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Protestos de Gorleben relançam incerteza sobre resíduos nucleares

Onde armazenar resíduos que mantêm uma actividade acima do nível da radioactividade natural durante mais de 600 mil anos?
Manifestação em Gorleben. Foto de gruenenrw, FlickR

Os recentes protestos contra o transporte de onze vagões de resíduos nucleares entre a unidade de tratamento de La Hague, em França e Gorleben na Alemanha, contribuiriam para reabrir o debate sobre o futuro dos resíduos radioactivos produzidos por centrais nucleares. Actualmente, os resíduos nucleares mais perigosos acumulam-se em piscinas de arrefecimento e hangares ventilados. Espera-se poder vitrificar os produtos de fissão não recicláveis em blocos que serão acondicionados em contentores de aço selados a serem posteriormente armazenados em galerias escavadas em extractos subterrâneos de granito, argila ou sal situados a mais de 500 metros de profundidade. Este tipo de resíduos mantém uma actividade acima do nível da radioactividade natural durante mais de 600 mil anos.

O governo alemão tencionava construir um depósito com custos da ordem de milhares de milhões de euros para os seus resíduos mais perigosos numa mina de sal em Gorleben, onde ocorreram alguns dos recentes protestos. No entanto, a 15 de Janeiro deste ano foram evacuados 126 mil barris de resíduos nucleares de perigosidade mediana, que tinham sido colocados em 1967 numa mina de sal de Asse, depois de terem sido detectadas numerosas fugas de água contaminada. Klaus-Jürgen Roehlig, perito em gestão de resíduos da Universidade de Clausthal, declarou que este incidente “coloca em causa a escolha de minas de sal para armazenar os resíduos nucleares mais perigosos”.

Recentemente, os EUA decidiram suspender o armazenamento de resíduos nucleares no fundo da única mina que estava prevista para o efeito, na Montanha Yucca no Nevada, depois de terem sido gastos mais de 10 mil milhões de dólares no projecto. Por ordem do presidente Obama foi criada uma comissão de peritos para encontrar nova solução para os resíduos nucleares. Estão em cima da mesa soluções de depósito em furos de grande profundidade no fundo dos oceanos, no interior dos glaciares do Pólo Sul e soluções mais exóticas como a ejecção dos resíduos para o espaço.

Entre os países com programas nucleares civis, apenas a França, a Suécia e Finlândia possuem programas em marcha para guardar os resíduos em galerias subterrâneas de grande profundidade.

Custos infindáveis

Outra vertente dos protestos dos manifestantes franco-alemães que convém realçar é a questão dos custos infindáveis da energia nuclear. Desde que foram lançados os primeiros programas nucleares civis nos anos 50 – muitos destes programas resultaram de programas militares extremamente caros – nunca foram guardados definitivamente em algum lugar da Terra os resíduos nucleares mais perigosos, nocivos durante mais de 600 mil anos. Desde então, as parcelas para a factura real dos custos da energia nuclear não têm parado de aumentar e continuarão a aumentar durante mais 600 mil anos, se não se encontrar entretanto uma nova técnica para encurtar o período de perigosidade dos produtos de fissão. Até esse dia, não podemos estimar com precisão e honestidade quais os verdadeiros custos de 1 kWh produzido por uma central nuclear.

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Sobre o/a autor(a)

Investigador no Departamento de Física da Universidade de Coimbra
Termos relacionados Energia nuclear, Ambiente
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