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Morreu Alípio de Freitas

Jornalista, padre, guerrilheiro, brasileiro e português, fundador do Bloco de Esquerda, morreu esta terça-feira aos 88 anos, em Lisboa. O velório tem lugar hoje, terça-feira, a partir das 18h na Basílica da Estrela. O funeral será realizado esta quarta-feira, pelas 12h, em Alvito, no Alentejo. 
Alípio de Freitas.
Alípio de Freitas.

Nascido em Vinhais, Bragança, em 1929, a luta socialista marca toda a sua vida, seja como padre, seja como guerrilheiro no Brasil ou nos campos de treino de Cuba onde conheceu Fidel Castro. 

Ordenado padre em 1952, foi viver para junto dos pobres na Serra de Montesinho e, cinco anos depois, aceitou um convite do arcebispo de Maranhão para viver no Brasil. Num subúrbio de São Luís do Maranhão fundou uma paróquia, uma escola e, um posto médico. De início não celebrava missa e depois, quando o fez (em atenção ao arcebispo), celebrou-a em português, antecipando as orientações do Concílio Vaticano II.

Em 1962 foi a Moscovo, ao Congresso Mundial da Paz, onde privou com Pablo Neruda, a Pasionaria e Kruchtchev, donde regressou ao Brasil e rompeu com a hierarquia da Igreja. Apoiou a candidatura de Miguel Arraes ao governo de Pernambuco, o que lhe valeu ser raptado pelo exército e detido durante 40 dias. À saída naturalizou-se brasileiro, foi para o Rio de Janeiro, viveu nas favelas e ajudou a fundar as Ligas Camponesas, um movimento radical que, entre outras iniciativas, organizava ocupações de terras.

Na sequência do golpe militar de 1964, pediu asilo político no México; depois, recebeu treino político-militar em Cuba, regressando clandestinamente ao Brasil em 1966. A partir daí percorreu o país de ponta a ponta, promovendo o movimento camponês.

Em maio de 1970, quando era dirigente do Partido Revolucionário dos Trabalhadores, foi preso. Foi sujeito à tortura do sono durante 30 dias, simulação de afogamento e choques elétricos. Saiu da prisão em 1979, como apátrida. Logo depois, escreveu o livro Resistir é preciso..

Em 1981, foi viver para Moçambique, num projeto com camponeses, que foi visitado e elogiado por Samora Machel. O álbum de José Afonso, Com as Minhas Tamanquinhas, inclui uma canção-homenagem com o nome Alípio de Freitas. Carlos Amorim é autor do livro O assalto ao poder e a sombra da guerra civil no Brasil que aborda a resistência à ditadura militar e inclui a participação de Alípio de Freitas. Um dos comentários a esta notícia cita-o: "Trabalhadores, ontem vos ensinei a rezar e hoje aqui estou para ensiná-los a pegar em armas e lutar". Sem dúvida que era um homem corajoso e valente expressando-se desassombradamente, numa época em que todos tinham medo.

Ainda nos anos 1980, regressou a Portugal, entrando para a RTP, onde permaneceu até 1994, realizando, com Mário Zambujal, Carlos Pinto Coelho e José Nuno Martins, o programa Fim de Semana. Participou em vários movimentos sociais, nomeadamente o Tribunal Mundial sobre o Iraque e o Fórum Social Mundial. Foi também fundador do Bloco de Esquerda, em 1999, bem como de várias associações cívicas, tais como a Associação José Afonso e a Casa do Brasil de Lisboa.

Numa nota pública, a Casa do Brasil de Lisboa define Alípio de Freitas como uma "referência em Portugal (...) para a cidadania luos-brasileira e as grandes causas dos migrantes." E anunciam uma "homenagem realizada pela associação José Afonso no próximo sábado, 17 de junho no Fórum Roma." 

Em 1993, produz com Mário Lindolfo o documentário À Procura do Socialismo, sobre a história contemporânea de Portugal no período pós 25 de abril. O movimento operário e as ideias socialistas em Portugal, dos finais do século XIX aos anos do PREC (1974/75).

 

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