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Banif: Onde é que já vimos isto?

Catarina Martins denunciou que o "Banif, o banco dos amigos da Madeira, ameaça agora arrombar as contas do país", nesta quarta-feira no debate parlamentar com o primeiro-ministro. A propósito do novo escândalo Banif, republicamos este artigo do esquerda.net de janeiro de 2013.
Horácio Roque, Cavaco Silva e Alberto João Jardim na conferência dos 15 anos do Banif em 2003. Foto Homem de Gouveia/Flickr

No debate parlamentar desta quarta-feira, 16 de dezembro de 2015, Catarina Martins, a propósito do Banif, perguntou ao primeiro-ministro, António Costa, quanto irá custar ao Estado “a irresponsabilidade da direita que escondeu informação e assegurou que a conta só viesse depois das eleições”. (ver notícia no esquerda.net)

Em 2013, salientávamos que as semelhanças entre o Banif e o BPN estavam à vista e apontávamos que o banco madeirense serviu de instrumento para financiar o regime de Jardim, enquanto acolhia ex-governantes do PSD, mas também do PS.

Neste artigo, divulga-se as ligações entre políticos e o banco. Agora, em dezembro de 2015, salientamos que, para além das relações descritas no artigo em 2013, é preciso acrescentar que no Conselho Estratégico do Banif encontra-se, desde 2012, o ex-eurodeputado Mário David, do PSD, que foi chefe de gabinete de Durão Barroso como presidente da Comissão Europeia e que é atualmente Vice-Presidente do Partido Popular Europeu (segundo a sua página pessoal: mariodavid.eu). Também desde 2012, está no mesmo conselho José Paulo Baptista Fontes, ex-deputado do PSD na Assembleia Legislativa da Madeira.

O Banco Internacional do Funchal foi salvo com dinheiros públicos, mas o Governo preferiu comunicar a decisão à Comissão de Mercado e Valores Mobiliários (CMVM) quando faltavam poucas horas para as primeiras badaladas do ano novo. Foi na tarde de 31 de dezembro que Vítor Gaspar notificou a CMVM que o Estado iria injetar 1.100 milhões de euros no capital do banco que é propriedade das herdeiras do milionário Horácio Roque, o fundador do banco falecido em 2010. A somar a isto, há mais 1.150 milhões em garantias estatais ao Banif, o que faz aumentar a fatura para os contribuintes para 2.250 milhões, em caso de incumprimento do banco.

Esta quinta-feira, os acionistas do Banif aprovaram o plano de recapitalização do banco agora liderado por Luís Amado e Jorge Tomé. O ex-ministro da Defesa e dos Negócios Estrangeiros de José Sócrates e o ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos foram os nomes que tiveram o aval do Banco de Portugal, quando uma das herdeiras de Horário Roque procurou a ajuda do Estado para salvar o banco, no meio de uma batalha pela posse da herança milionária.

Com esta operação, os atuais acionistas que levaram o banco à situação difícil em que se encontrava, recusam-se a entrar com mais de 100 milhões de euros no capital do seu próprio banco, deixando para os contribuintes a tarefa de limpar as "imparidades" nas contas do banco. O aumento de capital do Banif previsto para junho, no valor de 450 milhões de euros, deverá ser subscrito por outros bancos intervencionados pelo Estado, como o BCP e o BPI.

Banif: um banco de Jardim, mas não só

A história do Banif começa antes da sua fundação, com a Caixa Económica do Funchal, controlada por figuras próximas do independentismo da Flama e usada como instrumento do Governo Regional a seguir ao 25 de abril. A associação mutualista que controlava a Caixa viu-se obrigada a desfazer-se da instituição em meados da década de 90, arrasada por um passivo gigante e pelo crédito mal-parado. Os compradores foram Horário Roque e o amigo e sócio de negócios sul-africanos, Joe Berardo, mais tarde agraciados como Comendadores da República. Quem representou os associados na venda da Caixa aos novos investidores foi Abdool Vakil, o ex-presidente do Banco Efisa (do grupo BPN) que mais tarde sucederia a Oliveira e Costa à frente do BPN, quando este abdicou do cargo alegando problemas de saúde.

A seguir à compra, Horácio Roque viria em seguida a reforçar a sua presença no capital, adquirindo a posição de Berardo e partilhando a maioria das ações com a Auto-Industrial, uma empresa do ramo automóvel, no qual o banco se especializou nos primeiros anos.

Admirador confesso de Alberto João Jardim, Horácio Roque manteve o banco sempre na órbita do PSD/Madeira e muitos ainda se lembram do banco adiantar salários aos funcionários públicos madeirenses, quando os cofres de Jardim estavam vazios. E o dinheiro que pagou muitas despesas da máquina eleitoral do PSD/Madeira também circulou através do banco que conta nos seus órgãos sociais com figuras de topo do regime de Alberto João Jardim, incluindo dois nomes apontados à sua sucessão: Miguel de Sousa e Paulo Freitas, ambos ex-gvernantes regionais e atuais vice-presidentes do Parlamento madeirense. O primeiro preside à Assembleia Geral do banco e o segundo tem lugar no Conselho Superior Corporativo do Banif, o órgão que substituiu o Conselho Consultivo da instituição.

Também Tranquada Gomes, o deputado que foi o quarto candidato na lista do PSD nas últimas regionais, esteve mais de uma década no Conselho Fiscal e na Assembleia Geral do banco. O escritório de advogados que partilha com o também deputado laranja Coito Pita foi a morada registada como sede do banco Efisa no offshore da Madeira. O cargo de Tranquada Gomes na AG do Banif passou para outro companheiro de bancada, João da Silva Santos, que também é administrador da cimenteira da Região.

Mas o Banif também acolheu algumas figuras da política nacional nos seus órgãos, como Ângelo Correia. A sua Fomentinvest foi ainda parceira do banco em 2010, a trazer para Portugal o negócio da especulação no mercado de carbono, da compra e venda de créditos de poluição, nomeadamente com a russa Gazprom. Também António Nogueira Leite, coordenador da moção que levou Passos Coelho a ganhar o Congresso do PSD, sendo nomeado para a Caixa Geral de Depósitos a seguir às eleições legislativas, passou cinco anos no Conselho Consultivo do Banif. As ligações do banco a figuras do atual Governo também são visíveis no caso de Diogo da Silveira, um dos sócios de Carlos Moedas na Schilling Capital Partners, um fundo de especulação na bolsa e seguros, que pertence à administração do Banif desde 2007. 

Mais cavaquistas a dar cartas na banca

Já se sabia que os governos de Cavaco Silva deram a conhecer ao mundo pessoas com vontade de dar cartas na finança, como ficou à vista com o BPN, cujo buraco de 7 mil milhões de euros (na última avaliação) está a ser pago pelos contribuintes sem que se conheçam consequências para o património dos que ganharam com desfalques. Olhando para os atuais e antigos detentores de cargos no Banif, encontramos mais ex-governantes dos dez anos de cavaquismo.

Jorge Oliveira Godinho foi secretário de Estado das Pescas de Cavaco durante seis anos e a seguir passou uma década na administração da EDP até entrar em 2009 no Conselho Consultivo do Banif Investimento. Neto da Silva, que diz ser o fundador da Loja Mozart, o grupo maçónico que integrava o atual líder parlamentar laranja Luís Montenegro e outras figuras ligadas ao PSD, aos serviços secretos e à empresa Ongoing, ocupa hoje um lugar no Conselho Nacional do PSD, ao mesmo tempo que fiscaliza as contas do Banif como vogal do Conselho Fiscal. Foi secretário de Estado do Comércio Externo de Cavaco Silva. A lista de governantes de Cavaco no Banif fica completa com Manuel Carvalho Fernandes, que foi secretário de Estado do Tesouro e trabalhava de perto com Oliveira e Costa, seu colega responsável pelos assuntos fiscais. Carvalho Fernandes viria a demitir-se na sequência do escândalo da fracassada OPV de sete empresas da Sonae. Tanto ele como o seu ministro, Miguel Cadilhe, vinham do BPA, um dos grandes clientes da Sonae e o banco por trás da operação bolsista. Hoje é acionista de empresas do grupo Banif e administrador do banco.

O próprio Cavaco Silva também quis estar associado ao crescimento do Banif na última década. Em janeiro de 2003 participou na conferência que assinalava os 15 anos do banco, ao lado de Horácio Roque e Alberto João Jardim. E dois anos mais tarde, um mês antes de anunciar a sua candidatura às eleições presidenciais, o antigo primeiro-ministro deslocou-se a Londres para participar enquanto convidado de honra no jantar que assinalou a abertura de um escritório do Banif Investimentos. A notícia do jantar londrino, no qual Alberto João Jardim foi o grande ausente, ainda aparece no site do banco. "Segundo foi possível apurar, o presidente do Governo Regional foi convidado directamente por Horácio Roque - o presidente do Grupo BANIF - só que o facto de Jardim estar envolvido nas mais de sessenta inaugurações e igual número de festas partidárias impedem a sua saída da Região", relatava o Diário de Notícias da Madeira.

O perfume da rosa chega à Madeira

Ao contrário do BPN, os donos do Banif procuraram integrar todo o bloco central nos seus órgãos sociais, convidando ex-governantes do PS para cargos no banco. Muito antes de Luís Amado assumir a presidência do banco em tempo de crise, a Global Seguros - seguradora do grupo - contratou para seu administrador José Lamego, ex-secretário de Estado socialista, entre 2001 e 2005. Curiosamente, foi nesse intervalo de tempo que Lamego foi nomeado para ajudar a redigir a Constituição aprovada após a ocupação norte-americana no Iraque. Depois da experiência acumulada no Funchal e em Bagdade, Lamego transferiu-se para o grupo BPN, com um cargo no banco Efisa.

A Global Seguros foi a empresa escolhida para dar emprego a figuras de peso do PS como Vera Jardim, ex-ministro da Justiça e atual membro da Comissão Política socialista, que presidiu à AG da seguradora entre 2009 e 2010. O seu colega no governo de Guterres com a pasta da Defesa, Júlio Castro Caldas, fez parte do conselho geral e de supervisão da Global Seguros pelo menos entre 2007 e 2010.

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