Está aqui

Mercado livreiro “é um negócio em que só há batota”

Três livreiros independentes querem juntar forças para criar uma associação que ajude a combater as “ilegalidades” das cadeias dominam o mercado e a lutar pela sobrevivência das livrarias.
Foto da livraria Gigões & Anantes / Facebook

A reportagem publicada pela agência Lusa este domingo dá conta do esforço de três livreiros independentes, de Aveiro, Sines e Lisboa, para criarem uma associação que enfrente os gigantes que dominam o mercado com práticas de negócio à margem da lei para esmagar a concorrência.

Na atual situação, em que FNAC, Bertrand e Continente repartem a fatia de leão do mercado, “só as livrarias diferenciadas conseguem sobreviver”, defende Francisco Vaz da Silva, da livraria aveirense Gigões & Anantes. Especializada na literatura infantil, poesia e álbuns ilustrados, também organiza tertúlias, exposições e horas do conto para atrair visitantes.

“O que se está a passar no mercado livreiro é gravíssimo, porque é um negócio em que só há batota”, denuncia Vaz da Silva, dando o exemplo de uma grande livraria em Aveiro “que está em campanha de feira do livro desde 25 de abril ininterruptamente até agora”, quando a lei limita essa promoção a 25 dias por ano.

“Já foi apresentada reclamação e o IGAC [Inspeção-Geral das Atividades Culturais] não funciona. Uma das últimas vezes que apresentámos uma reclamação por incumprimento da lei do preço fixo, tivemos imediatamente uma inspeção na nossa livraria por parte do IGAC e na semana a seguir tivemos uma inspeção da ASAE”, acrescentou Vaz da Silva à Lusa.

Outra forma de condenar a concorrência s\ao os descontos praticados pelas grandes cadeias, que chegam a vender livros abaixo do preço de compra às editoras por parte das livrarias independentes. “A Bertrand foi para Espanha tentar fazer o mesmo e teve que se vir embora imediatamente, porque lá cumpre-se a lei”, afirma o livreiro da Gigões & Anantes.

Também fora das grandes cidades, há quem aposte na diferenciação para atrair clientes. É o caso da livraria A das Artes, em Sines, que aposta na música, artesanato e artes plásticas para acompanhar os livros. O seu proprietário, Joaquim Gonçalves, também defende que as livrarias independentes devem unir-se para “alterar o estado da situação, muito político, encoberto pelo fator económico”.

Em Lisboa, a livraria Leituria acompanha os seus livros com arte, gastronomia e artigos de papelaria. O livreiro Vítor Rodrigues prevê que “o fim das livrarias pode vir a verificar-se se o Estado não intervier, apoiando-as ativamente e corrigindo os atuais desequilíbrios de mercado”. E aponta várias causas para vaga de encerramentos e de mudanças profundas no conceito das livrarias: “oligopólios estabelecidos e com tendência para monopólios, mercado imobiliário especulativo (rendas a subir para três, cinco ou 20 vezes mais), e alterações sociais, ideológicas, tecnológicas e económicas que empurram as pessoas para longe do livro enquanto objeto de transmissão de conhecimento”.

A “inoperância da Lei do Preço Fixo” está também na raiz do problema, aponta o dono da Leituria, concluindo que “o Estado não existe para as livrarias independentes. Zero apoios, zero vontade, zero tudo”.  

O incumprimento das leis do Preço Fixo e da concorrência têm sido apontadas há muito pelos livreiros independentes como um dos maiores problemas do sector. Numa audição parlamentar sobre o tema, promovida em abril pelo Bloco de Esquerda, Catarina Martins exigiu que haja “fiscalização do IGAC sobre a lei do preço fixo e a fiscalização da Autoridade da Concorrência sobre concorrência desleal e cartelização do mercado”.

Segundo a agência Lusa, o levantamento feito pelo Ministério da Cultura acerca do número e localização das livrarias portuguesas viu serem devolvidos 22% dos inquéritos enviados aos 558 estabelecimentos registados na Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas como livrariase/ou papelarias. Das restantes 438,  menos de metade respondeu ao inquérito e dessas “só 130 respeitam os requisitos básicos para uma livraria definidos pelo grupo de trabalho”. Por seu lado, a Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL) contabiliza o número de livrarias em Portugal em cerca de 600, apoiando-se em dados do Instituto Nacional de Estatística.

Termos relacionados Sociedade
(...)