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O Fascismo é uma minhoca

Trump é a cereja no topo deste bolo desgraçado: Temer no Brasil, Erdogan na Turquia, Viktor Orban na Hungria… Todos eles trazem na bagagem a mesma ideologia reacionária de ódio contra a democracia, contra a igualdade, contra as mulheres, contra os imigrantes, contra a paz, contra a justiça.

Estou em estado de choque nesta manhã triste de 9 de novembro. Um daqueles dias em que não apetece acordar, em que se é obrigado a enfrentar uma realidade há muito prevista e pressentida e que, não surgindo do nada, mostra a sua amplitude e perigosidade de forma crua e brutal.

Se tivesse escrito este texto ontem, seria assim:

Hoje é o 8 de novembro, um dia há muito aguardado em que se joga um momento decisivo na história da Democracia. Em confronto, dois candidatos à presidência dos Estados Unidos, a grande potência mundial que, quer se queira quer não, detém o comando da paz ou da guerra, da riqueza ou da pobreza, da igualdade ou da desigualdade no mundo. Por isso, o mundo está suspenso dos votos que milhões de cidadãos e cidadãs americanos vão depositar nas urnas, mas cujos resultados vão ter impacto não só nos EUA, mas em todo o mundo. Independentemente da concordância ou identificação ideológica com os “programas” que são veiculados por uma campanha que se prolonga ao longo de meses até à náusea, e do facto de que as promessas nem sempre se virem a concretizar na realidade, a verdade é que um dos candidatos trouxe para a campanha o que de pior, mais obsceno, primário, agressivo, inqualificável é possível imaginar para quem se apresenta como candidato à Casa Branca. Toda a sua personalidade e ideologia racista, homofóbica, misógina, reacionária se apresentaram sem qualquer máscara, antes se lançaram ainda com mais ímpeto e despudor no confronto com a outra candidata – uma mulher – que poderá vir a ser a primeira mulher presidente dos Estados Unidos.

Trump é pois a cereja no topo deste bolo desgraçado que tem vindo a crescer, de líderes, governantes, candidatos a governantes que se vêm impondo e que estão a transformar o mundo num lugar perigoso para se viver. Muito perigoso! De onde a Democracia está a ser escorraçada. Como mancha de óleo, só nestes últimos tempos, Temer no Brasil, Erdogan na Turquia, Viktor Orban na Hungria… Todos eles trazem na bagagem a mesma ideologia reacionária de ódio contra a democracia, contra a igualdade, contra as mulheres, contra os imigrantes, contra a paz, contra a justiça. Aquilo que era há anos tido como impensável está a acontecer debaixo dos nossos olhos e a crescer e é isso que nos deve assustar e mobilizar para que se lhe ponha uma barreira. Amanhã será um novo dia e dos resultados das eleições decorrerá o curso da história para o povo americano e para os restantes povos do mundo. Desejo ardentemente que ganhe a candidata que se opôs à misoginia, ao ataque aos direitos dos imigrantes, das pessoas LGBT, do direito à saúde e que o povo americano tenha o discernimento para rejeitar não só a figura grotesca do candidato, mas, sobretudo, o conteúdo das suas frases soltas, desgarradas, mas repletas de ódio e de ideologia fascista.

Ganhando Hilary, os e as democratas não podem ficar descansados/as, porque os sinais de que a democracia está em perigo são mais que evidentes e preocupantes. A história das enormes conquistas nos direitos das mulheres, das pessoas LGBT e das minorias mostra um processo longo de resistência e persistência. E a história também nos tem ensinado que essas transformações que são em profundidade e que cavam na ideologia das classes dominantes precisam ser consolidadas e aprofundadas, pois estão mais sujeitas a ser destruídas se não forem cuidadas e assumidas como fazendo parte da essência e da estrutura dos povos.

Voltando ao princípio. Hoje, para nossa estupefação, acordámos com um mundo muito mais perigoso e feio. Só me vem à cabeça aquela canção do Sérgio Godinho

O fascismo é uma minhoca (não é? lá isso é)

que se infiltra na maçã (não é? lá isso é)

ou vem com botas cardadas

ou com pezinhos de lã!

A resposta dos e das democratas, depois deste abalo terá de ser a mobilização, a resistência. Não pode deixar de ser. Não há volta a dar.

Artigo publicado em acontradicao.wordpress.com

Sobre o/a autor(a)

Professora aposentada, feminista e sindicalista
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