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"Para responder a esta pandemia, o governo não precisa de se proteger dos direitos dos trabalhadores"

No debate sobre a renovação do estado de emergência, Catarina Martins desafiou o governo a encontrar formas alternativas para ouvir os sindicatos sobre alterações às normas laborais. E defendeu que ele deve ser usado para requisitar meios e profissionais ao setor privado, impedir despedimentos e controlar preços.
Catarina Martins
Catarina Martins no debate desta quinta-feira. Imagem ARTV.

No debate desta quinta-feira no Parlamento, a coordenadora do Bloco de Esquerda começou por alertar para a necessidade de  medidas para conter o avanço da pandemia do novo coronavírus. “Se deixarmos a doença seguir o seu curso natural, não só o Serviço Nacional de Saúde será incapaz de tratar todos os infetados de Covid19, como pode colapsar, afetando toda a população. Um cenário de catástrofe que, mais do que sanitária ou económica, seria humanitária”, alertou.

Catarina Martins reconheceu que as medidas tomadas anteriormente estão a ter resultado, mas a curva continua a aumentar, e o risco de colapso do SNS é real. Evitar essa situação “significa, desde logo, proteger os profissionais de saúde e dotar o SNS de todos os meios necessários para responder à pandemia.” Esta foi a primeira razão apontada para concordar com a prorrogação do Estado de Emergência por mais duas semanas.

Para a coordenadora bloquista, o governo deve usar os poderes que lhe são conferidos pelo Estado de Emergência para avançar com a requisição de meios e profissionais, "sejam hospitais privados, laboratórios e testes de diagnóstico, capacidade de produção ou stocks de máscaras e equipamentos de proteção individual", para proteger não só os profissionais de saúde, mas "todos os outros que estão na primeira linha da resposta sanitária".

No entanto, a referência no decreto à limitação do direito à greve e à resistência, bem como a suspensão da obrigação constitucional de ouvir sindicatos sobre alterações às normas laborais, continua a merecer crítica do Bloco de Esquerda. "Para responder a esta pandemia, o governo não precisa de se proteger dos direitos dos trabalhadores. Precisa sim de proteger quem trabalha", afirmou Catarina, desafiando o governo a encontrar "um modelo expedito para manter esta auscultação essencial à democracia e ao acerto das medidas" no plano laboral.

Porque a resposta a esta crise não é só sanitária, mas também económica e social, Catarina defendeu a necessidade de garantir que todas as empresas cumprem as normas de saúde e segurança, e acima de tudo, proteger os direitos dos trabalhadores, intervindo para conter a vaga de despedimentos que já está a fazer milhares de vítimas, a começar pelos precários de todos os setores. E sublinhou ainda a necessidade de chamar a banca e as grandes empresas à sua responsabilidade, proibindo a distribuição de dividendos.

Leia aqui a intervenção de Catarina Martins:

 

O primeiro desafio na resposta à pandemia de Covid19 é a preservação dos cuidados de saúde, face uma doença muito contagiosa, para a qual não há vacina e que exige tratamento intensivo para uma parte pequena, mas significativa, dos infetados.

Se deixarmos a doença seguir o seu curso natural, não só o Serviço Nacional de Saúde será incapaz de tratar todos os infetados de Covid19, como pode colapsar  e afetando toda a população. Um cenário de catástrofe que, mais do que sanitária ou económica, seria humanitária.

É para impedir essa catástrofe que temos de agir. As medidas de limitação de circulação  e de afastamento físico parecem estar a resultar. O crescimento da curva do número de infetados com Covid19 abrandou, o que é uma boa notícia. Mas continua a aumentar e o perigo de ruptura nos cuidados de saúde não está afastado. É muito real. Evitá-lo significa, desde logo, proteger os profissionais de saúde e dotar o SNS de todos os meios necessários para responder à pandemia.

Sabemos que os profissionais de saúde, todos eles, têm sido incansáveis. Conhecemos os esforços de tantos trabalhadores que tudo têm feito para salvar vidas. Temos de os apoiar também.

Essa é a primeira razão para ser necessário o Estado de Emergência e pela qual concordamos com a sua prorrogação durante mais duas semanas. Avizinha-se o período da Páscoa, tipicamente marcado por celebrações religiosas, reuniões familiares e viagens turísticas que terão, infelizmente, de ser travadas. 

Mas a resposta à pandemia não é apenas sanitária. É também, e não menos importante, económica e social.

O governo deve usar os poderes que lhe são conferidos pelo Estado de Emergência para a requisição dos equipamentos, instalações e profissionais necessários para responder à crise. Sejam hospitais privados, laboratórios e testes de diagnóstico, capacidade de produção ou stocks de máscaras e equipamentos de proteção individual, que tanta falta fazem a profissionais de saúde, forças de segurança, trabalhadores dos lares, dos resíduos e da limpeza e todos os outros que estão na primeira linha da resposta sanitária.

O governo deve ainda garantir que todas as empresas cumprem as normas de saúde e segurança. Trabalhadores de grupos de risco devem ser dispensados de trabalhar. Se o teletrabalho é obrigatório em todas as funções compatíveis, não pode haver empresas que continuem a recusá-lo.

Este decreto explicita a capacidade do governo de intervir na iniciativa económica privada para impedir despedimentos e controlar preços. É urgente que tal aconteça. Foi feito noutros países e deve ser feito aqui, para conter a vaga de despedimentos que já está a fazer milhares de vítimas, a começar pelos precários de todos os sectores.

Proteger emprego e salário, combater especulação de preços, reduzir ou suspender o pagamento de bens e serviços fundamentais – eis a resposta de emergência para o momento que vivemos.

Chamar a banca e as grandes empresas, desde logo as energéticas, à sua responsabilidade. E proibir a distribuição de dividendos.

Compreendemos que os prazos legais de consulta aos sindicatos e organizações patronais sejam incompatíveis com a celeridade de medidas a que este período obriga. Mas a solução não tem de ser suspender em absoluto a obrigação constitucional de ouvir os representantes dos trabalhadores sobre normas laborais. O governo deve encontrar um modelo expedito para manter esta auscultação essencial à democracia e ao acerto das medidas.

A experiência dos últimos 15 dias reforça ainda a nossa convicção de que as referências ao direito à greve e ao direito à resistência, não acrescentando nada aos poderes constitucionais do governo face a uma calamidade, não deviam constar do decreto.

Para responder a esta pandemia, o governo não precisa de se proteger dos direitos dos trabalhadores. Precisa sim de proteger quem trabalha reforçando direitos, precisa de proteger o emprego, a saúde, os rendimentos e as condições de segurança no exercício de todas as atividades que continuam.

É para isso que servem as responsabilidades reforçadas que aqui estão vertidas.

Para proteger os profissionais de saúde e todos os cuidadores e cuidadoras que apoiam quem está mais vulnerável. Para proteger forças de segurança e bombeiros, os trabalhadores que asseguram que os bens e serviços fundamentais não faltam ao país.

E para proteger os que, ficando em casa, estão também a fazer a sua parte e esperam de nós que façamos a nossa.

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