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“O efeito Tsipras” dá asas à esquerda da esquerda europeia

A cena passa-se em abril, na cidade italiana de Palermo. Uma multidão compacta apressa-se para cumprimentar e tocar no “amigo Alexis”, trocar três palavras de força ou dar-lhe um abraço fraterno. O líder da oposição grega, Alexis Tsipras, apesar de estar visivelmente cansado após a semana de tournée pela Europa, está pronto e disposto a distribuir sorrisos, apertos de mão, e entusiasmado com o fervor que tem sentido por toda a Europa. “Em todas as cidades onde vou sou recebido como se fosse uma estrela de futebol”, diz Tsipras. Anda num turbilhão desde que o Partido da Esquerda Europeia (PEE) decidiu lançá-lo como o seu candidato à presidência da Comissão Europeia.
Em Palermo, Alexis Tsipras veio por um par de horas dar apoio à candidatura “L’Altra Europa con Tsipras” (A outra europa com Tsipras). Uma iniciativa da esquerda radical italiana que, carregando Alexis Tsipras como o rosto da candidatura, ensaia uma tentativa de superar as divisões internas.
Ainda há dois anos desconhecido fora da Grécia, Alexis Tsipras chegou à primeira página dos jornais em todo o mundo e concedeu num inglês balbuciante uma entrevista à CNN após o seu partido, a Syriza, ter arrecadado 27% dos votos durante as eleições legislativas de 2012. Desde então, o progresso feito na língua de Shakespeare é notável. Tornou-se na principal força de oposição na Grécia e na figura mais querida da esquerda na Europa, que procurava um porta-voz capaz de encarnar a oposição ao dogma da austeridade e capaz de levar um partido da esquerda radical ao poder.
Nas eleições Europeias, a Syriza está taco-a-taco nas sondagens com os conservadores que estão no poder, a Nova Democracia (ND). Após uma longa reunião, Alexis Tsipras afirmou que “se ultrapassarmos a ND com um grande avanço nas europeias, então podemos pedir eleições legislativas antecipadas na Grécia e tomar o poder”. Um sonho distante para quase todos os partidos da esquerda radical que fizeram de Tsipras o seu campeão, o portador de todas as esperanças.
De Atenas a Bruxelas, via Madrid, Roma, Berlim ou Paris, viaja pelo continente para defender um projeto para a Europa e para a Grécia. O projeto que tem três grande eixos: anular a dívida para além dos 110% do PIB, revogar todos os planos de austeridade e lançar um Plano Marshall para criar crescimento. “Temos que entender que o modelo Europeu não é o de Weimar, mas o do New Deal de Roosevelt”, explicou durante a sua passagem por Paris.
Herdeiro da corrente comunista pró-europeia
Muito solicitado, Alexis Tsipras luta para acompanhar o ritmo do seu tempo, marcado por atrasos acumulados, cancelamentos à ultima da hora, nomeadamente com a imprensa. As televisões e os jornais em todo o mundo contactam o seu assessor de imprensa para obter declarações e entrevistas. “Toda a gente percebe que o que está em jogo na Grécia é o futuro da esquerda europeia”, responde um responsável do Syriza. “Isto fez do Tsipras um símbolo que o ultrapassa a ele e à relação da imagem dele com os gregos” acrescenta num tom irónico um homem que deseja manter-se anónimo.
É verdade que Tsipras tem, por vezes, o problema de não convencer algum eleitorado na Grécia e dentro do seu próprio partido. A Syriza é uma coligação turbulenta que Alexis Tsipras, herdeiro de uma corrente comunista pró-europeia, conseguiu gerir até agora. Atualmente, o debate é feito com a minoria do partido que é mais cética à Europa e ao euro, cujas posições são espelhadas por toda a comunicação social grega. As recentes negociações internas, longas e difíceis, para a estabilização das listas para as eleições municipais e europeias são um reflexo dessas divisões. Cada vez mais ampla, a sua base eleitoral mais à esquerda adverte-o dos compromissos de se tornar parte de um governo na Europa”.
Estas contradições impedem-no, por exemplo, de ultrapassar a marca das sondagens de 2012 e o muito rígido Partido Comunista Grego (KKE) atrai os descontentes com a Syriza. “Não podemos dizer que a Syriza conseguiu capitalizar após o sucesso de 2012”, lamenta o interlocutor crítico do partido. “Se a ND estiver à frente da Syriza, Tsipras será contestado internamente”, confirma o politólogo Elias Nikolakopoulos.
Preparado para tomar o poder
A personalidade de Alexis Tsipras nunca foi unânime dentro do partido, mas o seu talento como orador e a sua habilidade de gerir os conflitos internos da Syriza fizeram dele uma figura incontornável do partido.
Aos 39 anos, o engenheiro civil, é pai de duas crianças e político, vindo do aparelho da esquerda radical. Ainda no ensino secundário, o filho de empreiteiro inscreveu-se no Partido Comunista antes da Syriza. O seu talento na oratória e como dirigente político revelaram-se pela primeira vez nas mobilizações no ensino secundário de 1990 a 1991. Ele juntou-se ao comité central do partido em 2004 e tomou o leme em 2008. Uma ascensão que nem sempre foi consensual para os mais velhos que se sentiram ameaçados pelos jovens que acompanhavam Tsipras.
Estes formaram um grupo que decide tudo, inclusive o tom da campanha das Europeias. “Pela primeira vez, a esquerda”, “A Grécia demonstra o caminho”... são os slogans que são compostos pelo jovem diretor da campanha, Alexandros Bitsis, que Alexis Tsipras aceita ou rejeita.
Tsipras utilizou os slogans dados pelo jovem diretor de campanha durante o debate com os outros 4 candidatos à presidência da Comissão, na quarta-feira, dia 15 de maio. Se a candidata dos Verdes, Ska Keller, usou o argumento da juventude, Tsipras passou o exame ao confrontar diretamente os seus oponentes sobre a sua colaboração com as políticas de austeridade implementas na Europa nos últimos anos.
O grande desafio agora para Alexis Tsipras é demonstrar se está “pronto para tomar o poder”, como diz. E sobretudo, como é que ele pode encontrar – dentro e fora do partido – forma de governar e implementar as políticas para uma outra Grécia e uma outra Europa.
Texto de Adéa Guillot e Alain Salles, para o Le Monde.
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