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Nova lei contra trabalho forçado enfurece patronato

Diplomas do Bloco e do PS aprovados no Parlamento responsabilizam toda a cadeia de contratação. Patrões consideram que, com as novas regras, as empresas de trabalho temporário “ficam, na prática, proscritas”. CGTP congratula-se e acusa patrões de irresponsabilidade.
Foto de CGTP.

As quatro confederações patronais emitiram um comunicado em que “repudiam veementemente” os projetos de lei aprovados na quarta-feira com medidas de combate ao trabalho forçado.

A alteração à lei, que resulta de um projeto do Bloco de Esquerda apresentado em outubro e de um outro apresentado depois pelo Partido Socialista, passa a responsabilizar toda a cadeia de contratação pelas violações aos direitos dos trabalhadores, pelos créditos e encargos sociais do trabalhador, bem como pelo pagamento das respetivas coimas. Ou seja, numa obra, empresa ou exploração agrícola, a empresa que recorre ao trabalho temporário ou a angariadores de mão-de-obra não pode invocar que não tem responsabilidade ou alegar desconhecimento em relação ao que ali se passa.

Na discussão do projeto, em março, o CDS tinha votado contra e o PSD, que então se absteve, votou agora contra o diploma.

No comunicado conjunto da CAP, CCP, CIP e CTP, os representantes patronais alegam que “as alterações legislativas assim operadas incidem sobre diplomas negociados e consensualizados entre o anterior Governo do Partido Socialista e os Parceiros Sociais em sede de Comissão Permanente de Concertação Social”. Para as confederações patronais, “o Diploma não se limita a circunscrever a responsabilização àqueles que, por ação ou omissão, praticaram a ilegalidade, indo muito para além destes”, considerando que “as empresas de trabalho temporário, as agências privadas de colocação e os respetivos utilizadores ficam, na prática, proscritas, atento o enorme risco que passam a comportar”.

José Soeiro, deputado do Bloco que apresentou o projeto na Assembleia da República, considera que o comunicado das confederações patronais revela “o quanto os patrões portugueses se habituaram à impunidade que tem imperado nos últimos anos. A raiva das confederações patronais contra este mecanismo de responsabilização é bem expressiva de como estão viciadas na utilização de esquemas de subcontratação e no recurso ao trabalho temporário para degradar os direitos dos trabalhadores”.

José Soeiro lembra ainda que “o combate ao trabalho forçado é uma questão básica de Direitos Humanos e o projeto do Bloco segue aliás as disposições da Convenção da Organização Internacional de Trabalho, que o Estado português subscreveu, mas à qual ainda não tinha dado consequência do ponto de vista da lei”. Para o responsável bloquista, “o que se passa hoje, sobretudo em explorações agrícolas no sul do país, mas não só, é um atentado a direitos humanos e a lei que o Bloco propôs dá mais meios à Autoridade para as Condições de Trabalho para fazer valer os direitos de centenas de pessoas exploradas por esquemas mafiosos e em relação aos quais as empresas utilizadoras lavam as mãos”.

Também a CGTP veio esta quinta-feira congratular-se com a aprovação, na Assembleia da República, do diploma sobre o combate ao trabalho forçado e outras formas de exploração laboral e lamentou a posição patronal sobre a nova lei.

"Esta é uma medida que valorizamos, considerando que, face ao crescimento dos fenómenos de trabalho forçado e outras formas de exploração laboral, a responsabilização e penalização de toda a cadeia de contratação e subcontratação ao longo da qual se multiplica a exploração dos trabalhadores se apresenta como resposta importante no combate a tais fenómenos", afirmou a central sindical num comunicado.

A Intersindical considerou "lamentável que as confederações patronais se tenham manifestado de forma tão veemente contra a aprovação deste diploma, nomeadamente pondo em causa a competência legislativa da Assembleia da República".

Para a CGTP, "a fúria das confederações patronais só vem demonstrar que o patronato não está disposto a assumir quaisquer responsabilidade nem admite a existência de regras que penalizem condutas violadoras de direitos humanos".

Na exposição de motivos, o projeto do Bloco considerava que “os proprietários agrícolas e de grandes agroindústrias procuram esconder-se atrás de quem contrata os trabalhadores e não querem aceitar responsabilidades sobre as condições em que a mão-de-obra é trazida e trabalha. Se a penalização cai apenas sobre o angariador, apesar de ser o proprietário quem lucra no topo da cadeia, é muito difícil controlar o fenómeno”.

A responsabilização e penalização de toda a cadeia são essenciais no combate ao trabalho forçado e aos crimes de tráfico de seres humanos e escravatura. “Em casos extremos”, acusa o Bloco, “têm-se registado fenómenos de trabalho forçado, com retenção de documentos de identificação dos trabalhadores, circunstância que os coloca numa situação de total dependência, sem meios de subsistência, confrontados com dívidas abusivas de alojamento e transporte, num país cuja língua não dominam. “Este conjunto de fenómenos traduz-se em grosseiras violações dos direitos humanos e configura o crime de tráfico humano, ou seja, a escravatura em pleno século XXI”. 

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