André Ventura foi confrontado na quarta-feira com o caso do deputado do Chega que foi imigrante ilegal e por isso expulso de França por duas vezes, regressando sempre ilegalmente e só conseguindo a regularização graças ao governo socialista de François Mitterrand, tornando-se depois empresário naquele país. José Dias Fernandes acaba de ser eleito para o Parlamento, onde irá defender a proposta do Chega para que os imigrantes indocumentados sejam expulsos e impedidos de regressar durante cinco anos para voltarem a tentar a regularização.
Para responder à incoerência entre a proposta e o recém-eleito deputado, Ventura optou pela mentira: "É inacreditável! Imigrante ilegal... O José Dias fugiu à guerra, à ditadura, e foi para França. Estávamos nos anos 60, valha-me Deus!", respondeu o líder do Chega em tom indignado. A mentira de André Ventura voltou a ficar sem resposta ao longo da entrevista, mas bastava fazer as contas - ou citar as declarações do próprio José Dias Fernandes - para desmentir Ventura em direto.
Ventura volta a mentir: https://t.co/hLgWZQoVde (43:29). O novo deputado do CH, José Dias Fernandes, terá 64 anos: https://t.co/UWD9VbiWFT. Em 2022 disse q era 'emigrante há 46 anos' (desde 1976): https://t.co/8M2MCcWiNV. Significa q não fugiu à ditadura nem à guerra nos anos 60! pic.twitter.com/vFQE4r939m
— Luís Galrão (@LGalrao) March 22, 2024
José Dias Fernandes nasceu em maio de 1959, o que quer dizer que quando a ditadura foi derrubada, em abril de 1974, tinha apenas 14 anos. E segundo as palavras do próprio, em entrevista ao Lusojornal em 2022, preparava-se para completar 46 anos de emigrante. Ou seja, o agora deputado do Chega foi para França em 1976, quando já não havia ditadura nem guerra colonial, fazendo-o por motivos económicos e em busca de uma vida melhor, como fazem hoje os imigrantes que chegam a Portugal e enfrentam obstáculos à regularização. Justamente aqueles que o Chega propõe expulsar e impedir que regressem nos cinco anos seguintes.
José Dias Fernandes diz agora que não está contra a lei que o expulsou
Em declarações ao Jornal de Notícias, o recém-eleito deputado do Chega defende-se da polémica, procurando distinguir o seu caso de imigrante ilegal dos casos atuais. "Eu tive a infelicidade de não conseguir logo trabalho. Se fui expulso é porque a lei francesa, nessa altura, na sua legalidade, não me deixou ficar. Não estou contra, executou-se o que é a lei francesa”, diz José Dias Fernandes.
“Mas vim para cá trabalhar, não fui bater à porta da Segurança Social para me darem dinheiro para eu sobreviver, nem dormida. Tive que arranjar trabalho e criei empresas e riquezas, não só para a França mas também para Portugal”, justifica o deputado do Chega, ignorando o facto de os imigrantes que vieram trabalhar para Portugal terem deixando, segundo os números de 2022, um saldo positivo de 1.604 milhões de euros à Segurança Social. Isto corresponde a contribuições para a Segurança Social na ordem dos 1.861 milhões de euros, tendo apenas recebido prestações de perto de 257 milhões de euros. E que nesse ano por cada 100 imigrantes residentes havia 87 contribuintes para a Segurança Social, o que representa quase o dobro do rácio entre a população portuguesa, que era de 48 contribuintes por cem residentes.
José Dias Fernandes insiste ainda no refrão da extrema-direita de que o país precisa de “pessoas para trabalhar e que não venham para impor a sua cultura, a sua religião e costumes”. Mas este antigo imigrante ilegal que se tornou empresário da construção civil em França tornou-se um nome importante na comunidade emigrante em França não tanto pelo seu trabalho, mas devido à sua ação para difundir a cultura e costumes do pais de origem, sendo o fundador da associação "O Fiel Amigo do Bacalhau", que organiza grandes festas e convívios da comunidade portuguesa em muitas cidades francesas.
Quanto ao plano religioso, segundo o Lusojornal, apesar de ter escolhido como destino um país que faz da laicidade um dos seus valores fundamentais, José Dias Fernandes também é conhecido por financiar instituições católicas francesas, "nomeadamente a pintura interior da Igreja de Gentilly".