Foi no Teatro Thalia, em Lisboa, que Marisa Matias assumiu querer ser uma " Presidente da República tão política quanto a Constituição o é na sua opção política de fundo, que não é de modo algum neutra em relação às questões essenciais", candidatando-se em nome de uma forma diferente de fazer política.
“Uma Presidente que ajude a meter a austeridade na gaveta, mas que tire da gaveta a Constituição”, frisou Marisa Matias.
Num discurso onde fez duras críticas a um Presidente indiferente ao que estão a sofrer os reformados, os trabalhadores e os desempregados, ao que está a acontecer com o ensino público ou o serviço nacional de saúde, Marisa Matias disse que era preciso garantir que temos na Presidência da República alguém que não dê cobertura aos ataques contra o país e contra a democracia.
A eurodeputada disse ainda conhecer bem o processo de transformação da União Europeia, por ter confrontado os seus protagonistas e saber para onde nos querem levar, caminho esse que não irá seguir. "A alternativa que eu represento não está refém de qualquer cumplicidade com o mundo dos negócios duvidosos que têm destruído o país", destacou.
“Serei uma Presidente da República que não irá pactuar com a humilhação do país, porque isso é negar uma das competências mais fundamentais que é de ser o garante da independência nacional”, sublinhou Marisa Matias, salientando que “num mundo cheio de injustiça e de guerras, comigo ninguém duvida que Portugal estará sempre, sempre ao lado da justiça e da paz”.
Antes da intervenção de Marisa Matias, Tatiana Moura apresentou a candidata recordando os tempos de faculdade e de investigação, que fizeram em conjunto, e destacou o percurso de Marisa como eurodeputada. Tatiana Moura salientou ainda que “a mudança tem de passar urgentemente pela humanização da política” e afirmou: “A Marisa é a Presidente da República que Portugal merece”. Ricardo Moreira, diretor de campanha, apontou a importância de não “deixar fechar” a “porta de esperança" que foi aberta, realçando o significado do voto e a necessidade de que ele “volte a contar”.
Declaração de Marisa Matias
Candidata às Eleições Presidenciais de 2016
I.
Vivemos tempos exaltantes. São tempos de uma esperança muito refrescante. Esperança num país solidário, num país desenvolvido, num país soberano. Esperança num Portugal de que nos possamos orgulhar. Um país que trate bem as pessoas, os cidadãos e as cidadãs, os trabalhadores e as trabalhadoras, com respeito, com decência e com dignidade: numa palavra, que os trate como gente, gente que merece muito melhor do que o que tem tido.
A democracia está a passar por aqui. Ela chama por todos nós, e chamou também por mim. E aqui estou: serei candidata à presidência da República. O nosso lema – UMA POR TODOS – diz-nos da esperança de levarmos até Belém uma política que não exclua
Agora, a democracia está a passar por aqui. Ela chama por todos nós, e chamou também por mim. E aqui estou: serei candidata à presidência da República. O nosso lema – UMA POR TODOS – diz-nos da esperança de levarmos até Belém uma política que não exclua, uma política que não se coloque ao serviço das minorias privilegiadas de sempre.
A direita anda desesperada como nunca a tínhamos visto, os grandes interesses consideram-se em risco e, em conjunto têm um projecto: onde cresce a esperança, espalham o medo; onde se forma a união, semeiam a chantagem; onde há sinais de mudança, tentam manter o status quo.
Querem fazer das presidenciais uma segunda volta das legislativas, querem uma desforra, querem vingança.
Perdida a maioria absoluta no parlamento, pretendem, pelo menos, manter o poder em Belém para, a partir daí, bloquearem qualquer processo de transformação.
A direita dos interesses está toda unida neste projecto. Está em plena contra-ofensiva. A contra-ofensiva de quem não quer perder os seus privilégios e quer proteger os seus interesses, de quem não concebe um mundo sem esses privilégios e serem eles a mandar. Os próximos tempos serão duros, temos de preparar-nos para isso. E uma forma de nos protegermos é garantir que temos na Presidência da República alguém que não dê cobertura aos ataques contra o país e contra a democracia.
A direita apresenta-se com um rosto mais civilizado, com um ar mais moderno e tolerante, mas não se iludam: quem procurou fazer da televisão um trampolim ao serviço da sua desmesurada ambição política, estará disposto a vender tudo e o seu contrário para atingir os seus objectivos. Contudo, a pauta é a mesma de sempre: profundamente conservadora no que respeita aos direitos e às liberdades individuais, profundamente subserviente à lei do mercado e do mais forte, profundamente cobarde no que respeita à nossa soberania e à nossa relação com a Europa e com o Mundo. Esta continua a ser uma disputa entre as elites poderosas e a maioria do povo.
Candidato-me para ajudar a derrotar o projecto das elites. Porque a presidência da República, no nosso regime constitucional, é um dos centros nevrálgicos da definição do perfil do país que queremos. Não me candidato para fazer número, para animar a campanha ou para erguer a bandeira do partido
Candidato-me para ajudar a derrotar este projecto das elites. Porque a presidência da República, no nosso regime constitucional, é um dos centros nevrálgicos da definição do perfil do país que queremos. Não me candidato para fazer número, para animar a campanha ou para erguer a bandeira do partido.
Esta candidatura vem para somar e não para subtrair, vem para agregar, vem para mobilizar. Cada voto que esta candidatura conquistar à abstenção é um voto que põe a direita mais longe de Belém. Numa eleição a duas voltas, é a pluralidade que mobiliza e pode ser a unidade forçada que diminui.
Candidato-me para trazer uma alternativa popular para estas eleições, na convicção de que, numa República, são os votos que decidem quem é que vai estar na chefia do Estado.
A alternativa que eu represento não está refém de qualquer cumplicidade com o mundo dos negócios duvidosos que têm destruído o país.
Sou uma mulher de esquerda, assumo as minhas causas, e não tenciono fingir que sou neutra para conquistar simpatias. Não quero ser politicamente correcta, quero ser politicamente verdadeira.
Candidato-me partindo de uma premissa radical: é possível chegar à presidência sem a protecção do Espírito Santo. Nunca fui avençada do dito, em claro conflito de interesses com funções públicas na mesma área, e nunca festejei a passagem de ano no iate do Ricardo Salgado
Candidato-me partindo de uma premissa radical: é possível chegar à presidência sem a protecção do Espírito Santo. Nunca fui avençada do dito, em claro conflito de interesses com funções públicas na mesma área, e nunca festejei a passagem de ano no iate do Ricardo Salgado.
Serei uma Presidente de todos e todas as portuguesas, mas não esqueço o que se está a fazer aos mais pobres para salvar os bancos, não esqueço o que se está a fazer aos jovens para os fazer desistir do país, não esqueço o que se está a fazer às mulheres para que sejam sofredoras submissas, não esqueço o que se está a fazer aos trabalhadores para pagar salários miseráveis, não esqueço o que se está a fazer aos velhos para desonrar vidas inteiras de trabalho e de sacrifício. É em nome deste povo que sofre, mas que resiste, que me candidato.
Para concretizar e para levar mais longe aquela esperança tão bonita que um dia se viveu tão intensamente no mês de Abril e que hoje vemos de novo a brilhar nos olhos da nossa gente.
Uma Presidente que ajude a meter a austeridade na gaveta, mas que tire da gaveta a Constituição
Essa esperança precisa de uma presidente próxima dos cidadãos, sem jogos nem calculismos eleitorais, independente das decisões dos estados maiores partidários e dos conselhos de administração das empresas, de ideias claras e bem definidas, que recuse sem hesitações nem malabarismos linguísticos a austeridade inútil imposta pela especulação financeira e pelos seus representantes europeus e internacionais.
Uma Presidente que ajude a meter a austeridade na gaveta, mas que tire da gaveta a Constituição. A Constituição é muito mais do que o sistema jurídico que institui, é na sua substância um projecto político para o país. E esse projecto é o de uma democracia inteira, tanto política como cultural, tanto económica como social.
Portugal precisa de regressar à Constituição, ao projecto de sociedade e de país que ela desenha: igualdade e coesão social, pleno emprego e trabalho com direitos, economia pública, estado social, democratização cultural, pluralidade informativa, independência e soberania, apostado em soluções pacíficas para os graves problemas do mundo.
Uma Presidente de todos os portugueses é uma Presidente que não está de costas voltadas aos problemas que enfrentamos, nem está curvada perante uma mão cheia de poderosos. Uma Presidente de todos os portugueses sabe que o poder tem de estar do lado dos cidadãos e das cidadãs.
Não podemos ter um Presidente indiferente
ao que estão a fazer aos reformados e pensionistas, à destruição dos direitos constitucionais dos trabalhadores, à pobreza e ao desemprego, à destruição da nossa agricultura e das nossas pescas, à destruição do ensino público, à destruição do serviço nacional de saúde, à violência de género
Não podemos ter um Presidente indiferente ao que estão a fazer aos reformados e pensionistas, à quebra do contrato que tinha sido estabelecido entre o Estado Português e esses cidadãos mais velhos.
Não podemos ter um Presidente indiferente à destruição dos direitos constitucionais dos trabalhadores.
Não podemos ter um presidente indiferente à pobreza e ao desemprego.
Não podemos ter um Presidente indiferente à destruição da nossa agricultura e das nossas pescas em nome do direito à concorrência das multinacionais.
Não podemos ter um Presidente indiferente à destruição do ensino público, em nome da liberdade empresarial dos negociantes da educação privada.
Não podemos ter um Presidente indiferente à destruição do serviço nacional de saúde no altar dos hospitais-empresa e dos negócios milionários das parcerias público-privadas.
Não podemos ter um Presidente indiferente à violência de género, que mata todos os anos em Portugal.
Não podemos ter um Presidente que acha que as mulheres devem ser condenadas quando decidem interromper a sua gravidez
Não podemos ter um Presidente que acha que as mulheres devem ser condenadas quando decidem interromper a sua gravidez.
Não podemos ter um Presidente indiferente à defesa da habitação para todos, porque a habitação é um direito constitucional antes de ser um mero mercado de habitação.
Não podemos ter um Presidente que fique indiferente ao ver partir quase meio milhão dos cidadãos que jurou defender.
Não podemos ter um Presidente indiferente aos direitos de todos serem tratados com respeito e dignidade, sejam minoria ou maioria.
Defender a Constituição não pode ser um programa vago, sem conteúdo, nem apenas o respeito de meros prazos e procedimentos, é antes defender o seu conteúdo político
Tudo isto tem a ver com a essência da nossa Constituição e, portanto, com a função do Presidente da República. Defender a Constituição não pode ser um programa vago, sem conteúdo, nem apenas o respeito de meros prazos e procedimentos, é antes defender o seu conteúdo político.
Serei uma Presidente da República tão política quanto a Constituição o é na sua opção política de fundo, que não é de modo algum neutra em relação às questões essenciais. Não foi por acaso que, nos últimos quatro anos, a direita se dedicou tanto a atacar a Constituição.
II.
Candidato-me em nome da esperança de um país novo e justo.
Candidato-me em nome da esperança de um país novo e justo
Tudo farei para dar densidade à aliança da geração jovem, dita a ‘mais bem preparada de sempre’, e a geração dos seus pais e dos seus avós, que tanto investiram na preparação e no futuro dos seus filhos e netos.
A aliança entre estas duas ou três gerações está hoje a configurar um novo espaço e um novo tempo. Este é o tempo de dar as mãos e de agarrar o futuro, o tempo de perceber que a vida não tem de ser sinónimo de sofrimento. Este é o tempo de um Portugal novo, justo e solidário.
III.
Se dúvidas houvesse sobre a importância do Presidente da República, todas elas foram esclarecidas nas últimas semanas. O Presidente que temos em funções é o exemplo de quem usa o seu papel para defender a estabilidade dos seus no poder e não a estabilidade da vida dos portugueses. O Presidente que temos em funções tem sido um divisor, uma força de bloqueio da democracia. Precisamos de alguém que agregue em vez de dividir, que resolva em vez de complicar.
O Presidente que temos em funções é o exemplo de quem usa o seu papel para defender a estabilidade dos seus no poder e não a estabilidade da vida dos portugueses
Precisamos de uma Presidente de todos os portugueses e não de todos os mercados.
Precisamos de uma Presidente de todos os portugueses e não de todos os conselhos de administração das grandes empresas.
Precisamos de uma Presidente de todos os portugueses e não de todos os banqueiros.
Precisamos de uma Presidente independente dos interesses que atacam a nossa independência.
IV.
Conheço o país por dentro e conheço o país a partir de fora. Conheço bem o processo de transformação da União Europeia a que assistimos nos últimos anos. Vi-o a acontecer, confrontei os seus protagonistas, sei para onde nos querem levar e “sei que não vou por aí”.
Serei uma Presidente da República que não irá pactuar com a humilhação do país, porque isso é negar uma das competências mais fundamentais que é de ser o garante da independência nacional
Serei uma Presidente da República que não irá pactuar com a humilhação do país, porque isso é negar uma das competências mais fundamentais que é de ser o garante da independência nacional.
Sei que na Europa a regra é a da negociação e do compromisso, mas também sei que a negociação facilmente se transforma em imposição sempre que não se obedece aos ditames dos mercados contra o Estado Social.
Por isso, sei que só pode ter êxito numa negociação quem souber aliar à construção de compromissos a firmeza na defesa dos princípios. Lamentavelmente, isso tem faltado na posição institucional de Portugal em todas as negociações europeias. E isso tem que mudar.
V.
“Defender Portugal”, “defender o interesse nacional”, não são expressões vazias. Mas não é coisa que se faça só com discursos. Faz-se com tomadas de posição firmes e, isso, nos últimos dez anos, não vimos nenhuma. E tantas vezes foi necessário...
Num mundo cheio de injustiça e de guerras, comigo ninguém duvida que Portugal estará sempre, sempre ao lado da justiça e da paz
A Presidência da República não tem apenas a ver com um Portugal dentro de fronteiras, nem apenas com um Portugal dentro da União Europeia. Tem a ver também com a posição de Portugal no mundo. Num mundo cheio de injustiça e de guerras, comigo ninguém duvida que Portugal estará sempre, sempre ao lado da justiça e da paz.
Já corri muito mundo, já vi muitas coisas que não queria ver, já escutei muitas palavras que não queria ter escutado.
A indiferença das instituições portuguesas face ao drama escandaloso dos refugiados só é compreensível porque temos governantes e representantes que nunca se deram ao trabalho de ir directamente aos locais e falar directamente com quem sofre e conhecer que razões tão profundas tem alguém para decidir abandonar a sua terra, de se fazer ao mar e atravessar a Europa a pé, a empurrar a cadeira de rodas da sua mãe ou a trazer um bebé recém-nascido sujeito às intempéries e ao risco.
Nenhuma mãe ou nenhum pai arrisca a vida dos seus filhos em barcos de papel se esses barcos não forem mais seguros que o chão que pisavam antes.
Quem não conseguir compreender isto não é digno de ocupar a Presidência da República Portuguesa.
VI.
Num Portugal em mudança não podemos deixar a Presidência na mesma, num mero regime de continuidade, numa mera continuidade do regime.
Num Portugal em mudança não podemos deixar a Presidência na mesma, num mero regime de continuidade. Há uma forma diferente de fazer política. É essa diferença que vos proponho e é em nome dela que me candidato
Há uma forma diferente de fazer política. É essa diferença que vos proponho e é em nome dela que me candidato. Este é um momento de esperança, é um momento de sonharmos com um Portugal melhor, de sabermos que isso está ao alcance da nossa mão. O voto de Janeiro é um instrumento deste sonho, é um passo no caminho desta esperança.
Num Palácio de Belém que cheira a bafio vai ser preciso abrir as janelas para entrar ar fresco. É a força da democracia que as vai abrir. É a vossa força.