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Um reitor da Universidade de Coimbra entra num bar, mas era uma entrevista

Numa entrevista recente à Rádio Universidade de Coimbra (RUC), Amílcar Falcão, reitor da Universidade de Coimbra, expôs a sua falta de solidariedade, construindo uma muralha entre a instituição e quem dela pode beneficiar. Adiciona ainda, face a denúncias de assédio arquivadas pela UC, uma declaração machista, que vem a completar o seu perfil. É abril de 2022. Vive-se um aumento de preços a nível geral, e uma recusa do governo do Partido Socialista de os regular ou compensar nos salários. Aguenta-se a saída de um contexto pandémico global, que irá continuar a ser muito sentido nos próximos anos. Ao mesmo tempo, escuta-se Amílcar Falcão, que apesar de estar à frente de uma instituição pública, não se preocupa com o serviço público.
Vamos por partes. Segundo o reitor, “as cantinas não são para não estudantes, para isso há restaurantes na cidade. Nós não somos a Santa Casa da Misericórdia”. Algo que se tornou bem claro nos últimos anos, com a digitalização do sistema de pagamento, agora associado ao cartão da universidade. Se, por exemplo, nem as trabalhadoras e trabalhadores das limpezas e dos bares das faculdades têm direito à refeição a preço social, Amílcar Falcão deixa bem claro que as refeições da Universidade de Coimbra não devem servir a sociedade, num projeto solidário. Não é certamente uma questão de falta de recursos, é uma questão ideológica, basta perguntar quanto terá pago a Universidade de Coimbra por esta mudança do sistema de pagamento. Diz também: “Se o prato social não está em todas, está em quase todas as cantinas. Nas que não está é porque há uma cantina do outro lado da estrada.” A declaração demonstra uma incapacidade de perceber o problema. Se está em quase todas e não é suficiente, terão também os estudantes de optar pelos restaurantes na cidade?
A lista de declarações que chocam com uma ideia de universidade pública solidária não começa nem termina aqui. Ouve-se ainda, acerca das denúncias de assédio: “Neste momento só não denuncia quem não quiser. O que não se pode fazer é entrar em histerismo e denunciar numa atitude coletiva”. Amílcar Falcão, mais uma vez, dá a conhecer um componente da sua posição ideológica: o machismo. Uma declaração que começa com a culpabilização das vítimas de assédio face a quando nada é feito e que termina na caracterização da luta contra o assédio como exagerada. Se ao arquivo dos casos por falta de provas, o reitor responde com uma proposta de norma moral de que não se deve levantar ondas, não se reconhece uma universidade interessada em defender as vítimas de assédio.
Enquanto estudante da Universidade de Coimbra, preocupa-me que exista um reitor com um discurso tão despreocupado e sarcástico em relação às preocupações dos estudantes. Um reitor com projetos contrários aos de uma instituição pública solidária e feminista. Num momento em que a crise económica sem resposta está a levar a democracia por arrasto, e se procura uma alternativa capaz de resolver todos os problemas sistémicos, uma universidade que eu defendo não é a que falta às pessoas, sejam elas estudantes ou não.
A entrevista pode ser encontrada com uma pesquisa rápida nas páginas da RUC.
Artigo de Ernesto Oliveira, estudante na Universidade de Coimbra e aderente do Bloco de Esquerda
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