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Uber: um problema dos taxistas? Não, um problema social!

O debate sobre o Uber é mais que um debate sobre uma atividade específica: é um debate sobre modelos de sociedade!

A polémica do serviço Uber e a posição dos taxistas tem motivado uma série de comentários por parte de um conjunto de "janotas enfatuados" da direita à esquerda.

As razões são simples: estes "janotas enfatuados", alinhando no discurso do ressentimento, vêm cantar hossanas e louvores ao Uber, desfiando o rosário de queixas sobre o serviço de táxi: da má apresentação e da falta de educação dos motoristas, à vetustez do parque de táxis, passando pelas maningâncias de alguns taxistas, alguns deles apanhados e condenados por especulação.

Quero, antes demais, dizer que muitas destas críticas têm razão de ser, pese embora ser injusto generalizá-las a toda uma classe. Conheço taxistas honestos, limpos, educados, diligentes e briosos quanto ao veículo que conduzem. A generalização que é feita tem tanta dignidade como a generalização rácica feita sobre os ciganos, a religiosa feita sobre muçulmanos ou a sexual feita sobre os homossexuais. É uma generalização indigna por quem a faz.

Acrescento ainda que o acesso à industria e profissão de taxista é uma atividade regulamentada e que faz todo o sentido sermos exigentes na regulamentação e no seu cumprimento.

O que repudio, com veemência, é a atitude mesquinha e imbecil daqueles que se atiram indiscriminadamente aos taxistas, generalizando comportamentos individuais.

Por outro lado, fico apreensivo com a argumentação expendida pelos "janotas enfatuados":

(i) Quanto aos "janotas enfatuados" mais à direita, esquecem-se que, na sua tese, o mercado deve operar em livre concorrência, pelo que a concorrência desleal deve ser combatida. Ora, como explicar, por parte da argumentação destes, a exigência de certificação profissional, as exigências regulamentares, fiscais e laborais que impendem sobre a atividade de táxi e que são dispensadas ao Uber? É este o conceito de livre concorrência que encerra a sua argumentação?

(ii) Quanto aos "janotas enfatuados" mais à esquerda, será que não percebem que o Uber é um hino à informalidade e precariedade laboral?

É claro que há outros "janotas enfatuados", mais à direita, que mesmo que na sua maioria não tenham ouvido falar de Hayek ou de Nozic, acreditam mesmo na barbárie da desregulação e do mercado. A esses perdoo e não os viso nesta crónica: são coerentes (pelo menos espero) e demasiado simplistas, a caminho da anarquia, num sentido que por vezes duvido que percebam.

Por isso, hoje estou com os industriais e profissionais dos táxis. Mas deixo o aviso: estou convosco com a intenção de exigir mais de vós. Porque o debate sobre o Uber é mais que um debate sobre uma atividade específica: é um debate sobre modelos de sociedade!

Sobre o/a autor(a)

Advogado, ex-vereador a deputado municipal em S. Pedro do Sul, mandatário da candidatura e candidato do Bloco de Esquerda à Assembleia Municipal de Lisboa nas autárquicas 2017. Escreve com a grafia anterior ao acordo ortográfico de 1990
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