ONU "horrorizada" com operação militar israelita no hospital Al-Shifa

15 de novembro 2023 - 14:33

Subsecretário-geral da ONU para Assuntos Humanitários frisou que “hospitais não são campos de batalha". Diretor da Organização Mundial da Saúde e Comité Internacional da Cruz Vermelha também denunciaram impacto para pacientes, profissionais da saúde e civis.

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Exterior do Hospital Al-Shifa. Imagem da Al Jazeera.

O exército israelita entrou esta quarta-feira no hospital de Al-Shifa, alegando que está a promover uma operação seletiva contra um posto de comando do Hamas escondido no complexo hospitalar.

Em declarações por telefone à Associated Press, o diretor dos hospitais em Gaza, Mohammed Zaqout, descreveu uma situação "aterradora" no hospital Al-Shifa: “As forças de ocupação invadiram os edifícios (…) É uma situação aterradora … Não podemos fazer nada pelos doentes sem ser rezar”.

Um jornalista que está dentro do hospital Al-Shifa relatou ao jornalista da BBC Rushdi Abu Alouf que os soldados entraram nos quartos de todos os andares e interrogaram médicos e doentes. Foram ainda utilizados altifalantes para ordenar que todos os homens com idades entre 16 e 40 anos, com exceção daqueles que se encontram na ala de cirurgia e emergência, se dirigissem para o pátio do hospital. Existem relatos de tiros e fumo dentro do hospital.

Martin Griffiths, diretor do Gabinete das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), afirmou que está "horrorizado" com as informações sobre a operação militar no interior do hospital Al-Shifa.

"A proteção dos recém-nascidos, pacientes, profissionais da saúde e de todos os civis deve ter precedência sobre todas as outras questões. Os hospitais não são campos de batalha", escreveu na rede social X.

Também a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Comité Internacional da Cruz Vermelha expressaram a sua preocupação face ao ataque israelita ao hospital Al-Shifa.

O diretor da OMS frisa que as informações sobre a incursão militar no maior hospital de Gaza são "preocupantes". Tedros Adhanom Ghebreyesus alerta ainda que perdeu o contacto com a equipa médica.

Em comunicado, o Comité Internacional da Cruz Vermelha afirma estar “extremamente preocupado com o impacto para os pacientes e feridos, profissionais da saúde e civis".

Entretanto, as operadoras Paltel e Jawwal informaram que os seus centros de dados na Faixa de Gaza estão, progressivamente, a parar as suas atividades face à falta de combustível. E advertiram para a possibilidade para um “blackout total de comunicações” nas próximas horas no território.

UNICEF: “É preciso ‘deter este horror’”

Durante uma visita ao enclave, a chefe do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) denunciou que “crianças foram mortas, mutiladas, raptadas e foi-lhes negada assistência em Gaza”. Catherine Russell enfatizou que é preciso “deter este horror”.

“Dentro da Faixa, não há lugar seguro para onde um milhão de crianças de Gaza possam recorrer”, referiu, destacando que mais de 4.600 crianças foram mortas e quase 9.000 feridas. A UNICEF avança que muitas crianças ainda estarão enterradas sob os escombros de edifícios desabados, “o resultado trágico do uso de armas explosivas em áreas povoadas”.

A representante da UNICEF afirmou ter ouvido histórias angustiantes do pessoal da sua agência no terreno e sublinhou o elevado risco para os intervenientes humanitários que operam dentro de Gaza. Russell reiterou os apelos a um “cessar-fogo humanitário imediato”, à libertação de todas as crianças raptadas e detidas e a um “acesso seguro, sustentado e desimpedido” dos humanitários às pessoas necessitadas.

Martin Griffiths disse ao UN News que, de uma perspetiva humanitária e fora de quaisquer considerações militares, “o nosso problema é proteger o povo de Gaza”. O diretor da OCHA sublinhou que os habitantes de Gaza estão numa “situação horrível, em que não têm escapatória e são obrigados a deslocar-se em condições de perigo”.

“Ser funcionário da ONU já não é garantia de segurança”

Em declarações à agência Lusa, o subsecretário-geral da ONU Jorge Moreira da Silva afirmou que que a escalada da violência em Gaza colocou as Nações Unidas numa posição “nunca vista”, na medida em que, “habitualmente, considerava-se que ser funcionário das Nações Unidas era uma garantia de segurança”.

“Nunca tantos funcionários das Nações Unidas morreram. Hoje, estar em infraestruturas das Nações Unidas não significa ter qualquer tipo de proteção adicional. Normalmente, infraestruturas das Nações Unidas não eram atacadas, as pessoas que estavam em infraestruturas das Nações Unidas não eram atacadas. Ora, hoje, quer os funcionários da ONU, quer as pessoas que estão alojadas em infraestruturas da ONU, estão sob exatamente os mesmos riscos que o resto da população em Gaza e portanto, isso sim é algo novo que nunca tínhamos visto”, continuou.

O subsecretário-geral da ONU considerou “injustos” os ataques do governo israelita a António Guterres. Jorge Moreira da Silva lembrou que tem havido, por parte da ONU, “uma fortíssima condenação aos ataques perpetrados pelo Hamas, ataques hediondos, horrendos, que não têm perdão e, portanto, uma condenação cabal” dos mesmos. E que a agência tem exigido a “libertação sem qualquer tipo de condição dos reféns israelitas”.

No entanto, a ONU não pode deixar de reiterar que “os palestinianos não podem sofrer uma punição coletiva pelos crimes perpetrados pelo Hamas, porque não faz qualquer sentido confundir os civis palestinianos com o Hamas”. Bem como que “até as guerras têm regras e que infraestruturas civis não podem ser atacadas, os civis não podem ser atacados e a ajuda humanitária tem que poder chegar em condições de segurança a todos os cidadãos mais necessitados”.