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Que futuro para o Bloco?

Contributo de Cláudia Ribeiro

Os resultados eleitorais da noite de 5 de Julho colocam o Bloco de Esquerda, os seus militantes e simpatizantes numa situação nunca antes vivida na curta história do Partido. A redução do número de deputados eleitos de 16 para 8 e a correspondente perda de cerca de 250 mil votos são factos incontornáveis que não podem, nem devem, ser analisados de ânimo leve. O Bloco foi, de longe, o maior derrotado deste acto eleitoral. No entanto, a análise feita aos resultados nas urnas devem ter em conta os resultados gerais e não apenas os do BE.

Mais à esquerda assistimos à consolidação da força da CDU. Ganharam um deputado e mantiveram os seus resultados ao nível daquilo a que já nos habituamos. É certo e sabido que a CDU sai de cada acto eleitoral como "eterno vencedor", ainda assim e neste caso específico, acabou mesmo por ser o maior vencedor à esquerda. Conseguiu recuperar o lugar de 4º partido mais representado no Parlamento e conseguiu deixar o BE para trás. E num contexto no qual a queda do PS levou ao seu pior resultado eleitoral nos últimos 20 anos, decerto que os comunistas se podem mostrar satisfeitos e animados para a legislatura que se aproxima.

O porquê da CDU ter alcançado este resultado e o decréscimo do BE comparativamente aos mesmos parece evidente. A carga histórica que se associa à CDU levou, ao longo destes anos, à construção de uma base mais ou menos sólida que permite que os seus resultados não oscilem de forma significativa, variando um ou dois pontos percentuais. A CDU tem, comparativamente ao BE, mais "liberdade" na sua acção política devido à sua base de apoio. O Bloco de Esquerda foi castigado por quatro situações: o apoio a Manuel Alegre, a moção de censura, a questão da renegociação da dívida e o "voto útil".

Primeiramente, e ainda que continue a acreditar que o apoio a Alegre estava certo, a Sociedade Portuguesa e certamente grande parte do eleitorado do BE, viu neste apoio uma colagem ao PS e a consequente renúncia àquilo que o Bloco tinha vindo a defender. Apesar de tal estar longe da verdade, o facto de Alegre aparecer como fiel seguidor de Sócrates nesta campanha, apenas prejudicou os bloquistas levando à construção da ideia errónea em relação àquela que é a posição do Bloco em relação ao PS. O apoio prestado nas Presidenciais não foi um apoio ao PS mas sim a Alegre. Relembro que o primeiro partido a anunciar publicamente o seu apoio ao socialista foi o BE, seguindo-se o PS numa tentativa desesperada de não perder um dos seus mais credíveis membros e não perder espaço de manobra para o Bloco.

Em segundo lugar, a moção de censura. O Bloco de Esquerda anunciou e apresentou no Parlamento uma moção de censura contra o Governo liderado por José Sócrates. Desde logo surgiram as vozes críticas da Direita, dos opinion makers e dos mercados financeiros, acusando publicamente o Partido de irresponsabilidade política. A estabilidade política deveria ser mantida sob quaisquer circunstâncias. O Bloco clarificou o porquê da apresentação deste documento: o desemprego, a situação dos precários, dos pensionistas, a falta de transparência de um Governo de boys, a crescente abnegação dos direitos dos trabalhadores, o ataque ao Estado Social... Apesar desta moção ter sido chumbada, as razões apresentadas por PSD e CDS/PP prendiam-se com a tão famosa estabilidade política. É irónico que a importância desta mesma estabilidade política tivesse desvanecido aquando da votação do PEC 4, com ambos os partidos a reprovarem o pacote. Mais uma vez a sede de poder se sobrepôs à coerência política e às vidas das pessoas. PSD e CDS/PP aprovavam ou não os PEC's de acordo com o que lhes pudesse dar mais espaço para chegar ao Governo. Ainda assim, e mais uma vez, o objectivo do Bloco ao propor a moção de censura parece não ter chegado aos eleitores.

Em terceiro lugar, a questão da renegociação. É certo que quando o Bloco de Esquerda trouxe à praça pública esta questão, muitas foram as figuras - grande parte delas distantes do Partido a nível ideológico - que vieram dar razão e apoiar esta medida. No entanto, há que perceber que toda a questão da intervenção externa e da problemática do FMI não está ao alcance da maioria dos portugueses. Aliás, as consequências directas do memorando da troika foram, até dois dias após as eleições, escondidas pelo Governo que receava as repercussões da propagação da verdade na opinião pública.

Por fim, a famigerada questão do voto útil. O apelo ao voto útil marca habitual presença nas campanhas eleitorais, com o PS e PSD a minimizarem a democracia com esta ideia falaciosa de que votar é apenas importante quando se alterna entre um e outro. Pois bem, neste caso específico, parece-me claro que, ainda que os resultados do PS tenham sido desastrosos, que o voto útil retirou votos ao BE e deu-os ao PS. Não pelas medidas do PS, mas sim por uma política de medo instalada entre os eleitores que, tendo que escolher entre o mais neoliberal PSD de todos os tempos personificado em Passos Coelho e o falso socialista Sócrates, preferiram o segundo - menos mal, pensavam eles.

Somando todos estes aspectos, e apesar do Bloco ter estado por todo o país com as mais variadas e dinâmicas iniciativas a explicar ao eleitorado as suas propostas, parece óbvio afirmar que a mensagem não foi propagada e não chegou aos eleitores. Parece-me urgente, numa nova fase de luta política, repensar a estratégia do Bloco de Esquerda. De que forma poderemos nós encarar esta nova realidade? Uma coisa é certa, Portugal e os portugueses estão prestes a sofrer o maior ataque que alguma vez sofremos na nossa História. Deixaremos de ter direitos e passaremos a ter todos ainda mais deveres em nome do "necessário sacrifício" de levantar a economia do nosso País. A ideia da inevitabilidade da entrada do FMI em Portugal continuará a ser veiculada pelo Centrão.

O Bloco de Esquerda está, novamente, sob ataque cerrado. É algo ao qual já nos habituamos e, certamente, que não seremos inibidos por isso. A Direita já exalta com a esperança desbaratada de que o Partido pode acabar, começando por tentar criar, ao nível da opinião pública, a ideia de que a Comissão Política e Francisco Louçã se devem demitir. A culpa não morre sozinha, no entanto não me parece que esta esteja exclusivamente ligada a esta CP. Por isso mesmo a solução não deverá passar por pedir cabeças mas sim por reflectir, propor, discutir e apresentar soluções para esta nova e difícil situação com que nos deparamos. A luta está aí, e cada vez mais exige que concentremos forças. Todos somos necessários para esta discussão, mesmo aqueles cujas opiniões soam a discórdia. Esta foi uma derrota clara mas não estamos vencidos. Chegou a hora de nos reagruparmos e partirmos para uma futura luta tão necessária como é aquela que defende os direitos e a vida dos portugueses. A Esquerda continuará em Bloco e quem nos quer destruir irá, certamente, ver as suas esperanças serem defraudadas.

Cláudia Ribeiro

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