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Programa Supernanny: SIC acusada de violar direitos das crianças

O programa Supernanny, que estreou na SIC no domingo, a seguir ao Jornal da Noite, tem sido alvo de inúmeras críticas por parte de entidades como a Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens, o Instituto de Apoio à Criança, a Unicef e a Ordem dos Psicólogos.

O programa Supernanny foi criado em 2004 no Reino Unido. O mesmo mereceu a crítica do Comité dos Direitos da Criança das Nações Unidas, que repudiou a “invasão da privacidade das crianças em virtude de programas de televisão”.

Entretanto, o formato Supernanny já foi transmitido em 15 países, entre os quais Estados Unidos, China e Brasil. Em Portugal, o programa, de cerca de 40 minutos, é conduzido pela psicóloga clínica Teresa Paula Marques.

De acordo com os seus promotores, o reality show visa ir ao encontro das famílias portuguesas para ajudar a controlar a rebeldia dos filhos e dar resposta aos apelos de pais e educadores.

Durante o programa, Teresa Paula Marques acompanha com câmaras a rotina das famílias, sugerindo, e supervisionando, a implementação de medidas corretivas.

Conteúdo é “manifestamente contrário ao superior interesse da criança”

A Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ) considera que existe um “elevado risco de o programa violar os direitos das crianças, designadamente o direito à imagem, à reserva da vida privada e à intimidade”.

Em comunicado enviado à comunicação social, a presidente da CNPDPCJ, Rosário Farmhouse, sublinhou que o conteúdo é “manifestamente contrário ao superior interesse da criança, podendo produzir efeitos nefastos na sua personalidade, imediatos e a prazo”.

A CNPDPCJ já “manifestou junto da estação de televisão SIC a sua preocupação face a este tipo de formato e conteúdos, solicitando uma intervenção com vista à salvaguarda do superior interesse da criança” e solicitou à Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) análise do conteúdo do programa. Foi ainda encaminhada uma queixa para a Comissão de Protecção de Crianças e Jovens com competência territorial.

“Violação do direito de uma Criança à sua imagem e à intimidade da sua vida privada”

O Instituto de Apoio à Criança também entendeu “dever tomar posição face ao que considera uma violação do direito de uma Criança à sua imagem e à intimidade da sua vida privada”.

“Assistimos ontem a situações de conflito entre uma criança e sua mãe, ocorridas em contexto privado, as quais foram exibidas em horário nobre num canal televisivo de grande audiência” e a “um aconselhamento dito psicológico”, que “jamais” deveria acontecer “perante câmaras", escreveu, por sua vez, o Instituto de Apoio à Criança.

Os responsáveis do IAC lembram ainda que “esta é também uma preocupação a nível da União Europeia e do IAC, que no âmbito de um Projeto Europeu em que integra a Comissão de Ética tem acompanhado os trabalhos relacionados com a entrada em vigor de uma diretiva sobre o direito à imagem, que ocorrerá em Maio próximo e que restringirá ainda mais os direitos dos pais à imagem dos filhos, para que estes não possam ser privados de direitos fundamentais, apenas por serem criança”.

A presidente da direção do IAC e magistrada do Ministério Público está convencida “de que a lei que temos permite suspender o programa, assim haja vontade"

Dulce Rocha acredita que será possível interpor uma medida cautelar por forma a evitar a repetição de um programa que põe “em causa a própria dignidade da criança, que é um valor fundamental", sendo que "o ideal seria a própria estação, a SIC, tomar essa iniciativa".

Estado tem de garantir a proteção da criança e o seu bem-estar

Também a diretora da Unicef Portugal, Beatriz Imperatori, defendeu que o programa televisivo viola os direitos das crianças e exortou o Estado a garantir a proteção da criança e o seu bem-estar, “tendo a ERC um papel fundamental na análise do conteúdo do referido programa”.

No que respeita aos meios de comunicação social, e “reconhecendo o papel importante que desempenham na difusão de informação de interesse social e cultural para a criança”, a Unicef pede para que os mesmos “assegurem sempre o superior interesse da criança, nomeadamente o seu bem-estar físico e mental em todos os canais e programas”, alertando que “a exposição pública, nomeadamente dos comportamentos violentos retratados, poderá colocar em causa o bem estar da criança e o seu desenvolvimento actual e futuro”.

Ordem dos Psicólogos repudia prática de psicologia em programas de divulgação massiva

Num parecer elaborado a pedido da produtora do programa Supernanny, a comissão de ética da Ordem dos Psicólogos (OP) opôs-se à "prática da psicologia em programas de divulgação maciça".

“Qualquer profissional de psicologia que intervenha neste contexto deve explicitar que não está a levar a cabo qualquer tipo de intervenção psicológica”, lê-se no documento assinado pelo presidente do comité de ética da OP, Miguel Ricou.

“O espaço público mediático não pode ser considerado como um setting adequado para a intervenção psicológica”, escreve Ricou, adiantando que “a exposição pública de clientes não pode, de forma alguma, ser considerada no melhor interesse destes”.

SIC responde às críticas

A SIC já veio alegar que o programa aborda "situações reais, ocorridas em ambiente familiar, de um modo responsável, não exibicionista e sem explorar situações de particular fragilidade".

A estação de televisão recordou que o Supernanny teve sucesso noutros países, como a Alemanha, Espanha, França e Suécia, “onde os padrões de protecção dos direitos dos menores não se revelam menos exigentes do que os existentes em Portugal” e que essas experiências demonstraram que o programa “não gera efeitos negativos ou de censura em ambiente escolar e social, antes contribuindo para uma melhoria significativa da qualidade de vida familiar”.

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