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"Precisamos de uma Câmara amiga das pessoas e não dos especuladores"

Entrevista com Ricardo Robles, candidato do Bloco de Esquerda à presidência da Câmara de Lisboa e atual líder da bancada bloquista na Assembleia Municipal.
Ricardo Robles – Foto de Paulete Matos
Ricardo Robles – Foto de Paulete Matos

Ricardo Robles, 39 anos, engenheiro civil, atual líder da bancada parlamentar do Bloco de Esquerda na Assembleia Municipal de Lisboa é o candidato do Bloco de Esquerda à presidência da Câmara Municipal de Lisboa.

Quais são as prioridades da candidatura do Bloco?

Queremos democratizar Lisboa. A cidade tem que ser partilhada com todos. O executivo municipal do PS tem levado o concelho para um rumo errado, que urge corrigir, principalmente em áreas vitais como a habitação, o urbanismo, a precariedade laboral, os transportes públicos e as desigualdades sociais. Essas são as prioridades e é aqui que os vereadores do Bloco vão fazer a diferença. Lisboa está a transformar-se num clube de elite, ao qual a maioria dos cidadãos não pode aceder. Conscientes da dimensão deste desafio, vamos apresentar um programa coerente de governação da cidade para responder aos problemas e expectativas dos lisboetas.

A habitação é uma preocupação crescente de quem vive ou quer viver em Lisboa. O Bloco vai apresentar propostas concretas nesta área?

Queremos democratizar Lisboa. A cidade tem que ser partilhada com todos

Lisboa perdeu centenas de milhares de habitantes nas últimas décadas. Fernando Medina, ao apostar numa política de reabilitação urbana orientada para os investidores e para o turismo, agravou essa tendência. Uma cidade como Lisboa não se pode reduzir a uma montra para turistas que expulsa os habitantes. Não é possível repovoar o centro de Lisboa quando a esmagadora maioria das intervenções de reabilitação urbana é para hotéis de luxo ou premeia a especulação imobiliária, o que agrava o valor das rendas. Há muitos anos que apresentamos uma proposta que faria toda a diferença: uma quota de 25% de fogos com rendas a custos controlados em todos os edifícios reabilitados e novas construções. Ainda não é demasiado tarde para a Câmara aprender com os erros cometidos noutras cidades que sofreram os efeitos da pressão turística, como Barcelona.

Lisboa perdeu centenas de milhares de habitantes nas últimas décadas. Fernando Medina, ao apostar numa política de reabilitação urbana orientada para os investidores e para o turismo, agravou essa tendência

É preciso sublinhar também que a Câmara Municipal de Lisboa é o principal senhorio da cidade, o que - querendo - lhe permite intervir direta e eficazmente no mercado de habitação. Fernando Medina tem atuado precisamente no sentido oposto. Nos últimos quatro anos desbaratou-se ainda mais o património municipal. Foram vendidos mais de 200 milhões de euros de imóveis. Um erro enorme no qual Fernando Medina pretende insistir. O património da Câmara deve ser preservado, reabilitado e utilizado como instrumento de políticas de habitação.

O meu ponto é este, a Câmara Municipal de Lisboa tem mecanismos e ferramentas suficientes para criar milhares de rendas acessíveis a todos e promover a redução da renda média praticada no setor privado. Mas, para isso precisamos de uma Câmara Municipal de Lisboa amiga das pessoas e não dos especuladores. É a diferença que queremos fazer com esta candidatura.

Falavas da desigualdade social, como é que olhas para o fenómeno da pobreza na cidade de Lisboa?

O acordo parlamentar à esquerda permitiu um estancamento da austeridade e uma política orientada para a devolução dos rendimentos que também se fez sentir positivamente em Lisboa. Mas há demasiados efeitos que se mantêm. A nível municipal, muito pouco foi feito. Não é por acaso que o último relatório da Rede Social de Lisboa identifica a pobreza como um dos problemas fundamentais a ser resolvidos. O concelho continua órfão de uma política municipal decente de combate à pobreza e às desigualdades sociais. Por exemplo, as organizações que trabalham com sem-abrigo dizem-nos que nos últimos meses houve um acréscimo de 10% desta população. Propusemos a criação de um gabinete de resposta à crise, que a maioria PS ignorou. Há um fundo de emergência social da autarquia, mas é insuficiente - são 2 milhões de euros, menos que a isenção de taxas do Rock in Rio - e a sua capacidade de concretização é de 50%. É inaceitável.

A precariedade continua a ser um problema no município?

Ricardo Robles – Foto de Paulete Matos
Ricardo Robles – Foto de Paulete Matos

O combate à precariedade é uma bandeira nossa de sempre. É um dos temas em que o Bloco mais insiste e que mais nos distancia do executivo de Fernando Medina. Veja-se só que, durante este mandato, o município recorreu a formas de trabalho só comparáveis à escravatura moderna, como é o caso dos Contratos de Emprego Inserção (CEI). Isso é inaceitável. Estes trabalhadores foram recrutados à força, nos Centros de Emprego, trabalharam por 83 euros mensais, assumindo as mesmas funções que os outros trabalhadores, com horário e hierarquia definidos.

O acordo parlamentar à esquerda permitiu um estancamento da austeridade e uma política orientada para a devolução dos rendimentos que também se fez sentir positivamente em Lisboa. Mas há demasiados efeitos que se mantêm. A nível municipal, muito pouco foi feito

Há vários equipamentos municipais que recorrem a trabalho precário e a falsos recibos verdes, como não nos temos cansado de denunciar. Somos muito claros e firmes nesta questão. Connosco o município de Lisboa será uma zona de precariedade zero. Não só a Câmara Municipal de Lisboa tem que deixar de recorrer a qualquer forma de trabalho precário - nas suas várias dimensões - como tem de exigir que em nenhum dos seus equipamentos e serviços possa existir trabalho precário ou baixos salários. Para além do que hoje já é exigido, quem depender e trabalhar com a autarquia terá que passar a dar garantias de que não recorre a trabalho precário. Também é dando o exemplo que se promove a mudança. A Câmara Municipal de Lisboa tem que ser um agente de combate à precariedade.

Por último, o que é um bom resultado eleitoral para o Bloco?

Temos um projeto para o município de Lisboa, que tem como eixo central o direito à cidade. Por isso é que falava em partilhar Lisboa com toda a gente. Ou seja, todos os lisboetas, independentemente da sua condição económica, devem poder usufruir da cidade na sua totalidade. Para pôr esta alternativa em prática, o Bloco precisa de aumentar a sua representação nos nas freguesias e na Assembleia Municipal. Mas é na vereação que a presença do Bloco pode desequilibrar a relação de forças no executivo a favor dos lisboetas em vez dos especuladores. Vamos lutar por isso.

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