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Sindicatos contestam medidas de austeridade

CGTP e UGT manifestaram a sua oposição a mais austeridade para trabalhadores e reformados. Uma opinião partilhada pelas estruturas sindicais de médicos, enfermeiros, técnicos da Função Pública, magistrados e funcionários judiciais, que sublinham os efeitos negativos das medidas anunciadas por Passos Coelho.
Foto Paulete Matos

Arménio Carlos não tem dúvidas: o novo pacote de austeridade recai sobre "as vítimas de sempre: os reformados e os trabalhadores", mas "nunca abrange a despesa parasitária, nem prevê medidas de combate à fraude e evasão fiscal". Quando Passos Coelho fala em consenso com os parceiros sociais, o líder da CGTP responde de pronto: "O que o primeiro-ministro está a propor é que nos sentemos à mesa das negociações e aceitemos sem discussão as medidas que anunciou, mas não aceitaremos e vamos responder mobilizado os trabalhadores e pensionistas para a concentração de dia 25, em Belém, em defesa de eleições antecipadas". Para o dirigente da CGTP, as medidas anunciadas pelo Governo "não resolvem nenhum problema mas, pelo contrário, vão agravar os problemas económicos do país".

A agência Lusa ouviu a reação de outros dirigentes sindicais à comunicação de Passos Coelho, como o secretário-geral adjunto da UGT, Nobre dos Santos, que se diz "indignado" com as medidas do Governo. Para a UGT, as rescisões com 30 mil trabalhadores "deixarão a administração pública paralisada" e são por isso "inqualificáveis". O aumento do horário de trabalho e a limitação da mobilidade especial a 18 meses  também merecem repúdio da central sindical, "especialmente porque o Governo nunca cumpriu a parte dele relativamente à formação e à requalificação", sublinhou o sindicalista. Nobre dos Santos também criticou o Governo por não ter dito uma palavra sobre as suas intenções na reunião da Concertação Social na véspera deste anúncio, considerando essa atitude "uma falta de respeito e de ética com os parceiros sociais". A UGT diz ainda que o único objetivo do aumento da contribuição para a ADSE é mesmo o de "sacar dinheiro" aos trabalhadores.

STE: Governo corta a quem trabalha para apoiar o setor financeiro

Já o Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado (STE) fez as contas e concluiu que "enquanto a despesa com o pessoal da administração pública diminui 1.930 milhões de euros entre 2014 e 2017, a rubrica do consumo intermédio", que inclui as aquisições de bens e serviços e os encargos com as Parcerias Público-Privadas, "reduz-se apenas 39 milhões de euros neste período". Quanto aos juros da dívida pública, "vão continuar a ter um acréscimo significativo nos próximos anos, mais 883 milhões de euros em termos acumulados entre 2014 e 2017, com um peso de 4,4% do PIB entre 2012 e 2017, chegando neste último ano a pesar mais de metade da despesa com o pessoal, o que é exorbitante", diz o STE em comunicado. Entre 2011 e 2017, calcula o STE, o corte na despesa com pessoal na administração pública representará quase metade do corte total da despesa pública. 

"É imperioso evitar que as medidas de contenção orçamental sejam apenas direcionadas aos trabalhadores e pensionistas, que além de diminuírem o rendimento de muitas famílias, já de si fragilizado, provocam mais recessão económica. É a espiral recessiva que se instala, é o desastre", sublinha o STE, antes de apontar o dedo às derrapagens na despesa pública do ano passado, que "nada tiveram a ver com a despesa com o pessoal, mas sim com o setor financeiro, com destaque para o BPN". 

"Tsunami na Função Pública", dizem funcionários judiciais

Os dois pesos e duas medidas do Governo também foram apontados pelo presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SNMP), lamentando que o Governo penalize outra vez os que "já mais contribuíram" e mantenha "intocadas as escandalosas rendas do setor energético e as rendibilidades injustificadas das parcerias público-privadas". Rui Cardoso não viu nas palavras de Passos nenhuma "reforma do Estado", mas apenas uma "redução de custos" com contornos que "permanecem obscuros". O "brutal aumento" dos descontos para a ADSE suscita dúvidas ao SNMP e o argumento da igualdade entre público e privado faz Rui Cardoso concluir que se Passos Coelho for coerente terá de aumentar os salários dos magistrados e das profissões mais qualificadas da Função Pública.

Para o presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais (SFJ), as medidas anunciadas por Passos Coelho são "autêntico 'tsunami' na função pública", acabando com o "espírito, motivação, dedicação e empenho" dos trabalhadores do Estado. Em declarações à Lusa, Fernando Jorge afirmou que "as pessoas têm de abrir os olhos e passar a tratar o Estado como o Estado nos trata a nós, ou seja, sem nenhuma consideração" com um Governo que tem uma "atitude de desconsideração" para com os seus funcionários.

"Médicos vão ganhar menos trabalhando o mesmo"

“Estamos numa situação de perfeito terrorismo laboral e social”, disse Mário Jorge Neves, da Federação Nacional dos Médicos (FNAM), considerando que o alargamento do horário de trabalho na Função Pública é uma medida “altamente penalizadora e não vai resolver nenhum problema”. A lei aplicada aos médicos desde 2012 já prevê uma transição para as 40 horas de quem trabalhe 35 ou 42 e o dirigente sindical diz que são muitos os que têm tentado aderir ao novo regime, mas vêem os pedidos bloqueados por atraso das administrações. Por isso, "a maioria dos médicos ainda trabalha no regime das 35 horas semanais”, explica Mário Jorge Neves, prevendo que na prática todos irão trabalhar as 40 horas, mas apenas os que foram autorizados a entrar no novo regime é que irão receber o salário correspondente ao novo horário.

Para o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP), o aumento do horário de trabalho põe outra questão: “A Organização Internacional do Trabalho recomenda que o horário de trabalho dos enfermeiros seja de 35 horas semanais, precisamente para ser garantido o seu descanso físico e psicológico e para estes estarem preparados para prestarem cuidados de qualidade”, disse à Lusa Guadalupe Simões. A dirigente sindical recorda os casos dos enfermeiros com contrato individual de trabalho a trabalhar 40 horas, que estão a solicitar o regresso às 35 horas porque estão exaustos. “Essa possibilidade, e ainda por cima sem aumento da remuneração, é um caminho completamente contrário às exigências da função do enfermeiro”, diz Guadalupe Simões, prometendo "uma veemente contestação" dos enfermeiros às medidas anunciadas pelo Governo.

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