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Novo Código Contributivo: instrumento para mais austeridade
Na verdade, este novo Código Contributivo, que entrou em vigor no primeiro dia deste ano, resulta de uma nova proposta do Governo, substituindo a aprovada no ano passado, cujo adiamento de entrada em vigor para 2011 foi apoiado por todos os partidos da oposição, embora por razões variáveis.
A proposta surgiu incluída no Orçamento de Estado para 2011 (OE’2011) e no âmbito das medidas de austeridade que visam o aumento das receitas, neste caso, através do aumento das receitas contributivas. Não deixa de ser curioso que o Governo mantenha a justificação das alterações baseando-se num pretenso “combate à precariedade e aos falsos recibos verdes”, ao mesmo tempo que reclama por compreensão e impõe sacrifícios incontornáveis, embora só para alguns. Teixeira dos Santos e José Sócrates continuam a não entender que não podem piscar o olho aos precários e aos patrões ao mesmo tempo, procurando consensos e acalmando ânimos, até porque há um lado que é mais fraco e que por isso sairá sempre prejudicado, o dos trabalhadores precários. Neste caso, o novo Código Contributivo traz alterações e penalizações para todos os trabalhadores.
De qualquer modo, enquadrando-se este novo Código Contributivo nos instrumentos de implementação da austeridade, é-lhe subtraído o seu importante papel como ferramenta legal, no sentido de estabelecer os moldes em que responsabilidades e direitos são garantidos, tal como o cumprimento das funções essenciais do Estado.
As alterações e as novidades
No que diz respeito aos trabalhadores por conta de outrem, nesta nova proposta o Governo propõe que as contribuições para a Segurança Social passem a incidir sobre um conjunto mais alargado de rendimentos, onde se incluem os provenientes, por exemplo, do subsídio de alimentação, do subsídio para rendas de casa, das compensações por cessação do contrato de trabalho ou dos abonos para falhas.
Para os trabalhadores independentes – os recibos verdes – a anterior versão do Código Contributivo já instituía um único regime de contribuições para a Segurança Social. Isto mantém-se e por isso a base de incidência contributiva passa a ser calculada através de 70% do duodécimo do valor total dos recibos passados no ano anterior e haverá escalões pré-definidos (11 no total) que remetem para percentagens do Indexante dos Apoios Sociais (IAS). O escalão mínimo é igual a um IAS, isto é, 419,22€, logo a contribuição mínima será de 124,09€. O escalão mais alto é referente a rendimentos na ordem dos 5 mil€.
Para calcular a base de incidência contributiva: (valor total das prestações de serviço no último ano, mesmo que apenas exista um recibo/12) x 0,7 = valor a comparar depois com o escalão respectivo.
Este valor é calculado com base no novo e único valor da taxa contributiva – 29,6% - o Governo aumenta 5 pontos percentuais à sua anterior proposta (24,6%). Deixa de haver regimes diferentes de contribuições (antes podia-se escolher entre um regime de protecção mínima, 25,4%, ou alargada, 32%).
Exemplo prático 1: quem estiver no primeiro escalão (a partir de 419,22€), terá de contribuir com o valor mínimo, 124,09€ (419,22€ x 0,296). Mas quem estiver no segundo escalão (a partir de 628,83€), contribuirá com 186,13€.
Exemplo prático 2: quem ganhe 700€ mensais (8400€ anuais/12) x 0,7 = 490€ - pagará segundo o 1.º Escalão, ou seja, 124,09€.
Escalão: Percentagem do IAS - Valor mínimo do escalão € - Quanto se paga €
1.º escalão: 100 – 419,22 – 124,09
2.º escalão: 150 – 628,83 – 186,13
3.º escalão: 200 – 838,44 – 248,18
4.º escalão: 250 – 1048,05 – 310,22
5.º escalão: 300 – 1257,66 – 372,27
6.º escalão: 400 – 1676,88 – 496,45
7.º escalão: 500 – 2096,1 – 620,53
8.º escalão: 600 – 2515,32 – 744,53
9.º escalão: 800 – 3353,76 – 992,71
10.º escalão: 1000 – 4192,2 – 1240,89
11.º escalão: 1200 – 5030,64 – 1489,98
Para as entidades empregadoras, a penalização dos 5% como participação na contribuição para a Segurança Social (já prevista na anterior proposta) deixa de ser aplicável para todos os trabalhadores a recibos verdes “contratados”, mas apenas nos casos em que 80%, ou mais, dos rendimentos do trabalhador tenha origem nessa mesma empresa (ou grupo). O Governo argumenta que a medida permitirá filtrar as situações em que existem indícios de trabalho dependente encapotado, ou seja, a existência de falsos recibos verdes.
Além disto, esta medida também prevê que quando detectadas as “entidades contratantes” (as que concentram 80% dos rendimentos) é feita uma comunicação à Autoridade para as Condições do Trabalho ou aos serviços de fiscalização da Segurança Social, para se averiguar a legalidade do recibo verde, isto é, saber se o posto de trabalho se enquadra ou não num modelo contratual, em vez de prestação de serviços.
Contradições e injustiça social
Porque a austeridade é selectiva e os sacrifícios são só para os trabalhadores, adia-se o combate à precariedade para nova apreciação em 2014, e só depois de um novo acordo em Concertação Social – cedendo às exigências das organizações patronais, o Governo prescinde das medidas, previstas no diploma anterior, de penalização e bonificação das taxas contributivas das empresas (agravamento de 3 pontos percentuais nos contratos a prazo e menos 1 ponto percentual nos contratos sem termo).
Com a desculpa, legítima e politicamente importante, de que não devem existir formas de salário escondido sobre o qual não há contribuição (esta situação prejudica sobretudo as carreiras contributivas dos trabalhadores e a capitalização da Segurança Social), alarga-se injustamente a base de incidência da contribuição a itens como o subsídio de alimentação e não à participação em lucros. Isto fica adiado para eventual aplicação em 2014. E assim o Sr. Henrique Granadeiro (PT) dormirá mais descansado.
A existência de um regime único de contribuições para a Segurança Social para os recibos verdes poderia ser a alteração que viria repor um pouco de justiça contributiva, fazendo-se corresponder as contribuições mensais aos valores efectivos dos rendimentos do mês a que se referem. Mas não, não é essa a intenção do Governo, porque as contribuições mensais são calculadas a partir do valor total dos recibos passados no ano anterior.
Esta medida ignora completamente a realidade dos recibos verdes e sobretudo a dos falsos recibos verdes, cujos valores dos rendimentos dependem precariamente, na sua maioria, de cada trabalho, cada reportagem, cada espectáculo, cada projecto.
Além disto, com a fixação de uma única taxa contributiva nos 29,6%, associada a um esquema de escalões, onde o mais baixo é para rendimentos até 419,22 euros, este novo regime penalizará sempre mais os rendimentos mais baixos. Todos contribuem segundo a mesma taxa, quer ganhem o salário mínimo ou 5 mil euros por mês.
O Governo prevê ainda que todos os trabalhadores independentes tenham acesso a um sistema de protecção na doença (actualmente, apenas acessível no regime alargado de contribuições), mas outros direitos essenciais como o subsídio de férias, o seguro de trabalho ou a protecção no desemprego continuarão desconhecidos para os milhares de trabalhadores a falsos recibos verdes.
O combate aos falsos recibos verdes ficará claramente comprometido se reduzido a medidas mínimas como o accionar da inspecção da ACT apenas para as empresas definidas como “entidades contratantes”. Não serão as condições em que é realizado o trabalho, condições que no Código do Trabalho são os critérios para definir um contrato de trabalho (as que definem a ilegalidade do recibo verde) que contarão, apenas a concentração dos rendimentos accionará a inspecção.
Na generalidade, as vantagens para as entidades empregadoras que resultam do abuso dos falsos recibos verdes mantêm-se, tal como se mantém a impunidade perante o Estado e a não exigência de responsabilidade colectiva e social. Trata-se de legalizar a precariedade, sem vergonha, às claras, e perante todos.
Com o mecanismo de verificação introduzido nesta proposta, apesar das dúvidas que suscita sobre a sua operacionalidade e implementação (ninguém é muito crente na capacidade inspectiva da ACT), há, ainda assim, um sinal de reconhecimento, por parte do Governo, daquilo que é um flagelo social decorrente de uma impunidade generalizada, isto é, a vida de milhares de trabalhadores a falsos recibos verdes. Tal só foi possível graças à pressão política significativa da acção dos movimentos de precários, sobretudo nos dois últimos anos, e também de partidos como o Bloco de Esquerda, na primeira linha da denúncia da precariedade no Parlamento.
Aliás, neste sentido, o Bloco apresentou um projecto de lei com alterações ao Código Contributivo com vista a repôr justiça social em matéria de contribuições para a Segurança Social. O projecto de lei do Bloco está disponível aqui.
Este novo Código Contributivo em vigor peca por não vir acompanhado de medidas de justiça social no que diz respeito à situação das dívidas à Segurança Social, que muitos trabalhadores a falsos recibos verdes acumulam – situação que deriva não só da ilegalidade da condição laboral, mas sobretudo da injustiça do regime de contribuições, que se mantém com o novo Código.
Assim, fica a pergunta: se o Governo reconhece agora a necessidade de verificação da ilegalidade do recibo verde para efeitos contributivos, porque não acatou nem valorizou a proposta (levada à discussão no Parlamento) subscrita por mais de 12 mil peticionários que reclamavam que “antes da dívida têm direitos” e que, portanto, antes da Segurança Social cobrar uma dívida deveria assegurar-se das condições em que esta foi contraída?
Para haver justiça social é preciso ter vontade disso e legislar nesse sentido.
Artigo de Sofia Roque.
Comentários
E o que vamos fazer? Falar,
E o que vamos fazer?
Falar, falar, falar.... ... .. .
Li aqui no Esquerda.net que:
Li aqui no Esquerda.net que: "Esta medida ignora completamente a realidade dos recibos verdes e sobretudo a dos falsos recibos verdes, cujos valores dos rendimentos dependem precariamente, na sua maioria, de cada trabalho, cada reportagem, cada espectáculo, cada projecto."
Esta afirmação parece-me pouco clara, pois eu sou um "verdadeiro recibo verde", faço reportagens, fotografia e escrevo, e o valor do meu rendimento é que depende em absoluto dos trabalhos que vou encontrando. Encontro clientes, ganho. Não encontro, apenas pago à Segurança Social.
Também já fui "falso recibo verde" e, apesar de tudo, era uma vida mais segura e confortável, visto ter o rendimento garantido 12 meses por ano. Sinceramente, parece incrivel, mas tenho saudades de ser um "falso recibo verde"...
A propósito do novo código
A propósito do novo código contributivo dos trabalhadores independentes, agora para nós é o inferno, ainda para mais quando os novos valores me vão impedir de juntar dinheiro nos meses bons para sobreviver nos meses maus e para poder ter férias. Ou, noutro caso, se eu vender os direitos de autor num ano, no ano a seguir serei esmagado por contribuições. Ou se uma mulher parar para ter um filho após um ano bom...
Ainda para mais, a protecção extra que me dão em troca deste aumento já eu a tinha com os seguros profissionais obrigatórios, que foram ignorados neste código. Pior ainda, como recibo verde a trabalhar para mais de uma entidade, não posso descontar os valores pagos à segurança social em sede de IRS. Ou seja, vou pagar imposto sobre as contribuições, o que não sucede com os falsos recibos verdes (porque o fisco os engloba na categoria A) nem sucede com os outros trabalhadores que laboram sob a protecção de contratos de trabalho e com 14 meses de vencimentos por ano.
Só para avisar que essas
Só para avisar que essas contribuiçoes para a Seg Social estão erradas eu vou ficar a pagar mais 25 € que no ano passado...não conheço ninguem que fique a pagar 124,09 - 1º escalão....Atenção das duas ou uma, ou essa tabela está errada ou a Segurança Social está a colocar-nos a todos no 2º escalão (186,13E de contribuição)...Alguem me explica o que se está a PASSAR??
Será possivel que não se
Será possivel que não se possa fazer nd contra estas medidas?
trabalho numa empresa onde recebo aproximadamente o ordenado minimo e onde já me sao feitos os descontos para a segurança social.nessa mesma empresa faço 1 part time (recibos verdes)c valor aproximado d 250€mensais, qual nao foi a minha indignação este mês , em saber que não bebeficio da isençao da contribuiçao por a entidade patronal ser a mesma e o cúmulo dos cúmulos..dos míseros 250€ q recebi este mês, vou ter q pagar a segurança social 186€!! os meus ganhos vão ser de 65€
quem vai pagar a prestação da casa este mês???
ÃNGELA VIEIRA
Atenção que afinal fiquei a
Atenção que afinal fiquei a pagar o 1ºescalao e não o 2º ou seja, a Seg Social rectificou o meu valor que pago por MB no dia de hoje...10/02. Pois o pagamento das contribuiçoes passam a ser de 10 a 20 de cada mês!!!
Mas ninguem me informou de nada eu é q procurei os esclarecimentos...
Boa tarde,tive uma proposta
Boa tarde,tive uma proposta de trabalho para fazer um part time onde ganho 250 euros,mas tenho de passar recibo verde.
Tenho de pagar segurança social?
Espero respota.
Obrigada.
Cara Elsa, lamento a demora
Cara Elsa, lamento a demora na resposta.
A resposta à sua questão não é simples porque depende de várias variáveis como a duração da prestação de serviço, a existência de recibos verdes anteriores, actividade aberta ou não, se aberta, há quanto tempo, etc.
Se me permite, indico-lhe aqui um link para o site do movimento Precári@s Inflexíveis, onde encontra uma folha de cálculo que lhe permite ter a sua resposta, bem como ainda mais informação sobre este tema.
http://www.precariosinflexiveis.org/p/docs-incluindo-sobre-greve-geral.html
Espero ter ajudado.
Boa tarde, Poderá passar
Boa tarde,
Poderá passar apnas um unico recibo verde por ano (Acto único), sem que para isso seja necessário abrir a actividade ou pagar à segurança social. Terá posteriormente de apresentar o IRS no ano seguinte, Anexo B, referindo-se ao valor emitido nesse recibo.
Gabriela
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