Antifascismo

Mobilização contra a extrema-direita saiu à rua em França

15 de junho 2024 - 16:47

As manifestações convocadas pelas centrais sindicais juntaram este sábado muitos milhares de pessoas em dezenas de cidades francesas para sublinhar a importância da próxima eleição para o futuro da democracia no país.

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Manifestação em Paris contra a extrema-direita
Manifestação em Paris contra a extrema-direita. Foto Andre Pain/EPA

Com muita música e slogans antifascistas, muitos milhares responderam ao apelo dos sindicatos para mostrarem na rua o desagrado com o resultado eleitoral que deu a vitória à extrema-direita nas eleições europeias e a vontade de o reverter nas legislativas, onde os partidos de esquerda estarão unidos com o mesmo programa e candidatos nos dias 30 de junho e 7 de julho. Segundo os números anunciados pela CGT, as manifestações juntaram 640 mil pessoas, dos quais 250 mil em Paris.

Jovens e menos jovens empunharam cartazes feitos à mão com frases contra a extrema-direita, críticas ao presidente Macron e apelos à união das esquerdas na Nova Frente Popular. E no espaço onde se concentravam os principais dirigentes insubmissos, socialistas, ecologistas e comunistas, ouviu-se também um pedido lançado por vários manifestantes: “Não nos traiam”.

No cortejo em Paris, a líder parlamentar da França Insubmissa, Mathilde Panot, afirmou que "o que está em causa é mais do que uma eleição, é a identidade política do povo francês” e “defendeu que “a França não é uma cor de pele, uma religião ou uma língua, a França é um povo político fundado na nossa divisa: liberdade, igualdade e fraternidade!”

Num discurso em que teve na extrema-direita e em Macron os principais alvos, Mathilde Panot sublinhou a força desta manifestação e reafirmou que “no dia 7 de julho [data da segunda volta das legislativas], são eles ou nós!” e que em caso de vitória da esquerda, no dia seguinte “revogaremos a reforma da idade de reforma de 64 anos e a reforma do subsídio de desemprego, e reconheceremos o Estado da Palestina”.

Por seu lado, o secretário geral do PS francês, Olivier Faure, disse que “desde domingo que tenho um nó no estômago, tal como vocês. Há também os sindicatos, as associações e as ONG, porque a esquerda não é apenas uma questão de organizações, mas de princípios. É preciso que cada um convença os que estão à sua volta”, exclamou o dirigente socialista, evocando os tempos da Frente Popular de 1936, em que os seus promotores “fizeram um juramento de permanecerem unidos até à vitória. Peço-vos solenemente e com urgência: permaneçamos também nós unidos até à vitória”.

A líder dos Ecologistas, Marine Tondelier, também falou no camião-palco da Nova Frente Popular, dizendo-se “emocionada” com a adesão ao protesto. “Faz-me lembrar as manifestações contra a reforma das pensões. E sabem que desta vez vamos ganhar! E vamos vingar-nos porque os 49-3 deles já não contam. À esquerda e entre os ecologistas, nunca desistimos!”, exclamou.

Também a secretária-geral da CGT, Sophie Binet, marcou presença na manifestação em Paris para deixar claro que a “União Nacional de Le Pen e Bardella “é o partido da mentira e da impostura" para os trabalhadores. "Como podemos ver na reforma das pensões, eles já recuaram. Prosperaram na ausência de alternativa. Quando se fecha uma fábrica ou um serviço público, dá-se um impulso à RN. A esquerda passou mais tempo a gritar uns com os outros do que a unir-se contra a extrema-direita. E não estou a esquecer a banalização orquestrada por Emmanuel Macron”, acrescentou a líder sindical.

Para Marylise Léon, secretária-geral da central sindical CFDT, "este é um momento histórico” porque a França pode “inclinar-se para a extrema-direita”. A sindicalista promete ir ao encontro dos filiados “para tentar convencê-los de que é necessário mobilizarmo-nos, para convencer os abstencionistas. Não devemos estigmatizar os eleitores do RN, mas devemos lembrar-nos que a base do programa do RN é a estigmatização”, apontou.

Além dos sindicatos e partidos da esquerda, fez-se notar a presença de muitas associações e ONG como a Oxfam France, cuja secretária-geral, Cécile Duflot, defendeu que é preciso “fazer com que as pessoas saiam da negação: estamos no início de um momento que pode levar o país a um cenário catastrófico”. A dirigente associativa insistiu que “o discurso do RN é uma fraude” e que “há uma alternativa política que pode vencer”, impedindo que a extrema-direita passe a ser maioritária no próximo parlamento.

Escolhas da França Insubmissa para as listas e candidatura-surpresa de Hollande abrem polémica à esquerda

O dia de mobilização contra a extrema-direita serviu de teste ao apoio à Nova Frente Popular, a coligação fechada em poucas horas após o anúncio de eleições antecipadas. Mas para a generalidade dos media franceses o tema do dia foi a polémica em torno das escolhas para as listas da França Insubmissa, com alguns dos atuais deputados a serem afastados das listas depois de terem afirmado divergências com a estratégia da direção do partido.

O afastamento de Alexis Corbière, Raquel Garrido, Danielle Simonnet, Hendrik Davi e Frédéric Mathieu causou mal-estar dentro da própria França Insubmissa e também dos parceiros de coligação, que se dizem surpreendidos com as mudanças nas listas. Os afastados dizem estar a ser alvo de uma purga e apelaram diretamente a Jean-Luc Mélenchon, que tal como em 2022 não será candidato a estas legislativas, para que reconsidere estas escolhas até ao prazo final de entrega das listas este domingo.

Do lado dos socialistas também houve há surpresas nos candidatos apresentados, depois de o ex-Presidente François Hollande, que não apoiou a anterior coligação NUPES em 2022 e ainda hoje é apontado como o principal obreiro da fragmentação da esquerda e do seu próprio partido devido à orientação do seu mandato presidencial à direita, ter manifestado a disponibilidade para voltar a ser deputado sob a bandeira da Nova Frente Popular.

François Hollande será candidato pelo círculo de Corrèze, que pertence à quota socialistas na distribuição de candidaturas, tomando o lugar de um autarca do PS anteriormente anunciado como candidato. Na mesma entrevista em que declarou o apoio à Nova Frente Popular, o ex-Presidente reafirmou a sua posição de princípio “republicano” de desistir à segunda volta caso os resultados da primeira não o coloquem como o melhor colocado para vencer a candidatura da extrema-direita.

“Será que podemos acreditar que o Sr. Hollande se converteu de um dia para o outro? Que, de repente, é a favor da reforma aos 60 anos, que, de repente, é a favor da indexação dos salários à inflação? Duvido", afirmou aos jornalistas o deputado insubmisso François Ruffin, apontado como potencial candidato a primeiro-ministro num cenário de maioria de esquerda nas legislativas.