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Oncologistas apelam a criação de 'via verde' no tratamento do cancro

Sociedade Portuguesa de Oncologia alerta para a quebra de 60 a 80% dos novos diagnósticos de cancro e para a redução acentuada do número de primeiras consultas. Profissionais pedem também a libertação dos médicos de família no acompanhamento da covid-19.
A directora do serviço de oncologia do Hospital de Santarém, Sandra Bento, conversa com utentes do serviço oncológico durante uma sessão de tratamento. Foto de António Cotrim, Lusa.

"Os médicos de família devem ser libertados desse trabalho ligado à covid-19 para os centros de saúde para fazerem as consultas aos seus doentes. Depois, no caso dos doentes oncológicos, devia haver nos hospitais a 'via verde' oncológica", defendeu a presidente da Sociedade Portuguesa de Oncologia (SPO), Ana Raimundo.

De acordo com os números recolhidos através de um inquérito promovido pela SPO aos serviços de oncologia médica de todo o país, entre março e abril registou-se uma quebra de 60 a 80 por cento dos novos diagnósticos de cancro.

"Estes diagnósticos que não são feitos em tempo útil serão feitos mais tarde e em fase mais avançada de doença, portanto, com menor potencial de cura e tratamentos mais complicados. Podemos prever que, sendo estes tumores diagnosticados em fases mais avançadas, vá haver dentro de três, quatro ou cinco anos um aumento da taxa de mortalidade por cancro", explicou Ana Raimundo em declarações à agência Lusa.

A responsável da SPO alerta para a situação "a montante dos hospitais". Tendo em conta que muitos dos diagnósticos eram feitos pelos médicos de família nos centros de saúde, Ana Raimundo considera que estes profissionais devem deixar de ser "desviados para os serviços covid". "Não estão nos centros de saúde, não fazem as consultas, nos doentes com suspeita de diagnóstico não são pedidos os meios complementares e, portanto, não é feito o diagnóstico", apontou.

No seu entender, deveria também ser criada uma 'via verde' para o cancro que permita agilizar o tratamento dos doentes. A SPO aposta ainda na teleconsulta para manter o acompanhamento dos doentes oncológicos.

“No caso de oncologia, considerada uma doença crónica e em que, normalmente, o médico assistente já conhece o doente, as teleconsultas funcionam bastante bem. O ‘feedback’ foi muito positivo por parte dos doentes, que se sentiram seguros pelo facto de não terem de se deslocar ao hospital, e pelos próprios profissionais, que conseguem fazer uma avaliação do estado do doente de forma eficaz”, assinalou Ana Raimundo.

A presidente da SPO deu ainda destaque à importância da estabilidade ao nível dos recursos humanos destes serviços. “Provavelmente, serão dos últimos elementos médicos a serem recrutados, devido às características dos doentes que seguem, e serão recrutados já numa situação extrema, em que já foram todos os outros profissionais recrutados, porque a taxa de mortalidade por cancro é superior à taxa de mortalidade por covid-19”, avançou.

Sobre o aumento da mortalidade extra-covid, Ana Raimundo referiu que “esse aumento da taxa de mortalidade tem sobretudo a ver com a falta de seguimento e controlo das doenças crónicas, como as doenças cardiovasculares, a diabetes ou as doenças respiratórias crónicas”. “São doentes que deixaram de ter um seguimento e apoio em tempo útil e também doentes que adiaram a sua ida ao médico e aos hospitais com medo”, vincou.

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