desempenho do Governo português: “Não posso fingir que estou familiarizado com o assunto, mas pelo que pude ir apreendendo, parece-me um dos desenvolvimentos mais esperançosos do período atual”, responde o intelectual norte-americano.

Termos relacionados Internacional
Comentários (2)