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Os guardiões

Contributo de Eduardo Velhinho

No debate em curso sobressai, entre outros, um tipo de discurso que se caracteriza pela defesa do status quo. E, inevitavelmente, este discurso provém dos que ou fazem parte da direcção ou estão situados no primeiro círculo. Este discurso não é mais do que um reflexo de auto-preservação.

Algumas das características discursivas dos defensores do status quo demonstram uma certa diabolização das posições políticas que se situam mais à sua esquerda sem no entanto tentarem criticá-las de modo sério, limitando-se à imprecação contra elas.

Os guardiões do status quo auto-elogiam-se, citam-se de forma circular, e não avançam um só milímetro a discussão. Faltando-lhes as ideias, limitam-se unicamente a salientar o trabalho realizado, acreditando que o BE pode voltar a explorar as «causas fracturantes», aquele tipo de trabalho parlamentar que fez a «idade de ouro» do partido no passado recente, explorando-o como se fosse um filão de ouro, até à última grama.

Eles pretendem que a solução para a presente «crise» passa pela extinção das actuais correntes políticas no interior do BE que, no entender deles, envenenam a vida ao partido. A chave do problema seria fazer das correntes que sustentam «Moção A», uma só corrente. Na realidade, é isso que se passa, praticamente desde do início, quando vem o tempo de uma convenção: elas convergem numa frente única para melhor fazer defrontar ao resto do partido. Mas, infelizmente para eles, a solução não é essa, porque a fusão dos grupos dirigentes não resistiria à prova do tempo, nem à dialéctica que anima a vida política e do partido: novas correntes/tendências se formariam e se cristalizariam porque a unanimidade em política é um mito e só existe nos contos de fadas elaborados pelos estalino-maoistas e sociais-democratas. O problema actual assenta no disfuncionamento dos organismos supostamente concebidos para fazer funcionar a democracia interna. Há demasiada verticalidade no relacionamento direcção / base e as decisões são cozinhadas no topo da pirâmide. É a ausência de debate democrático nas bases que perturba e afasta os aderentes e não o simples facto da existência de tendências. (Diga-se de passagem que estas não se diferenciam entre elas (apesar das velhas querelas ideológicas escondidas no sub-consciente dos ex-trotskistas do PSR e ex-maoistas da UDP que gera uma animosidade entre eles sempre bem dissimulada): poucos são os que dão por qualquer diferença, desde que estas duas forças, tal como os sociais democratas e eurocomunistas no passado, se tornaram cépticos quanto às possibilidades de derrubar o capitalismo.)

Porém, os aspectos que se prendem com a burocratização do partido são escamoteados pelos guardiões, como por exemplo o rotativismo no seio do BE no que diz respeito aos mandatos consecutivos para a Assembleia da República ; e poucos são os que se interrogam sobre a representatividade desses deputados (as) em relação às bases do partido.

Consideram que a honra do BE estará salva enquanto resistirem no parlamento a qualquer aliança com o PS ou a cedências políticas ao governo liberal, entretanto essa aparente independência política esconde o apoio do BE ao sistema de dominação capitalista pela via parlamentar quando os deputados (as) do Bloco apoiam medidas que se afastam dos objectivos de uma oposição socialista ao poder burguês e liberal, apoio que, queiramos ou não, fortifica o sistema que estamos supostos de combater ... pelo menos em teoria.

Pretendem fazer-nos crer que o futuro do BE está na sua transformação em alternativa ao PS e à sua direcção, quando na realidade a verdadeira função do BE seria de criar uma alternativa socialista ao capitalismo. De outro modo tanto as noções de «anticapitalismo» e de «socialismo», recurrentes no discurso bloquista, valem pela sua vacuidade.

Eduardo Velhinho

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